O segundo dia da ConferĂªncia de AĂ§Ă£o PolĂ­tica Conservadora (CPAC Brasil), versĂ£o tropical da cĂºpula da direita que ocorre no litoral catarinense durante este final de semana, teve lembranças Ă  monarquia, ofensas a figuras da esquerda e ataque Ă  imprensa.

De afirmações de que o PaĂ­s “vive uma ditadura” a reclamações sobre a atuaĂ§Ă£o do Supremo Tribunal Federal (STF), houve espaço, entre um discurso e outro, para propagandas que levam a marca do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), como a dos “Vinhos Bolsonaro”, que tem como sĂ³cio um dos organizadores da CPAC, o seu filho e deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Em seu discurso, o deputado gaĂºcho Tenente-Coronel Zucco (PL-RS) falou sobre tragĂ©dia climĂ¡tica que acometeu o Rio Grande do Sul entre abril e junho deste ano. “Disputa irresponsĂ¡vel, por ego e protagonismo durante a tragĂ©dia”, disse, apresentando em seguida imagens do presidente Luiz InĂ¡cio Lula da Silva (PT) e do ministro Paulo Pimenta, titular da Secretaria ExtraordinĂ¡ria de Apoio Ă  ReconstruĂ§Ă£o do Rio Grande do Sul.

Com vĂ­deos da tragĂ©dia, em que a mensagem “o povo pelo povo” foi ressaltada, em congruĂªncia com os discursos da direita de que nĂ£o houve ajuda suficiente do governo federal aos atingidos pelas enchentes, o deputado chorou segurando uma bandeira do Estado e disse que “esse espĂ­rito de uniĂ£o” serĂ¡ necessĂ¡rio nas eleições municipais deste ano, para colocar o que chamou de “pessoas boas” nas prefeituras.

Zucco ainda afirmou que a maior missĂ£o do campo Ă© “preparar a direita conservadora para o retorno em 2026”. “Vamos ter a maioria do Senado para dar um basta ao STF. Chega! Chega de interferĂªncia”, gritou, dizendo que Bolsonaro voltarĂ¡ Ă  PresidĂªncia.

O STF tambĂ©m foi alvo do comentarista Adrilles Jorge, que atacou diretamente o ministro Alexandre de Moraes, a quem chamou de “ministro abusador”. O comentarista afirmou que o ministro estĂ¡ “usurpando a democracia” e disse que hĂ¡ uma “ditadura no Brasil”.

Outro deputado que atacou o STF foi Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), apresentado como tetraneto de Dom JoĂ£o Pedro II. O parlamentar defendeu a criaĂ§Ă£o de sete Poderes, ao invĂ©s de trĂªs, somando “chefe de Estado”, “conselho de Estado”, “soberania popular” e “federalismo” aos jĂ¡ existentes.

O parlamentar afirmou que o PaĂ­s vive em uma ditadura, teceu crĂ­ticas ao STF e sugeriu que Ă© preciso repensar os investimentos em educaĂ§Ă£o, uma vez que a populaĂ§Ă£o estĂ¡ “parando de crescer”. ApĂ³s seu discurso, duas bandeiras do Brasil ImpĂ©rio foram levadas ao palco. Ele tambĂ©m defende uma nova constituiĂ§Ă£o, dizendo que a atual foi alterada por “esquerdistas” e “corruptos”, alĂ©m de “globalistas” que teriam comprado “boa parte do Congresso Nacional”.

Antes da entrada do deputado, um dos apresentadores fez menĂ§Ă£o a uma confusĂ£o que ocorreu mais cedo. Uma jornalista, ao tentar entrar no evento, foi hostilizada e chamada de petista pelo pĂºblico. O apresentador disse que a profissional foi “muito bem recebida como vocĂªs puderam ver, teve que sair escoltada, tadinha”. Durante o primeiro dia da cĂºpula, o repĂ³rter do EstadĂ£o tambĂ©m foi hostilizado quando abordou a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e indagou sobre indiciamento de Jair Bolsonaro no caso das joias da ArĂ¡bia Saudita.

Sobraram hostilidades tambĂ©m para a primeira-dama, RosĂ¢ngela Lula da Silva, a Janja. Outro apresentador, anunciando no intervalo entre as palestras que havia objetos perdidos, comunicou que tinha sido encontrado um prendedor de cabelos, comumente chamado de “piranha”. “Na minha mĂ£o esquerda tem uma piranha. Uma piranha bem grande”, disse, quando alguĂ©m da plateia diz algo inaudĂ­vel. Ele responde: “É a Janja? Eu nĂ£o posso falar isso no microfone”, diz rindo e muda de assunto.

O principal discurso deste segundo dia de evento foi do presidente argentino, Javier Milei, que coleciona embates com o presidente Luiz InĂ¡cio Lula da Silva (PT), mas nĂ£o o citou durante sua fala. Ele afirmou, no entanto, que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) Ă© vĂ­tima de uma perseguiĂ§Ă£o judicial no PaĂ­s. Nesta semana, o ex-presidente brasileiro foi indiciado pela PolĂ­cia Federal por peculato, lavagem e associaĂ§Ă£o criminosa no caso das joias sauditas, revelado pelo EstadĂ£o em março do ano passado.

Primeiro dia teve palestra de Bolsonaro, TarcĂ­sio e Derrite

O primeiro dia do evento, no sĂ¡bado, 6, contou com discursos do ex-presidente e de aliados, como o secretĂ¡rio de Segurança PĂºblica de SĂ£o Paulo e deputado federal licenciado, Guilherme Derrite (PL).

Aplaudido pela plateia ao falar de criminosos “neutralizados” – jargĂ£o da polĂ­cia para “mortos”-, a palestra do secretĂ¡rio sobre o crime organizado foi marcada por crĂ­ticas ao governo do presidente Luiz InĂ¡cio Lula da Silva (PT) pela suposta falta de estratĂ©gia para combater as organizações criminosas.

O secretĂ¡rio, que tem sido criticado por organizações sociais que apontam excessos praticados pela polĂ­cia em operações na Baixada Santista durante sua gestĂ£o, apresentou um organograma do Primeiro Comando da Capital (PCC) e falou sobre operaĂ§Ă£o na Ă¡rea. “Infelizmente foi dominada pelo crime organizado, nĂ³s tivemos que fazer uma verdadeira retomada do territĂ³rio”, disse, acrescentando que foi hostilizado pela mĂ­dia, junto com o governador TarcĂ­sio de Freitas (Republicanos), pela alta letalidade das operações.

Em seu discurso, TarcĂ­sio elogiou Derrite e disse que o secretĂ¡rio estĂ¡ fazendo um “trabalho extraordinĂ¡rio e corajoso”. “Em SĂ£o Paulo o crime organizado nĂ£o vai ter mais vez”, afirmou o governador.

A CPAC foi criada em 1974 nos EUA e sua versĂ£o brasileira Ă© realizada desde 2019. Os organizadores no PaĂ­s sĂ£o o Instituto Conservador Liberal, presidido pelo advogado SĂ©rgio Santana, e pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro. O evento reĂºne o ex-presidente ao presidente da Argentina, Javier Milei, alĂ©m de outros nomes da direita, em BalneĂ¡rio CamboriĂº (SC), apontada como novo polo conservador do PaĂ­s. O discurso de Milei deve encerrar o evento no final da tarde deste domingo, 7.