
Uma das mais antigas vias da Capital, seguindo desde a Catedral de Curitiba até o bairro Campina do Siqueira, a Rua Saldanha Marinho preserva (e concentra) um dos mais antigos ofícios em seu trecho no Centro histórico. Se em outros tempos já foi conhecida como “Rua da Morte” (quando concentrava grande número de funerárias e açougues numa de suas quadras), hoje a via bem que faria jus ao título de “Rua dos sapateiros”, dada a grande quantidade de sapatarias espalhadas ao longo de sua extensão na região central da Capital.
Num trajeto de pouco mais de 1 quilômetro, entre a Catedral e a Rua Brigadeiro Franco, são pelo menos seis sapataria. Segundo Alceu Gomes de Siqueira, que há 36 anos toca a Sapataria Rápida Florença (localizada na altura do número 665 da Saldanha Marinho), o ano de 2023 vem sendo de retomada para o setor, que após anos de dificuldade — com ápice da crise na pandemia de Covid-19, por conta da necessidade de isolamento social — finalmente parece estar voltando a crescer.
“Para mim, 2023 está bom, melhor que 2022. Tinha dado uma baixada no movimento nos últimos anos e na pandemia quebrou de vez. Mas agora, desde o começo do ano, a coisa tem melhorado. O movimento já cresceu uns 30% em relação ao ano anterior”, diz ele, que trabalha há quase 55 anos como sapateiro — começou no ramo através do irmão, que era dono de uma outra sapataria na Saldanha Marinho e foi quem lhe ensinou o ofício antes de Alceu abrir a sua própria loja.
O bom momento também é notado pela Sapataria Farias, localizada num ponto um pouco mais acima da via, na altura do número 1193. A empresa, em operação desde 1973, completou recentemente meio século de vida.
“Olha, graças a Deus não dá pra gente reclamar. Deu uma caída no movimento [recentemente], mas nada muito fora do normal, é aquela coisa mais sazonal mesmo. Temos uma clientela fiel e vemos que estão chegando também clientes novos, também estamos sempre inovando… Graças a Deus, não dá pra gente reclamar”, conta Rosane Teresinha Farias da Silva, de 62 anos, filha dos fundadores da loja (e que até hoje seguem trabalhando no local).
“Agora [mais próximo do final do ano] já volta a melhorar [o movimento], final do ano pessoal começa a se preparar para viagem, essas coisas, e o movimento aumenta. Esperamos que o ano de 2023 continue assim”, diz Rosane.

Um ofício quase em extinção
O reaparecimento da clientela nas sapatarias é uma boa notícia, mas o setor sofre ainda com um outro problema, comenta Rosane Farias da Silva: a falta de mão de obra qualificada.
“Mão de obra, simplemente não tem. Mão de obra qualificada está muito difícil, costumo dizer que os sapateiros estão quase em extinção. Nós procuramos, mas é muito difícil, então tratamos de manter os nossos profissionais e, quando achamos alguém, já trazemos para ir treinando”, comenta a empresária em Curitiba.
O segundo andar da Sapataria Farias, inclusive, funciona como uma linha de produção. A primeira etapa do trabalho quando chega chega algum sapato é feita justamente pelos sapateiros, que é quem faz os primeiros reparos no material e troca a sola do calçado, por exemplo. “Sempre substitui por uma sola mais próxima do original. Tudo dá para consertar”, explica Rosana.
Com o sapato estruturalmente já reforçado, é vez de uma equipe de mulheres se debruçar sobre o material. Entre elas está Ilma Avelino, que há 40 anos trabalha na sapataria.
“Eu preparo as cores para pintar os calçados e tenho paixão pelas tintas. Eu gosto muito, muito disso e sempre procuro novidades para estar fazendo melhor”, diz ela, explicando que depois da pintura (caso o dono do sapato tenha pedido a mudança de cor do calçado) o sapato ainda é engraçado antes de ser encaminhado para uma espécie de “revisora”, que confere se está tudo dentro dos padrões antes do produto ser entregue ao cliente.
“Depois que engraxamos [que é a última etapa do serviço, basicamente] o sapato fica muito bom, fica praticamente novo”, propagandeia Ilma.
Detalhes: quando compensa consertar em vez de comprar um novo?
Apesar do nome, não é só do conserto de sapatos que vivem as sapatarias. Bolsas, malas, mochilas e jaquetas, por exemplo, são outros itens que costumam ganhar uma vida útil muito mais longa quando entregues aos cuidados de uma sapataria. Os serviços demandados, por sua vez, são diversos: pintura de calçados, troca ou reforço de solado, troca de forro em jaquetas e bolsas, reparos na costura ou conserto/troca de rodinhas de mochilas são alguns exemplos.
“Sapato, o principal é reforço na sola. Malas, bolsas, é costuma, rodinha, forro… Fazemos tudo isso”, destaca Rosane, expicando que o calçado, se é realmente bom, sempre vale a pena levar para uma sapataria fazer um orçamento e, possivelmente, consertar o material.
“Consertar uma sola ou um salto custa na faixa de R$ 120, R$ 140. Para quem paga R$ 300, R$ 400 num par de calçados novos, vale a pena investir na reforma, sempre compensa consertar. [O sapato] Entra de um jeito e sai de outro, praticamente novo. Então vale a pena”, destaca a empresária. “Não cobrmaos orçamento. É só a pessoa trazer o sapato que fazemos orçamento e aí a pessoa escolhe [se vai querer arrumar ou não].”