
A cobrança de fidelidade feita por Lula na reuniĂ£o ministerial desta terça-feira (26) elevou a pressĂ£o interna de UniĂ£o Brasil e PP para desembarque do governo, movimento que jĂ¡ Ă© defendido publicamente hĂ¡ algum tempo pelos presidentes das duas siglas, Antonio Rueda e Ciro Nogueira.
Leia mais
- O que Bolsonaro e seus aliados esperam do julgamento
- Lula cobra fidelidade de ministros do centrĂ£o e admite que nĂ£o gosta de Rueda
Apesar de controlar quatro ministĂ©rios e a Caixa EconĂ´mica Federal, os dois partidos, que estĂ£o em fase final da montagem de uma federaĂ§Ă£o, atuam majoritariamente em prol de uma candidatura presidencial de TarcĂsio de Freitas (Republicanos) em 2026.
A ameaça de desembarque vem sendo liderada por Rueda, Ciro e o nĂºmero 2 do UniĂ£o, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto, mas foi adiada algumas vezes em decorrĂªncia da resistĂªncia de entrega dos cargos e pela proximidade do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (UniĂ£o-AP), com o governo.
ACM Neto, inclusive, solicitou que reuniĂ£o da executiva do partido (que jĂ¡ estava prevista para ocorrer na prĂ³xima semana) aborde o tema do desembarque da sigla da gestĂ£o petista.
Na terça (26), Lula cobrou fidelidade dos ministros do centrĂ£o e sugeriu que eles deixassem o governo caso nĂ£o se sentissem confortĂ¡veis para defendĂª-lo. Na reuniĂ£o ministerial, o presidente tambĂ©m citou nominalmente Ciro e Rueda.
Ele afirmou que nĂ£o gosta do presidente do UniĂ£o Brasil e que a recĂproca Ă© verdadeira. Sobre Ciro, lembrou que o senador foi ministro de Jair Bolsonaro (PL) e disse que ele enfrenta dificuldades para se reeleger no prĂ³ximo ano.
De acordo com relatos, os dois dirigentes partidĂ¡rios se queixaram a interlocutores sobre essas declarações. Aliados dos polĂticos dizem que a fala de Lula gera mal-estar, mas reconhecem que o presidente estĂ¡ certo em cobrar ministros do governo.
Na noite de terça, Rueda reagiu Ă s cobranças e disse que elas mostram a “importĂ¢ncia de uma força polĂtica que nĂ£o se submete ao governo”.
“Na democracia, o convĂvio institucional nĂ£o se mede por afinidades pessoais, mas pelo respeito Ă s instituições e Ă s responsabilidades de cada um. O que deve nos guiar Ă© a construĂ§Ă£o de soluções e nĂ£o demonstrações de desafeto”, escreveu Rueda nas redes sociais.
TensĂ£o no Congresso: com esquerda minoritĂ¡ria, Lula distribuiu ministĂ©rios
Com a esquerda minoritĂ¡ria no Congresso, Lula distribuiu 11 ministĂ©rios a cinco partidos de centro-direita ou de direita com o objetivo de garantir governabilidade. Apesar de no papel contar com uma folgada maioria de 368 dos 513 deputados, na prĂ¡tica essa base Ă© bem mais instĂ¡vel e aplica sucessivas derrotas ao PalĂ¡cio do Planalto.
Nas Ăºltimas semanas, por exemplo, Lula viu a oposiĂ§Ă£o tomar conta da CPMI (ComissĂ£o Parlamentar Mista de InquĂ©rito) do INSS com o apoio de parte do centrĂ£o. O grupo ameaça ainda desfigurar a proposta considerada como um dos carros-chefe da candidatura do petista Ă reeleiĂ§Ă£o, o aumento da faixa de isenĂ§Ă£o do Imposto de Renda.
O possĂvel desembarque de PP e UniĂ£o tem potencial de ampliar essa instabilidade. O governo veria reduzida sua base oficial para 259 deputados, apenas dois a mais do que a metade, agravando o atual cenĂ¡rio de dificuldades no Congresso.
Nos bastidores, a cobrança de Lula foi vista por integrantes do centrĂ£o como sinal de que o petista se sente em condições de concluir o governo mesmo sem maioria no Congresso, apostando na recuperaĂ§Ă£o de popularidade por meio de pautas como a defesa da soberania nacional e a ampliaĂ§Ă£o da isenĂ§Ă£o no IR.
Um cardeal do centrĂ£o afirma que a fala do presidente acelera o processo do desembarque, mas diz que isso nĂ£o deve ocorrer imediatamente. A possibilidade foi discutida em reuniões ao longo desta quarta (27) entre polĂticos dos dois partidos.
Deputados do UniĂ£o Brasil devem levantar a discussĂ£o em reuniĂ£o da bancada nesta quarta. Parlamentares dizem que a bancada deve ser consultada antes de qualquer decisĂ£o, jĂ¡ que o ministro Celso Sabino (Turismo) Ă© deputado federal licenciado e foi indicado ao cargo pelos colegas.
O deputado Fabio Schiochet (UniĂ£o-SC), um dos mais prĂ³ximos a Rueda, diz Ă reportagem que vai pedir para o lĂder da legenda, Pedro Lucas (UniĂ£o-MA), pautar essa questĂ£o no encontro. “O Celso Ă© meu amigo, mas nĂ£o tem mais como a gente continuar depois de ontem. Ou a gente faz isso ou vai passar a ser desmoralizado”, afirma.
O nome de Sabino foi levado ao governo, em 2023, com uma lista de apoio assinada por 51 dos 59 integrantes do partido, mas a permanĂªncia no governo Lula tem adesĂ£o mĂnima na bancada da CĂ¢mara, de acordo com os deputados.
Na avaliaĂ§Ă£o de parlamentares do UniĂ£o Brasil, os outros dois ministros ligados Ă legenda —Waldez GĂ³es (Desenvolvimento Regional) e Frederico de Siqueira Filho (Comunicações)— sĂ£o indicados por Alcolumbre e, portanto, nĂ£o deverĂ£o deixar os cargos agora, jĂ¡ que o presidente do Senado nĂ£o indicou disposiĂ§Ă£o de ruptura com o Executivo.
TambĂ©m afirmam que os cargos de segundo e terceiro escalĂ£o nĂ£o devem ser afetados, jĂ¡ que a maioria dos indicados por eles para esses postos nĂ£o Ă© filiado ao partido.
Governistas tambĂ©m minimizam as ameaças de desembarque neste momento e dizem ser positivas as manifestações de Lula por indicar a disposiĂ§Ă£o de fazer uma disputa polĂtica. Eles afirmam que escutam o discurso de alas dos dois partidos hĂ¡ meses, mas sem indicativos de que as siglas estariam dispostas a entregar seus cargos na gestĂ£o federal.