O ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), abriu nesta segunda-feira (18) a possibilidade de o tribunal punir bancos que aplicarem as sanções financeiras contra Alexandre de Moraes, seu colega de tribunal. O recado foi dado em uma decisão concedida em ação sobre a tragédia de Mariana. Nela, o ministro declarou que ordens judiciais e executivas de governos estrangeiros só têm validade no Brasil se confirmadas pelo Supremo.
A eventual punição aos bancos passou a ser considerada no Supremo após ministros terem uma primeira rodada de conversas com banqueiros sobre as sanções contra Moraes e considerarem a resposta aquém do esperado. A avaliação foi de que nenhum banco garantiu que as sanções financeiras não seriam aplicadas contra o ministro no Brasil, apesar de as restrições impostas até o momento se restringirem às transferências para o exterior.
Após a decisão de Dino, o Departamento de Estado do governo Trump publicou nas redes sociais um texto que diz que Moraes é “tóxico para todas as empresas legítimas e indivíduos que buscam acesso aos Estados Unidos e seus mercados” e que “nenhum tribunal estrangeiro pode anular as sanções impostas pelos EUA ou proteger alguém das severas consequências de descumpri-las”.
A decisão de Dino, publicada nesta segunda-feira (18), tem validade imediata. Ela define que leis estrangeiras e ordens executivas contra pessoas por atos em território brasileiro não têm validade no Brasil. “Entendimento diverso depende de previsão expressa em normas integrantes do direito interno do Brasil e/ou de decisão da autoridade judiciária brasileira competente”, completa o ministro.
Violação de regras
Ele ainda afirmou que a violação das regras estipuladas em sua decisão configuraria “ofensa à soberania nacional, à ordem pública e aos bons costumes”. “Desse modo, ficam vedadas imposições, restrições de direitos ou instrumentos de coerção executados por pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País, bem como aquelas que tenham filial ou qualquer atividade profissional, comercial ou de intermediação no mercado brasileiro, decorrentes de determinações constantes em atos unilaterais estrangeiros”, afirma.
Uma corrente no Supremo entende que a decisão de Dino impõe aos bancos a obrigação de não aplicar as sanções contra Moraes estipuladas pelo governo de Donald Trump. Se aplicarem, os bancos e seus donos podem responder judicialmente.
O caso recente mais rumoroso de empresa que descumpriu decisão do Supremo foi o do X (ex-Twitter). Em 2024, a empresa sofreu multas diárias de R$ 5 milhões e chegou a ter a operação no Brasil suspensa por se negar a excluir perfis alvos de decisão de Moraes.
Dois ministros do Supremo ouvidos pela Folha não descartam aplicar as mesmas medidas contra banqueiros que descumprirem a decisão de Dino. A expectativa, porém, é de que o tribunal não precise lançar mão de ações mais drásticas.
Mesmo sem citar Trump ou Moraes do STF, a decisão de Dino busca blindar Moraes do impacto da Lei Magnitsky –sanção financeira imposta ao magistrado pelo governo de Donald Trump, dos Estados Unidos.
Ele afirma, de forma ampla, que as leis nacionais obedecem a critérios de territorialidade – ou seja, a legislação estrangeira não tem eficácia no Brasil.
Escalada da crise
A decisão de Dino agora marca mais um capítulo na escalada da crise entre o Brasil e os Estados Unidos. O Em julho, Trump anunciou sobretaxas de até 50% para os produtos brasileiros e passou a revogar vistos de ministros do Supremo e integrantes do governo Lula (PT).
Ele justificou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado em 2022, sofre uma “caça às bruxas”.
Nos últimos dias, a gestão Trump diversificou as razões expostas para sanções contra o governo brasileiros. Uma delas foi o programa Mais Médicos, por meio do qual o Ministério da Saúde brasileira contratava médicos cubanos.
O principal ato contra autoridade brasileira, porém, foi a aplicação de sanções financeiras contra Moraes. A Lei Magnistky prevê que pode ser incluído no rol de sancionados quem colaborar com as condutas condenadas pelos EUA.
A pessoa punida recebe uma sanção da Ofac, Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros, que pertence ao Departamento do Tesouro dos Estados Unidos.
Por meio da decisão, o governo americano determina o congelamento de qualquer bem ou ativo que a pessoa sancionada tenha nos Estados Unidos e também pode proibir entidades financeiras americanas de fazerem operações em dólares com ela.
A medida incluiria o uso das bandeiras de cartões de crédito Mastercard e Visa, por exemplo. Os efeitos para as transações de Moraes em reais no Brasil ainda estão sob análise dos bancos. Até o momento, porém, eles têm entendido que somente transações internacionais, em dólar, estão bloqueadas, e as de reais estariam mantidas.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), diz ter transmitido ao secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, a avaliação de que bancos brasileiros não estão executando as sanções a Moraes pela Lei Magnistky na totalidade.