
No próximo sábado (dia 27 de maio) é celebrado o Dia Nacional da Mata Atlântica. Mas os motivos para se comemorar são poucos e os para se preocupar, muitos. Nos últimos dias, dois estudos diferentes foram divulgados, um deles pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e outro pela Fundação SOS Mata Atlântica e o INPE (Instituto Nacional Pesquisa Espacial). Essas pesquisas mostram não só que o desmatamento ainda é uma ameaça — com o Paraná aparecendo como o terceiro estado do país que mais destrói Mata Atlântica —, mas também que um quarto das espécies de plantas ou animais do bioma estão ameaçados de extinção.
Divulgados na última quarta-feira, os dados sobre espécies ameaçadas de extinção, referente ao ano de 2022, fazem parte da pesquisa “Contas de ecossistemas: espécies ameaçadas de extinção no Brasil”, divulgada pela primeira vez em 2020 pelo IBGE, com dados de 2014. Em sua edição mais recente, o estudo avaliou o risco de extinção de 11.811 espécies da fauna e flora da Mata Atlântica, 30,6% a mais do que em 2014. O número de espécies ameaçadas, por outro lado, teve alta de 41,1%, com aumento expressivo na quantidade de plantas na lista.
Em 2022, 2.845 espécies avaliadas pelo IBGE na Mata Atlântica foram classificadas como ameaçadas de extinção. Isso significa que 24,1% das plantas e animais do bioma estão ameaçadas, sendo que há 1.148 espécies classificadas como vulneráveis, 2.270 em perigo (entre elas o pau-brasil) e 1.042 criticamente em perigo. Na fauna (animais) há 734 espécies ameaçadas (10,62% do total) e na flora, 2.111 – o equivalente a 43,1% das plantas do bioma avaliadas, com alta superior a 60% na comparação com 2014.
De acordo com o estudo, três fatores ajudam a explicar porque a Mata Atlântica é o bioma líder, tanto em número absoluto como em proporção, no número de espécies ameaçadas: o desmatamento para o uso de terras; as características e diversidades do bioma, que torna muitas espécies restritas à Mata Atlântica e, consequentemente, mais suscetíveis à extinção; além do fato de no bioma estarem os principais centros urbanos do país (inclusive Curitiba), o que resulta num conhecimento e maior e estudo sobre mais espécies.
O grande problema para quem se preocupa com o que acontecerá daqui para frente, no entanto, é que a Mata Atlântica, ainda que seja considerada patrimônio nacional pela Constituição e protegida por uma lei especial, segue sendo ameaçada pelo desmatamento. Prova disso é que entre os meses de outubro de 2021 e de 2022, a Fundação SOS Mata Atlântica e o INPE observaram o desflorestamento de 20.075 hectares (ha) do bioma, o correspondente a mais de 20 mil campos de futebol de futebol em um ano ou um Parque Ibirapuera (SP) desmatados a cada três dias. Como resultado, foram lançados 9,6 milhões de toneladas de CO2 equivalente na atmosfera.
Cinco estados acumulam 91% do desflorestamento: Minas Gerais (7.456 ha), Bahia (5.719 ha), Paraná (2.883 ha), Mato Grosso do Sul (1.115 ha) e Santa Catarina (1.041 ha).
No que se refere aos municípios, dez concentram 30% do desmatamento total no período. Desses, cinco estão situados em Minas Gerais, um no Mato Grosso do Sul e quatro na Bahia, sendo que três cidades baianas encabeçam a lista: Wanderlei (com 1.254 hectares desmatados), Cotegipe (907 ha) e Baianópolis (848 ha). Já entre os municípios paranaenses, os que mais derrubaram a floresta estão na região centro-sul e oeste. São eles: Reserva do Iguaçu (174 ha); Nova Laranjeiras (157 ha) e Pinhão (139 ha).
Mecanismos de proteção estão em risco. E o mundo inteiro sai perdendo com isso
Conforme o IBGE, a Mata Atlântica é o bioma brasileira com o maior número de espécies extintas: eram 7 em 2014, passando para 8 em 2022, com a inclusão da Perereca-gladiadora-de-sino (Boana cymbalum) na lista. Ela se junta a outras espécies da fauna nativa brasileira extintas nos diferentes biomas: as aves Maçarico-esquimó (Numenius borealis), Gritador-do-nordeste (Cichlocolaptes mazarbarnetti), Limpa-folha-do-nordeste (Philydor novaesi), Peito-vermelho-grande (Sturnella defilippii), Arara-azul-pequena (Anodorhynchus glaucus), e Caburé-de-pernambuco (Glaucidium mooreorum); o anfíbio Perereca-verde-de-fímbria (Phrynomedusa fimbriata); o mamífero Rato-de-Noronha (Noronhomys vespuccii), além da ave Mutum-do-Nordeste (Pauxi mitu), espécie extinta na natureza e que atualmente depende de programas de reprodução em cativeiro.
Na flora da Mata Atlântica, algumas das espécies ameaçadas de extinção são: pau-brasil, palmito-juçara, araucaria, gravatá, canelinha, pente-de-macaco, breu sem cheiro, umbu-cajá e jaborandi. Já na fauna, entre as espécies ameaçadas estão: lobo-guará, tartaruga-de-pente, boto-cinza, rolinha-do-planalto, rãzinha-de-barriga-colorida, rã-de-corredeira, gavião-cinza e atobá-de-pé-vermelho.
Com relação ao desmatamento, apenas 0,9% das perdas da Mata Atlântica se deram em áreas protegidas, enquanto 73% ocorreram em terras privadas – reforçando que as florestas vêm sendo destruídas sobretudo para dar lugar a pastagens e culturas agrícolas. A especulação imobiliária, acima de tudo nas proximidades das grandes cidades e no litoral, também é apontada como outra das causas principais. O respeito à Lei da Mata Atlântica e ao Código Florestal, portanto, deveria ser o primeiro passo para reverter essa situação. Mas esses mecanismos legais também estão em risco.
Um exemplo é a Medida Provisória (MP) 1150, aprovada no Senado neste mês, que abre brechas para que a restauração florestal no Brasil nunca aconteça. A MP, além de praticamente inviabilizar a recuperação de áreas degradadas, ainda continha graves “jabutis”. Um deles permitia maior derrubada de florestas nativas e acabava na prática com a Lei da Mata Atlântica.
Segundo Luís Fernando Guedes Pinto, diretor executivo da SOS Mata Atlântica e coordenador do Atlas da Mata Atlântica, o desmatamento está novamente vencendo. “E o mundo inteiro sai perdendo”, afirma ele.
Datas
Dia Nacional da Mata Atlântica
O Dia Nacional da Mata Atlântica tem como principal objetivo conscientizar a população sobre a importância de conservar esse bioma e frear o desmatamento, além de recuperar as áreas que foram degradadas. A data foi criada no dia 21 de setembro de 1999, através de um Decreto Presidencial, e o dia 27 de maio foi escolhido em referência à “Carta de São Vicente”, um documento escrito pelo Padre Anchieta em 1560 com descrições da biodiversidade das florestas tropicais nas Américas.