Entrevista com Octavia Spencer: “É difícil pensar como Deus”, diz ela

Redação Bem Paraná
A atriz Octavia Spencer, em A Cabana: “Deus, todo poderoso, representa todos” (foto: Divulgação)

Que tal um Deus longe dos estereótipos convencionais? Nada de barba branca e visual da Capela Sistina, de Michelângelo. Que tal um Deus que espalha amor, sabedoria e perdão ao próximo? E que tal se Deus colocasse a mão na massa para fazer a melhor torta do mundo? Esse Deus aparece em A Cabana, filme que estreia hoje em Curitiba. E Ele é Octavia Spencer, atriz dona de um Oscar e que foi indicada neste ano ao prêmio de coadjuvante por Estrelas Além do Tempo.

Nesse papel em A Cabana, Octavia faz um Deus que não precisa de intermediários para se mostrar a Mack (Sam Worthington). Tanto que, no filme, nem usa Seu nome, e sim atende por um apelido carinhoso, “papa” (não confundir com papas como Francisco). Combina com o filme a diversidade dos que estão ao Seu lado: Jesus Cristo (outro de quem não se diz o nome) é interpretado por um israelense, Avraham Aviv Alush. Sarayu, uma versão do espírito santo, por uma asiática, Sumire Matsubara. Sofia, a Sabedoria, pela brasileira Alice Braga. E “papa”, quando necessário, assume as feições do indígena Graham Greene.

Octavia veio ao Brasil para divulgar A Cabana. Para ela, é um filme que vai espalhar muito amor no mundo. A atriz ficou alguns dias no Rio de Janeiro — e disse à reportagem que está adorando o Brasil. Ela fala sobre como foi interpretar Deus nesta entrevista por telefone ao Bem Paraná.

Bem Paraná — A senhora leu o livro antes de fazer o filme? Há alguma diferença entre as duas obras? 
Octavia Spencer — Li, sim, sou uma ávida leitora. Na verdade, praticamente não tem diferença entre o livro e o filme. O livro é excelente. A mensagem é excelente. Para mim, teve uma natureza catártica.

Bem Paraná — O filme fala de um homem que muitas vezes julga as outras pessoas, baseado no que aconteceu a ele. Qual a sua opinião sobre isso?
Octavia Spencer — É complicado. A tragédia de Mack (o personagem de Sam Worthington) é uma coisa palpável. Muitas pessoas se sentem igual a ele. Ficam assim por toda a eternidade. O filme é capaz de mostrar que há caminhos para mostrar a capacidade de se perdoar.

Bem Paraná — Para você, qual foi a parte mais difícil de interpretar Deus, ou o “papa”?
Octavia Spencer — A parte mais difícil de interpretar Deus foi tentar pensar como Ele. As mensagens. O amor, a sabedoria. Nessa situação ou naquela, o que Ele faria? Foi um desafio imenso. Busquei fazer como uma mãe que ama seu filho.

Bem Paraná — Foi mais desafiador ser Deus ou ser uma das “figuras escondidas” em Estrelas Além do Tempo, seu filme anterior? 
Octavia Spencer — Foi mais difícil Deus, bem mais. Em Estrelas Além do Tempo, eu era uma mulher que sabia matemática num ambiente difícil. Deus, todo poderoso, representa todos. Eu tive que me desprender de alguns conceitos.

Bem Paraná — Para a senhora, foi uma jornada especial interpretar Deus?
Octavia Spencer — Com certeza!

Bem Paraná — A atriz Alice Braga é brasileira. Como foi trabalhar com ela? 
Octavia Spencer — Ela é uma atriz excelente, a cena dela com Mack é uma das minhas favoritas. Foi muito excitante trabalhar com ela. A Sabedoria (o personagem de Alice no filme) dela espalha mesmo muita sabedoria.

Bem Paraná — Você já ganhou um Oscar (por Histórias Cruzadas), foi indicada neste ano (por Estrelas Além do Tempo). Quais são seus próximos projetos?
Octavia Spencer — Tenho dois em vista, ainda não posso falar muito. Na verdade, nem sei qual deles vai sair primeiro (risos).


A CABANA TRAZ UM ACERTO DE CONTAS DIVINO
Mackenzie Philips é, sob certo aspecto, um cara de sorte. Ele tem uma chance de fazer um acerto de contas com ninguém menos que Deus. Cara a cara. Sem intermediários. É a premissa do filme A Cabana, que estreia hoje (30) em Curitiba. O filme é baseado no livro homônimo de autoajuda do escritor canadense William P. Young. Quantas pessoas no mundo não gostariam de uma conversa divina?

O problema é que Mackenzie, ou Mack (Sam Worthington), não queria ter que fazer esse acerto de contas. Mas as circunstâncias o levaram a isso. Presbiteriano de criação, temente a Deus — ou “papa”, como ele e a família carinhosamente O chamam —, ele perde a fé e se sente traído por Ele quando tem que encarar a pior dor possível para um ser humano: a perda de um filho. No caso, a filha mais nova, Missy. Ela desaparece misteriosamente quando está com o pai e os irmãos em um acampamento. Na busca, descobre-se não apenas que ela se foi, mas também como e por quê. Não há situação maior de estresse para um ser humano (estudos comprovam).

O encontro com Deus vem tempos depois, de forma inesperada. Mack recebe uma mensagem de “papa”, pedindo um encontro na mesma cabana que foi palco de toda a tragédia. Nessa jornada, ele encontra não apenas o “papa” (Octavia Spencer), mas também o filho (Avraham Aviv Alush), Sarayu (Sumire Matsubara) e Sofia, a Sabedoria (Alice Braga). Mack vai, disposto a fazer todos os questionamentos e descontar sua fúria com um argumento que parece pertinente: se Deus é bom, por que permitiu que algo tão ruim acontecesse a uma criança inocente?

A Cabana, aliás, parte desse raciocínio para dissertar sobre a capacidade de julgamento das pessoas. No plano mundano, elas se sentem no direito de julgar o que bem entendem, quando bem entendem, da maneira que bem entendem. Exemplo? Basta ver o que o mundo diz nas redes sociais. A verdade é outra. O que é bom para um pode ser ruim para outro. Como equalizar?

Pode parecer estranho pensar em um acerto desse tipo nos tempos controversos de atualmente. A atriz Angelina Jolie, que diz não acreditar em Deus, se envolve profundamente com questões humanitárias. Deputados brasileiros ligados a grupos religiosos usam o nome de Deus para disseminar discriminação e segregação. Ao chamar Deus de “papa” e de não dizer o nome do “filho”, o filme consegue fugir de rótulos que fatalmente o vinculariam a esta ou aquela religião. Afinal, a ideia é um acerto de contas direto, sem intermediários. Independente de qualquer tipo de fé.