Na semana do primeiro turno das eleições, a PolĂ­cia Federal promoveu um “arrastĂ£o eleitoral” e colocou nas ruas ao menos 77 operações em 23 Estados para desbaratar crimes patrocinados por polĂ­ticos, em especial a compra de votos. Nessa ofensiva sem precedentes, a PF flagrou candidatos usando dinheiro Ă  farta para aliciar eleitores, especialmente de pequenos municĂ­pios do Norte e do Nordeste. Para driblar baixos Ă­ndices de popularidade eles adotaram estratĂ©gias de compra de apoio nas urnas oferecendo simpatias e mimos, a saber: exames mĂ©dicos de graça, material de construĂ§Ă£o, gasolina, motores de carro, roçadeiras, sacas de cimento, “cheque moradia”, cestas bĂ¡sicas e por aĂ­ vai.

Por reeleiĂ§Ă£o, alguns atraĂ­ram eleitores com a promessa de cargos pĂºblicos de boa remuneraĂ§Ă£o. A distribuiĂ§Ă£o de valores em espĂ©cie seguiu, por vezes, rito escancarado, desprovido de cautelas – registros de pagamentos via PIX e imagens de chuva de dinheiro na via pĂºblica comprovam a prĂ¡tica e reforçam os feitos de competĂªncia da PF.

O balanço do primeiro turno Ă© revelador: a PF apreendeu R$ 49,5 milhões em espĂ©cie durante as operações eleitorais. No ParĂ¡, um flagrante de R$ 5 milhões com um coronel da PolĂ­cia Militar e outro de R$ 1,1 milhĂ£o estocados em um jatinho no qual se encontrava um funcionĂ¡rio pĂºblico no Aeroporto Internacional de BelĂ©m – a aeronave, avaliada em R$ 11 milhões, tambĂ©m foi apreendida.

Os federais acharam dinheiro em malas, caixas de papelĂ£o, porta-malas, subsolo, porta-luvas e dentro da meia. Em um episĂ³dio, para tentar escapar do flagrante, suspeitos atĂ© se passaram por policiais penais.

Segundo o diretor-geral da Polícia Federal, delegado Andrei Rodrigues Passos, os inquéritos de caixa dois e compra de votos apuram, em especial, possíveis desvios do fundo eleitoral ou dinheiro proveniente do patrocínio ilegal de campanha.

“A PolĂ­cia Federal Ă© tambĂ©m a polĂ­cia judiciĂ¡ria eleitoral, e portanto criou um modelo de operaĂ§Ă£o para combater todas as modalidades de crimes que afetem as eleições. Cumprimos nossas missões constitucionais com muito vigor, com autonomia e responsabilidade, e os resultados sĂ£o fruto da dedicaĂ§Ă£o de milhares de policiais federais, a partir de diretrizes claras e uma coordenaĂ§Ă£o nacional efetiva”, afirmou Andrei ao EstadĂ£o.

Em meio Ă s diligĂªncias da PF chamam a atenĂ§Ă£o operações em sĂ©rie contra a influĂªncia de facções do crime organizado. O trĂ¡fico e o contrabando miram administrações pĂºblicas e cĂ¢maras de vereadores por meio do aliciamento de candidatos. Faccionados pegos com tĂ­tulos de eleitores que foram alvo de intimidações para votar em candidatos escolhidos pelo crime.

A PF identificou durante a campanha do primeiro turno a escalada de facções nas eleições de ao menos cinco Estados: Amazonas, Rio Grande do Sul, Acre, CearĂ¡ e AmapĂ¡. Na ParaĂ­ba, os federais prenderam a primeira-dama de JoĂ£o Pessoa LauremĂ­lia Lucena. Suspeita-se que sua gestĂ£o mantĂ©m as portas abertas para a facĂ§Ă£o Nova Okaida.

Como mostrou o EstadĂ£o, o PCC em SĂ£o Paulo avança a passos largos no universo polĂ­tico. TambĂ©m foram realizadas ações contra a disseminaĂ§Ă£o de desinformaĂ§Ă£o contra candidatos e casos de violĂªncia polĂ­tica de gĂªnero. No CearĂ¡, investigados instalaram uma escuta clandestina para captar diĂ¡logos Ă­ntimos de um candidato e usĂ¡-los em vĂ­deos recheados de calĂºnias e ameaças. No ParĂ¡, a PF barrou investigados que mesclaram pornografia com vĂ­deos de campanha de uma vereadora trans.

Outro foco da PF foi o uso da mĂ¡quina pĂºblica para corrupĂ§Ă£o eleitoral. Acenos ao coronelismo. Recursos do erĂ¡rio para compra de votos, distribuiĂ§Ă£o de combustĂ­veis e auxĂ­lios diversos. Servidores pĂºblicos foram detidos a bordo de veĂ­culos de campanha espalhando valores aos eleitores.

Em Parintins, no Amazonas, policiais militares e a cĂºpula do Governo, pessoal de patente na hierarquia do Executivo, estĂ£o sob suspeita de montarem um audacioso esquema para alçar uma aliada Ă  prefeitura.

As estratĂ©gias e truques incluem arregimentaĂ§Ă£o de eleitores, compra de desistĂªncia de adversĂ¡rios, mudança de domicĂ­lio eleitoral e atĂ© aliciamento de menores.

Um candidato estĂ¡ sob investigaĂ§Ă£o pela suposta aquisiĂ§Ă£o de 3,6 mil votos em Boa Vista. Outro, em Minas, conseguiu transferir cerca de mil tĂ­tulos de Governador Valadares para Divino das Laranjeiras, incrementando em 25% o colĂ©gio eleitoral.

A PF ainda conseguiu identificar, em alguns casos, os alvos dos corruptores. Em Roraima, um candidato foi flagrado em vĂ­deo dizendo a um eleitor com deficiĂªncia visual que outra pessoa votaria em seu lugar. Na residĂªncia de outro polĂ­tico, a PF encontrou cĂ³pias de tĂ­tulos de eleitores indĂ­genas. No PiauĂ­, 300 motoristas de aplicativo foram pegos recebendo entre R$ 100 e R$ 200 cada um por um “adesivaço”.