A PolĂcia Federal vai apurar, em procedimentos internos, se houve pressĂ£o do ex-presidente Jair Bolsonaro para aliviar investigações de familiares e pessoas ligadas a ele durante seu mandato. Segundo apurou o EstadĂ£o, procedimentos internos serĂ£o instaurados para avaliar se houve da parte de policiais omissões ou ações deliberadas para alterar investigações sensĂveis ao PalĂ¡cio do Planalto nos Ăºltimos quatro anos.
Bolsonaro trocou o diretor-geral da PF quatro vezes durante seu mandato, um procedimento incomum. Ocuparam o cargo os delegados federais MaurĂcio Valeixo, Rolando de Souza, Paulo Maiurino e, por Ăºltimo, MĂ¡rcio Nunes. O ex-presidente chegou a ser impedido pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de nomear Alexandre Ramagem para a direĂ§Ă£o da PF por suspeitas de que ele seria nomeado para interferir em investigações.
Um dos primeiros atos do novo chefe da PF, delegado Andrei Augusto Passos Rodrigues, foi trocar 18 superintendentes nos estados. Entre elas, a do Rio de Janeiro, reduto polĂtico de Bolsonaro e onde ele promoveu vĂ¡rias substituições nomeando pessoas de sua confiança em cargos que deveriam ser tĂ©cnicos.
Bolsonaro foi investigado pela PF por divulgaĂ§Ă£o de notĂcia falsa relacionando a vacina contra a covid Ă contaminaĂ§Ă£o pelo HIV. O ex-presidente tambĂ©m foi alvo de inquĂ©rito no Supremo Tribunal Federal (STF), em 2020, por suspeita de interferĂªncia polĂtica na PF, apĂ³s a saĂda do entĂ£o ministro da Justiça e Segurança PĂºblica, SĂ©rgio Moro.
Ao deixar o cargo, Moro acusou Bolsonaro de tentar interferir politicamente no comando da instituiĂ§Ă£o para obter acesso a informações sigilosas e relatĂ³rios de inteligĂªncia. Na ocasiĂ£o, o entĂ£o diretor-geral Mauricio Valeixo havia sido demitido por Bolsonaro acusado de nĂ£o repassar a ele informações sigilosas. Na avaliaĂ§Ă£o de Moro, a interferĂªncia polĂtica poderia levar a “relações imprĂ³prias” entre o diretor da PF e o presidente da RepĂºblica.
A saĂda de Moro ocorreu dias apĂ³s uma reuniĂ£o ministerial na qual Bolsonaro vociferou. “JĂ¡ tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e nĂ£o consegui. Isso acabou. Eu nĂ£o vou esperar f** minha famĂlia toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu nĂ£o posso trocar alguĂ©m da segurança na ponta da linha que pertence Ă estrutura”, disse. “Vai trocar; se nĂ£o puder trocar, troca o chefe dele; nĂ£o pode trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final. NĂ£o estamos aqui para brincadeira.”
As ameaças foram cumpridas. O delegado Hugo de Barros Correa, que havia sido superintendente da PolĂcia Federal no DF, foi removido para uma funĂ§Ă£o burocrĂ¡tica apĂ³s atuar no inquĂ©rito das fake news e investigar Jair Renan, quarto filho de Bolsonaro.
A delegada Silvia Amelia da Fonseca, que deu andamento ao processo de extradiĂ§Ă£o do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos foi exonerada da diretoria do Departamento de RecuperaĂ§Ă£o de Ativos e CooperaĂ§Ă£o JurĂdica Internacional (DRCI).
O delegado Franco Perazzoni, que conduziu a operaĂ§Ă£o que mirou o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, teve seu nome barrado para assumir a chefia do combate ao crime organizado. O ex-superintendente da PF no Amazonas Alexandre Saraiva foi exonerado apĂ³s acusar Salles de crime ambiental.
Novo diretor-geral
ApĂ³s a mudança de governo, o presidente Luiz InĂ¡cio Lula da Silva (PT) escolheu o delegado Andrei Augusto Passos Rodrigues para comandar a PF. O novo chefe da PF foi o responsĂ¡vel pela segurança do petista na campanha eleitoral. Depois da eleiĂ§Ă£o, foi escalado para o Grupo de Trabalho de Justiça e Segurança PĂºblica e coordenou o Grupo de Trabalho de InteligĂªncia EstratĂ©gica.
O governo nomeou nesta quarta novas chefias para 18 unidades da PF nos Estados. Os delegados RogĂ©rio Giampaoli e Leandro Almada da Costa sĂ£o os novos superintendentes de SĂ£o Paulo e Rio, respectivamente. As delegadas Larissa Freitas Carlos PerdigĂ£o, no Rio Grande do Nortes, Marcela Rodrigues de Siqueira Vicente, em GoiĂ¡s, e Tatiana Alves Torres, em Minas Gerais, tambĂ©m tiveram seus nomes publicados no DiĂ¡rio Oficial da UniĂ£o.
O ex-ministro Anderson Torres, que Ă© delegado da PF, reassumiu a funĂ§Ă£o de secretĂ¡rio de Segurança do Distrito Federal assim que Lula tomou posse. ApĂ³s os atos de vandalismo na capital no dia 8 de janeiro, Torres teve a prisĂ£o decretada pelo ministro Alexandre de Moraes. Torres, que estava nos Estados Unidos, voltou ao PaĂs e estĂ¡ preso.
Na mesma ediĂ§Ă£o, foram dispensados 26 chefes de superintendĂªncias da PolĂcia RodoviĂ¡ria Federal nos Estados e no Distrito Federal. Apenas o PiauĂ nĂ£o teve o comando dispensado nesta quarta. Os nomes dos substitutos nĂ£o foram publicados. Silvinei Vasques, o diretor da PRF na gestĂ£o Bolsonaro, foi acusado de agir para impedir que eleitores de Lula conseguissem votar promovendo do segundo turno da eleiĂ§Ă£o presidencial uma fiscalizaĂ§Ă£o em Ă´nibus de eleitores do petista.
O ex-presidente Bolsonaro estĂ¡ em Orlando e a reportagem nĂ£o conseguiu contato com sua assessoria.