Nos três meses de verão a ocorrência de chuvas e tempestades com consequências desastrosas não é surpresa nenhuma; surpreende no entanto a quase total imobilidade dos poderes públicos nos nove meses restantes (tempo de uma gravidez inteira).
Vemos desabamentos, enchentes, desalojamentos e outras tragédias e aqueles a quem elegemos para nos representar e/ou administrar limitam-se a emitir platitudes como “choveu em um fim de semana o esperado para o mês inteiro…”, o que é até verdade, uma verdade que se repete ano após ano e deveria produzir novas expectativas para as precipitações desta época.
Culpa-se os infelizes que perderam suas casas, e só um burocrata instalado em gabinete refrigerado a duzentos quilômetros dos fatos pode ter a ingenuidade, ou cinismo, de achar que alguém mora com sua família em local perigoso e insalubre se tiver alternativa. Entre o final das águas de março e o início das próximas há tempo, e dinheiro alocado por diversos governos, para buscar soluções minimamente paliativas para problemas emergenciais de habitação, mas parece que há algum tipo de vantagem, sabe-se lá para quem, em permitir que a situação se perpetue.
Em paralelo a isso, assistimos as estradas federais e estaduais entrarem em colapso, também pelas tais chuvas de fim de semana que superam as de mês inteiro. Um caso particular é o da rodovia BR 277 no trecho entre Curitiba e Paranaguá. No final de 2021 o contrato (leonino) de concessão desta rodovia terminou e não foi renovado, medida positiva consideradas as taxas exorbitantes cobradas pelo pedágio, porém embora as datas de contrato não fossem segredo nenhum, a atitude governamental foi deixar a estrada sem administradora privada, e tampouco assumir plenamente sua gestão.
Estradas são “órgãos vivos” como sabem os engenheiros rodoviários, requerem cuidado e manutenção constante, tão maiores quanto maior seja seu uso, e no caso deste trecho da 277 o tráfego é pesado, principalmente de caminhões que demandam o porto de Paranaguá. Ao longo das estradas foram instaladas as chamadas praças de pesagem, para aferir se a carga por eixo dos caminhões estaria dentro de parâmetros toleráveis para a via, em muitas estradas, nesta inclusive, estas praças estão inoperantes, apenas ocupando espaço. A maioria dos caminhoneiros e empresas transportadoras têm consciência e respeito pelos próprios veículos, não excedendo sua carga, mas há os maus profissionais, partidários da filosofia de “levar vantagem em tudo” de triste memória, e excedem o esforço por eixo, considerando que em declive isto não representa tanto aumento de consumo de combustível, e sim infelizmente de desgaste de freios com decorrentes acidentes, ditos “fatalidades”.
Somada à deterioração da base, sub-base e revestimento da pista causada também por centenas, milhares, de passagens de veículos demasiadamente pesados, a drenagem e contenção dos taludes da área de serra não foram realizadas devidamente, se é que foram de algum modo, durante praticamente todo o ano, e a partir de outubro de 2022 ocorreram diversos deslizamentos e quedas de rochas na pista.
A princípio não se fez muito mais que sinalização e desvio de tráfego, só se iniciando reparos definitivos no final do ano, coincidindo com ruína do pavimento em outro trecho.
As pessoas que viajaram ao litoral no período de férias sofreram esperas de até quatro horas nas áreas de obras, trabalhadores que sonharam com férias e as vezes vindo de muito longe e ficando exaustos num período em que deveriam estar descansando de trabalhos por vezes muito desgastantes.
Comerciantes instalados nas estradas, nas cidades circunvizinhas e no próprio litoral sofrem prejuízos incalculáveis, muitos com extrema dificuldade na subsistência de suas famílias, prestadores de serviços que tem nesta época do ano a grande possibilidade de fazer seu “pé-de-meia” para enfrentar o restante do ano ficam desocupados e também desesperados.
Agora começa o escoamento da safra de soja comprometido pelos atrasos. É sensível a justificada irritação, e até exasperação, de motoristas prejudicados e por agricultores em risco de não ter silos para estocar sua soja e não podendo escoá-la para o porto, cumprindo até mesmo contratos já fechados de venda com prazos definidos. Fala-se em soja florescendo na estocagem, enquanto nós, meros usuários pagadores de impostos definitivamente não entendemos o que ocorre.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.