Há 40 anos o Paraná mergulhava na maior crise de sua história. No dia 18 de julho de 1975, o solo de boa parte do território paranaense amanheceu coberto por uma espessa camada de gelo provocada pela geada negra.

Paradoxalmente, essa tragédia que provocou o maior choque migratório do Sul do País, levando 2,5 milhões de pessoas a abandonarem o campo e 1,5 milhão a deixarem o Estado, abriu caminho para um novo ciclo de desenvolvimento econômico do Estado, com diversificação da atividade agropecuária e o início da industrialização. No olho do furacão estava o empresário Jaime Canet Júnior, que havia assumido o governo quatro meses antes e, pelas mãos do destino, assumiu a missão de transformar o que seria uma crise sem precedentes, em oportunidade de renascimento.

Parte dessa saga está sendo contada agora no livro No tempo do Canet – a história do Paraná na década de 1970 – escrito e organizado por Belmiro Valverde, Adherbal Fortes e Antonio Luiz de Freitas, a partir de relatos do próprio ex-governador. Nascido em Ourinhos (SP) em 1925, Canet mudou-se para Curitiba com os pais ainda criança e depois de uma bem sucedida carreira como empresário, iniciou-se na política nos anos 60, na campanha vitoriosa de Ney Braga ao governo, ajudando também a eleger, na sequência, Paulo Pimentel. Depois de presidir a Café do Paraná e o Banestado, no primeiro governo de Pimentel, filiou-se à Arena em 66, e foi eleito vicegovernador na chapa de Emílio Gomes. Em 1974, foi escolhido pelo presidente Ernesto Geisel para assumir o governo, do qual tomou posse em março do ano seguinte.

Logo no início do mandato, Canet teve que enfrentar as consequências da geada negra, que acabou com a cafeicultura e provocou o êxodo rural, levando milhões de pessoas a mudarem para outros estados ou migrarem para as cidades – onde não haviam empregos suficientes, nem infraestrutura para acomodar essa população. Para piorar, o café era responsável por 50% da receita do Estado e pela sustentação da economia paranaense. A erradicação da cultura provocou, já no ano seguinte, um corte de 20% do orçamento de seu governo. 

Ao invés de lamentar-se, o governador arregaçou as mangas e partiu para a ação. Com o apoio do governo federal e das prefeituras, lançou um ambicioso programa de investimentos em obras rodoviárias. E programas de crédito para estimular os produtores rurais a investirem em outras culturas, que não o café.

Industrialização

Em pouco tempo, a agricultura do Estado se recuperou. A tragédia acabou abrindo caminho para a diversificação e novas culturas, como as da soja, trigo, milho, além da agropecuária. E o Paraná passou a ser líder ou destaque na produção de 13 dos 15 principais produtos agrícolas do País.

Ao final dos quatro anos de mandato, Canet também entregou o Estado com mais de 4 mil quilômetros de rodovias pavimentadas. De 93 municípios servidos por asfalto em 1974, esse número chegaria a 260 dos 299 existentes em março de 1979, quando ele deixou o governo, o que significou que 85% da produção paranaense e 90% da população passou a trafegar por estradas pavimentadas.

As novas culturas agrícolas, porém, empregavam muito menos pessoas. Era preciso investir na industrialização e na geração de empregos urbanos. Com a ajuda do presidente Geisel, o governador conseguiu atrair a sueca Volvo para o então incipiente projeto de criação da Cidade Industrial de Curitiba. Isso em um Estado onde até 1970, só 13% da economia vinha da atividade industrial.

Oposição forte, apesar do regime

Apesar de ter sido indicado para o cargo pelo presidente Ernesto Geisel, em pleno auge da ditadura militar que comandava o País, o governo de Jaime Canet Júnior convivia com uma oposição forte no Estado. Com o fim do chamado milagre econômico provocado pela crise do petróleo e o desgaste do regime, o MDB angariava apoio popular e pressionava os governos locais.
Nas eleições de 1974 – um ano antes de Canet assumir o cargo – de um total de um total de 24,5 milhões de votos para o Senado, o partido de oposição obteve 14,5 milhões, ou 59%, conquistando 16 das 22 cadeiras em disputa, contra apenas seis da Arena. Incluindo Leite Chaves, eleito senador pelo PMDB do Paraná.
Da bancada federal paranaense na Câmara, 15 eram do MDB contra nove da Arena. Na Assembleia Legislativa, onde os últimos governadores paranaenses se acostumaram a contar com uma maioria folgada, Canet enfrentou uma situação bem diferente: eram 25 deputados estaduais do oposicionista MDB e 29 da Arena – ou seja, uma vantagem de apenas quatro cadeiras para o partido governista.