Uma nova tendência tem ganhado espaço entre os viajantes: o turismo afetivo, uma forma de viajar que vai além das paisagens e pontos turísticos. A ideia é criar laços emocionais, buscar histórias, memórias e conexões que unem o passado e o presente. Foi com essa proposta que o curitibano Luiz Hanysz, de 26 anos, decidiu incluir Pinhão, no Centro-Sul do Paraná, em seu roteiro de férias.
A viagem, feita junto com a namorada Luísa Mainardes, tinha um propósito simples à primeira vista: conhecer a cidade onde o bisavô de Luiz havia vivido. Mas o que começou como uma curiosidade familiar se transformou numa jornada de descobertas, uma viagem que revelou histórias perdidas, laços com a política local e até o nome da família gravado em uma das principais avenidas da cidade.
Uma viagem com destino ao passado
Luiz Fernando Hanysz — cujo sobrenome, com o tempo, ganhou diferentes grafias nos registros de cartório — cresceu sem muitas informações sobre as origens da família. O pai dele nasceu em Pinhão, mas se mudou ainda criança, e as conversas sobre o passado eram raras.
“Meu pai sempre contou que o meu avô teve uma farmácia na região, mas o que eu sabia do bisavô era quase nada. Só descobri o nome dele por causa de um trabalho da escola, quando pediram pra montar uma árvore genealógica”, contou Luiz.
Ao planejar uma viagem pelos interiores do Paraná em agosto deste ano, o trajeto passaria por Guarapuava, cidade vizinha de Pinhão. “Comentei com a Luísa que seria interessante passar por lá. Era a cidade onde meu pai nasceu, e meu bisavô tinha vivido. Então pensei: por que não aproveitar pra conhecer?”, lembra.
Até aquele momento, ele só conhecia Pinhão pelas imagens do Google Maps. “Eu passeava pela cidade no Street View”, brinca.
Uma placa, um nome e uma história esquecida
Quando chegaram a Pinhão, já à noite, o casal resolveu dar uma volta pela cidade. Foi então que Luiz viu algo que o fez parar o carro: uma placa de rua com o sobrenome da família. “Era a Avenida Trifon Hanysz, nome do meu bisavô. Liguei pro meu pai por vídeo pra mostrar. Ele ficou surpreso. Nem sabia que existia uma rua com esse nome”, conta.
A grafia, no entanto, era diferente. “No registro dele, o sobrenome era com ‘c’, Hanycz. Acredito que o cartório tenha alterado ao longo dos anos, o que era comum com sobrenomes estrangeiros.”
No dia seguinte, Luiz e Luísa decidiram que fariam mais do que apenas conhecer o município. Queriam entender quem havia sido aquele homem cujo nome estava na avenida principal, onde hoje ficam a prefeitura e outros prédios importantes.
Rastros na prefeitura e uma parada na biblioteca
Sem um roteiro definido, o casal começou pela Prefeitura de Pinhão. “Entramos sem saber bem por onde começar. Falei com o secretário e expliquei que era bisneto do Trifon Hanysz, e que queria descobrir mais sobre ele”, conta Luiz.
O secretário os orientou a procurar a Secretaria de Cultura, e foi lá que a história começou a ganhar corpo. “Alguns funcionários lembravam da família. Disseram que o meu bisavô trabalhou numa grande madeireira da cidade e que mantinha uma farmácia dentro da empresa.”
Na época, grandes madeireiras criavam verdadeiras vilas operárias, com escola, cinema e serviços básicos para os funcionários. “Contaram que ele cuidava da saúde das pessoas, como uma mistura de farmacêutico e enfermeiro. Ajudava os moradores, fazia curativos, dava remédios. E mantinha um pequeno espaço anexo à farmácia para acolher doentes que precisavam de tratamento mais longo”, relata Luiz.
A equipe da prefeitura também recomendou uma visita à Biblioteca Municipal, onde havia livros sobre a história da cidade. Lá, o casal passou horas folheando páginas antigas, tirando fotos e anotando cada descoberta.
O bisavô austríaco e as surpresas da política local
Nos livros, Luiz encontrou registros valiosos. Descobriu que Trifon Hanysz havia chegado ao Brasil vindo da Áustria, em um navio desembarcado no Porto de Santos por volta de 1870. “Achei até o registro da imigração na Biblioteca Nacional, mas nunca tinha conseguido saber o que ele fez depois de chegar. E foi ali, em Pinhão, que tudo se encaixou.”
Os livros contavam que Trifon não só manteve uma farmácia na região como teve um papel importante na comunidade. A família também estava envolvida com a política local. “Ficamos sabendo que meu avô foi vereador, e o padrasto da minha avó, Osíris Roriz, foi o primeiro prefeito eleito de Pinhão, em 1964”, revela Luiz.
Mas havia uma reviravolta curiosa, o prefeito eleito não chegou a assumir o cargo. “Ele ficou 90 dias sem aparecer. Acredita-se que tenha sido por pressão da própria madeireira, que era muito influente na cidade. No fim, o mandato foi cassado, e outro prefeito assumiu. Meu avô foi um dos poucos vereadores a votar contra a cassação, por motivos óbvios, ele era genro do prefeito eleito”, conta.
Entre páginas e memórias
A cada nova página, Luiz e Luisa se deparavam com versões diferentes do sobrenome da família. “Encontramos pelo menos quatro grafias diferentes, dependendo do livro. Tínhamos que fazer um trabalho de detetive pra ligar os pontos e ter certeza de que se tratava da mesma pessoa.”
Eles passaram quase duas horas na biblioteca. “Foi o lugar em que mais ficamos. Queríamos aproveitar ao máximo, porque só tínhamos aquele dia e, por coincidência, era o dia do meu aniversário”, diz Luiz.
A viagem terminou, mas deixou um desejo forte de retorno. Luiz quer voltar a Pinhão acompanhado do pai e dos tios.