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Lula e Bolsonaro (Fotos: Franklin de Freitas/Valter Campanato-Agência Brasil)

Tanto petistas quanto bolsonaristas dizem confiar no próprio grupo político quase na mesma proporção em que confiam em suas famílias. O dado consta em uma pesquisa sobre polarização obtida pela Folha e realizada pelo ConnectLab, novo centro de estudos da FGV, em parceria com a Quaest.

Em uma escala de 0 a 10, bolsonaristas têm o nível de confiança de 8,3 em suas próprias famílias, em média. Já em relação aos seus próprios grupos políticos, a confiança chega a 7,8. Petistas chegaram ao valor de 7,5 em termos de confiança em familiares e de 7,3 de confiança no grupo político.

Com isso, a confiança relatada por ambos em pessoas de seu próprio grupo é maior que a que eles dizem ter nas pessoas de modo geral. O índice que ficou em 4,5 tanto entre bolsonaristas quanto entre petistas.

E se o nível de confiança já cai bastante nessa comparação, ele despenca em relação ao grupo oposto. De bolsonaristas em relação a petistas, o valor atingiu 0,8, em média, enquanto o de petistas em relação a bolsonaristas é igualmente baixo, ficando em 1.

Foram ouvidas 2.004 pessoas com 16 anos ou mais de 13 a 17 de agosto de 2025, a margem de erro para a amostra total da pesquisa é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.

Análise

Para Nara Pavão, professora da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) que faz parte do grupo que conduziu o estudo, esses dados são tanto indicativo de força dos apoiadores do presidente Lula (PT) e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na sociedade brasileira quanto mostra do tamanho da lacuna que os separa.

“Tem essa tendência de confiar no seu grupo como se fosse a sua família e de desconfiar do outro grupo mais do que eu desconfio nas pessoas desconhecidas, que são as pessoas em geral”, diz ela. “Isso revela a força desses grupos, porque, veja, a confiança na família é a confiança mais alta que a gente tem no Brasil.”

Um outro dado da pesquisa buscou mapear em que medida um grupo poderia estar ou não desumanizando o outro. O resultado é alarmante. Tanto petistas quanto bolsonaristas classificam seu grupo como inversamente mais evoluído que o grupo oposto.

“A gente criou uma escala de humanização com aquela famosa figura que vai do macaco ao Homo sapiens, da evolução do homem. Colocamos aquela figura e pedimos para as pessoas classificarem em que momento da evolução humana estariam os bolsonaristas e os petistas”, conta Felipe Nunes, que é diretor da Quaest e professor da Escola de Economia de São Paulo da FGV.

Evolução

Enquanto a classificação dos petistas quanto ao próprio índice de evolução, numa escala de 0 a 10, fica em média em 8,2, eles posicionam os bolsonaristas do lado oposto: 2,4. O mesmo ocorre entre bolsonaristas, que se autoclassificam, em média, com uma nota de 8,5 na escala de evolução, em contraposição a uma nota 2,5 atribuída a petistas.

“Eu tenho falado muito sobre polarização afetiva, que é tratar o adversário como inimigo. E é muito impressionante como bolsonaristas e petistas, de maneira simétrica, desumanizam os adversários”, diz Nunes, que é também coordenador do ConnectLab. “Essa história de que a polarização é assimétrica, a gente não concorda, nossa evidência aqui é bastante simétrica. Um lado vê o outro tão desumano como o outro.”

Segundo Nunes, a ideia é repetir a pesquisa anualmente para monitorar questões como polarização, desconfiança e apoio à democracia.

Os dados colhidos nesta primeira rodada mostram ainda o quanto a polarização acaba interferindo tanto nas relações pessoais do dia a dia quanto em escolhas práticas.

Polarização

Os entrevistados foram perguntados como se classificam politicamente, 31% se dizem independentes, 25% se posicionam à direita e 13% como bolsonaristas, já os que se dizem de esquerda foram 15%, enquanto 16% se classificam como petistas.

Por outro lado, quando perguntados qual acreditam ser o tamanho desses grupos, os respondentes pintam outro cenário percebido: independentes (15%), direita (19%), bolsonaristas (25%), esquerda (15%) e petistas (26%).

Com base nesses números, Nara e Nunes avaliam que a polarização percebida pela população seria maior do que ela de fato é. Enquanto bolsonaristas e petistas inflam as estimativas sobre seus próprios grupos, independentes subestimam seu tamanho.

Nara destaca que, na prática, o que de fato importa é a percepção, pois ela acabaria contribuindo para que as pessoas, inclusive, se polarizem ainda mais, gerando uma espécie de ciclo vicioso.