Paraná Almendra Discos

Samba, MPB e rock argentino: conheça a charmosa loja de discos de Curitiba comandada por uma mulher

Vanessa Ladaniuski abriu a loja no final de 2022, inicialmente vendendo livros. Hoje, porém, são os LPs que "dominam" o negócio

Rodolfo Luis Kowalski
VANESSA LADANIUSKI LOPES

Paixão pelo vinil virou oportunidade de negócio para Vanessa após ela, que trabalhava como professora, deixar a sala de aula, no final de 2022 (Foto: Franklin de Freitas)

No princípio era o verbo. Ou melhor, eram os livros. Depois, porém, vieram os discos de vinil. E assim nasceu e começou a crescer aquela que se autodenomina a mais charmosa loja de discos e livros de Curitiba, a Almendra Discos. Uma loja peculiar não só por seus gostos (com um trabalho focado em samba, MPB e rock argentino), mas também por seu proprietário. Ou melhor, sua proprietária. A dona da loja é Vanessa Ladaniuski Lopes Pereira, uma das poucas mulheres a empreender no efervescente e predominantemente masculino mercado dos bolachões na Capital.

Tudo teve início no finalzinho de 2022, no período pós-pandemia. Na época Vanessa, que é professora de História, estava deixando a escola em que trabalhava e precisava de uma nova fonte de renda. Foi quando, incentivada por amigos (como o DJ Gustavo Silva, da Agreste Discos) e pelo marido (o professor Luís Fernando Lopes Pereira, da Universidade Federal do Paraná), decidiu transformar uma de suas paixões em negócio.

“O começo da loja foi com a venda de livros. Trabalhei num sebo e lá aprendi muito sobre como separar livros raros, literatura em geral, livros acadêmicos, e acabei conhecendo a Estante Virtual não só como compradora, mas para vender mesmo. Comecei vendendo só livros, depois fui pegando alguns discos do meu acervo e fui incorporando os discos, que acabaram se tornando o principal hoje. Os livros estão na estante virtual, têm a sua saída, mas o principal mesmo são os discos, até por causa das feiras”, conta ela.

Negócio em alta e com discos para todos os bolsos

Quando tudo começou, a loja reunia cerca de 200 livros e 200 e poucos discos. Com o tempo, porém, o negócio foi crescendo. Hoje, já são mais de 800 discos e cerca de 500 livros. “Temos bastante material para servir o pessoal”, conta a vendedora, que faz um trabalho focado em MPB, samba e (o mais curioso) rock argentino. Para conhecer mais sobre o trabalho, basta seguir a loja no Instagram (@almendradiscoselivros).

“O nosso foco, nosso público principal, é quem coleciona MPB, especialmente quem está começando a colecionar. São discos mais baratos, discos usados, mas que são acessíveis para todos os bolsos. Então, a gente tem disco, por exemplo, do Caetano [Veloso], da Gal [Costa], a R$ 30. Claro, para os colecionadores, também temos um acervo de discos mais raros. E o nosso principal, o nosso diferencial, é o rock argentino”, explica ainda Vanessa. “Entre os livros, temos muita coisa de filosofia, história, antropologia, direito, literatura… É um pouquinho de cada coisa.

Vanessa apresenta disco da banda Almendra que inspirou o nome da loja (Foto: Franklin de Freitas)

Almendra e o rock argentino

O nome da loja, Almendra Discos e Livros, é uma homenagem a uma das mais icônicas bandas de rock da Argentina e ao seu álbum de estreia, lançado em 1969. Não à toa, o rock argentino é um dos focos da loja, junto com o samba e a MPB. Um gênero que ela aprendeu a apreciar com o marido, Luís. “Ele que me apresentou o rock argentino, que virou uma paixão, principalmente o disco Almendra, que quando escutei pela primeira vez já fiquei completamente apaixonada. E, claro, ele que me deu o disco que eu tenho de presente”, diz ela, explicando que na relação entre os dois a troca de presentes é, de forma muito carinhosa, um sinônimo para troca de discos. “Se tornou um marco na nossa relação”.

Luis Fernando, por sua vez, lamenta o desconhecimento do brasileiro sobre o rock argentino, algo que ele coloca na conta da barreira linguística. “Acho que é muito estranho pra gente, pro nosso ouvido, ouvir rock cantado em castelhano. Só que essa foi exatamente a intenção dessa geração do rock argentino do final dos anos 1960, começo dos anos 1970: criar uma coisa local, traduzir o estilo musical. Quer dizer, não vou só copiar, mas fazer algo próprio aqui, colocando algumas pitadas de algo argentino que se mescle com essa loucurada toda que está invadindo, que está circulando, com os Beatles e toda a invasão inglesa e estadunidense que acabou acontecendo”, relata o professor.

Indicações para quem quer conhecer mais o rock argentino

Nessa época, nomes como Luis Alberto Spinetta, Charly Garcia, Fito Páez e Billy Bond ganham destaque. Algumas bandas que merecem ser mencionadas são Arco Iris, Vox Dei, Sui Generis, La Máquina de Hacer Pájaros, Almendra, Invisible e Pescado Rabioso. “A cena do rock argentino dos anos 1960 e 1970 é uma coisa impressionante, que a gente não consegue igualar. A gente não tem tantas bandas boas de rock como eles têm na Argentina, lamentavelmente. É preciso reconhecer”, opina Pereira.

Paixão pelos bolachões: uma mulher conquista o mundo dos discos

Vanessa é apaixonada por vinil desde a infância. Começou a escutar discos com o pai e aos 15 anos ganhou sua primeira vitrola. Depois, com a “invasão” dos CDs, acabou perdendo sua pequena coleção, focada em rock internacional (com nomes como Janis Joplin e Led Zeppelin). Mais tarde, porém, retomou o gosto pelos bolachões. Mas em vez do rock, seu gosto já estava mais para a MPB e, principalmente, o samba. ” O meu gosto musical mudou muito. E eu acho que isso acontece com a maioria das pessoas. Acaba amadurecendo um pouco o gosto musical”, aponta ela.

Apesar dessa história antiga, no começo a sua presença causava um certo estranhamento aos colegas e clientes. Afinal, o mercado dos discos de vinil é predominantemente masculino, especialmente quando falamos em vendedores. “No começo, o pessoal fazia perguntas para testar se eu sabia: perguntavam se o disco era desta ou daquela edição, se era reedição ou original, se a capa era plotada ou não.. Cutucadas para ver se eu sabia o suficiente para poder trabalhar, para poder discutir sobre o assunto. Mas depois isso foi mudando, apesar do começo desafiador. Hoje, todos me respeitam. Minha presença nas feiras foi acalmando um pouco e perceberam que eu sabia de discos, sim. Hoje participo, sou respeitada e tenho meu espaço”, celebra ela.

Atualmente dedicada ao estudo do samba, principalmente, Vanessa deixa ainda algumas indicações para quem quer começar a explorar o gênero e garimpar alguns bons discos. “Alcione é fundamental, maravilhosa. Acho que tudo mundo tem que conhecer. Clara Nunes também acho importantíssimo, tem um trabalho lindo, principalmente com o samba, embora ela já tenha tocado bolero. A Maria Bethânia também, é uma entidade. Paulinho da Viola, que é o baluarte. E Martinho da Vila, mais popular, agrada todos os públicos.”