Basicamente, a imprensa se pauta por duas coisas: relevância e interesse público. Nem sempre são a mesma coisa. Um exemplo de relevância sem interesse público é a alteração da taxa básica de juros no mercado financeiro: gera impacto sobre toda a economia e, por tabela, sobre o bolso de todos os brasileiros, mas eles mal lêem e não compartilham essa notícia. Ao contrário, se uma celebridade do mundo pop resolve caçar pokemons no parque, isso não vai impactar sobre a vida de ninguém, mas muitos lêem e compartilham a notícia.
Veja texto de Luigi Poniwass que motivou essa resposta
Há, contudo, casos em que relevância e interesse público andam lado a lado. Como o primeiro encontro cara a cara do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o juiz Sérgio Moro, que comanda as investigações da Operação Lava Jato. Relevância porque trata-se do primeiro depoimento do ex-presidente, um dos principais citados na investigação política que gerou mais repercussão na história deste país. Interesse público porque ambos os personagens mobilizam uma legião de apoiadores. Nesse caso específico, apoiadores de um lado não toleram o outro. De um lado, são chamados de mortadelas; de outro, de coxinhas. Houve uma polarização ímpar. Há quem chame de Fla-Flu. Não se fala de outra coisa. Cabe a analogia com uma final de Copa do Mundo, já que Lula e Moro são os expoentes máximos de cada lado.
A analogia é apropriada também porque a cidade de Curitiba, palco do depoimento, recebeu uma Copa do Mundo três anos atrás. Em torno do palco do confronto, um perímetro de isolamento, acessível apenas a credenciados. Moradores do entorno tiveram que mudar a rotina por causa disso. Milhares de agentes da lei foram envolvidos. Policiamento percorreu a cidade para escoltar comitivas. Houve esquemas de segurança no aeroporto. De um lado, milhares de torcedores. De outro, mais milhares. Muitos deles que vieram especialmente para a ocasião. Hotéis lotados por apenas um dia. Isso aconteceu em 2014, em quatro jogos do Mundial, e acontece de novo. Esse esse clima de final de Copa poderia ser evitado dos dois lados? Sim, mas, como nenhum dos dois lados cedeu, e o encontro foi inevitável, todo o clima se fez. Aliás, o próprio Moro falou em clima de Copa. Isso é sensacionalismo? A imprensa noticia o que existe. Há algum erro na analogia com uma final de Copa? Apenas um: o encontro entre Lula e Moro, nesta quarta-feira, não vai encerrar um ciclo que só recomeçaria daqui a quatro anos.
Lycio Vellozo Ribas é jornalista