As confissões de Dirceu Krüger para um ‘foca’ do Bem Paraná

Silvio Rauth Filho

Divulgação/Coritiba - Dirceu Krüger e a estátua

Agosto de 1996. Eu era um ‘foca’, um jornalista recém-formado, com 21 anos de idade, que acabava de ser contratado pelo Bem Paraná – na época, chamado de Jornal do Estado.

Minha primeira missão foi assumir o posto de setorista do Coritiba. Ou seja, acompanhar diariamente tudo que ocorria no clube.

Logo no primeiro dia, fui ao Couto Pereira para vasculhar notícias e, entre um corredor e outro do estádio, tive uma visão.

Estava ali, a poucos metros de mim, o Flecha Loira.

Minhas pernas tremeram.

Fiquei sem palavras, sem reação. Queria ter forças para dizer ‘boa tarde’, mas não consegui.

Fiquei apenas olhando Dirceu Krüger caminhar pelos cantos do Couto Pereira, enquanto ele era tratado pelos demais apenas como ‘aquele tiozinho que um dia jogou bola’.

E não culpo ninguém por essa atitude. Krüger já estava há décadas no clube, já havia virado parte da paisagem do Couto Pereira. E, além disso, dava a impressão de não gostar de ser tratado como ídolo, de ser bajulado.

A ARRANCADA DE 1996
Passado o susto de ver de perto um ídolo do futebol, nos meses seguintes, tive a oportunidade de ter diversas conversas com Krüger. Muitas foram exclusivas e quase todo o conteúdo eu nunca publiquei.

Na época, em agosto de 1996, Krüger era auxiliar-técnico e demonstrava saber tudo o que acontecia no futebol do clube, desde o sub-qualquer coisa até os profissionais, além dos meandros mais complicados da diretoria.

Apesar de todo conhecimento, ele parecia ter pouca influência no rumo do departamento de futebol.

O Coritiba começou o Brasileiro daquele ano apostando em Heron Ferreira como técnico. Não deu certo. Em seguida, trouxeram o veterano Pepe, que havia se destacado no Athletico um ano antes, em 1995. Não adiantou. O Coxa afundou ainda mais e o rebaixamento parecia o destino final.

A tendência de queda só foi revertida com a chegada de Marco Aurélio Cunha para o cargo de diretor de futebol. Na época, não foi bem recebido por parte da imprensa, que preferia nomes mais ‘íntimos’ do futebol paranaense. Anos depois, porém, Cunha ganhou destaque nacional conquistando cinco títulos importantes com o São Paulo (Mundial, Libertadores e 3 Brasileiros).

A APOSTA DE CUNHA
Nas primeiras conversas com Cunha, ele demonstrou que estava encantado com Krüger. Sua humildade, seu conhecimento de futebol e sua facilidade em resolver problemas do dia a dia. Era o nome perfeito para ser o técnico, para se tornar uma espécie de ‘Alex Ferguson’ do Coxa.

A primeiro jogada de Cunha foi colocar Krüger como interino. E o trabalho do Flecha Loira foi brilhante naquela reta final. Fixou Alex como titular absoluto, recuperou o futebol de Jetson e deu oportunidades a outras revelações da base, como Auri, Paulo Sérgio e Dirceu.

O Coritiba reagiu e passou a vencer jogos improváveis. Aplicou 4 a 0 na Portuguesa no Couto Pereira. A mesma Lusa que seria vice-campeã brasileira semanas depois. E aplicou 2 a 0 no Grêmio no Olímpico. O mesmo Grêmio que seria campeão brasileiro semanas depois.

O Brasileirão terminou com o Coxa em 14º lugar, sete pontos acima da zona de rebaixamento, e com a sensação que Dirceu Krüger merecia mais.

O PARANAENSE DE 1997
Marco Aurélio Cunha não estava satisfeito com Krüger como interino. Queria vê-lo como treinador efetivo. Krüger, porém, tinha receio. Em várias conversas, ele me explicou que temia ser demitido por qualquer par de derrotas e que ele não conseguiria viver longe do Coritiba. “O Coritiba é minha vida”, dizia.

Cunha jurou que Krüger não seria demitido em caso de resultados negativos e conseguiu convencê-lo. Também garantiu que o técnico teria participação na montagem do elenco.

Um dos reforços oferecidos foi o atacante Alex Alves, que havia se destacado no Vitória e no Palmeiras. Em conversa exclusiva, Krüger me contou porque recusou o jogador. Ele explicou que não queria jogadores com problemas extra-campo. E a história mostrou que o Flecha Loira estava certo. Alex Alves realmente era um jogador hábil e veloz, mas criou problemas graves por onde passou.

No fim das contas, Cunha e Krüger montaram um elenco barato, com jogadores remanescentes de 1996 e algumas apostas das categorias de base. Os principais nomes eram Anselmo, Alexandre, Zambiazi, Auri, Claudiomiro, Paulo Sérgio, Dirceu, Alex, Basílio e Brandão.

O time fez boa primeira fase e terminou em segundo lugar, com 9 vitórias, 1 empate e 1 derrota. A única derrota foi um 5 a 3 para o Paraná.

No octogonal final, o Paraná ficou com o título, com 11 vitórias, 2 empates e 1 derrota. O Coxa de Krüger fez a mesma campanha que o Athletico: 9 vitórias, 3 empates e 2 derrotas, mas ficou atrás do rival rubro-negro pelos pontos-extras trazidos da primeira fase.

DE VOLTA AOS VELHOS DIAS
O terceiro lugar no Paranaense não empolgou dirigentes, que só olharam para os resultados, não analisaram o momento especial vivido pelos rivais e desconsideraram o desempenho em campo. Marco Aurélio Cunha foi embora ser multicampeão no São Paulo. E Krüger voltou a ser o faz-tudo dentro do Couto Pereira.

Ele retornou aos velhos dias, sem mágoas. Pelo menos, publicamente.

Nas conversas com Krüger, ele deixava claro que não tinha rusgas com a diretoria e compreendia os dirigentes. No entanto, eu sentia uma certa tristeza nos olhos do Flecha Loira. Entre um jogo e outro, ele parecia fazer a mesma pergunta que eu sempre fiz: “por que nenhum paranaense acredita que Krüger pode ser um excelente treinador?”.

Nunca encontrei a resposta.