Há cerca de duas três semanas parei de amamentar. Faz duas três semanas que estou me ensaiando para escrever esse texto, minha despedida para uma das experiências mas fantásticas que vivi. Meu filho está com um ano e dois meses. Minha produção, que já era baixa, diminuiu drasticamente depois que alguns compromissos de trabalho me impediram de amamentar por quase uma semana.
Amamentar, para mim, não foi fácil. Meu leite demorou para descer. E quando veio, veio em pouca quantidade. Tomei muita água, chás, chá da mamãe, fiz massagem. E, por fim, comecei a tomar Equilid, um remédio forte e originalmente destinado ao tratamento de distúrbios psicológicos, mas que é usado também para aumentar a produção de leite.
Mesmo com tudo isso, não consegui manter a amamentação exclusiva. E meu filho virou flex: mamava no peito, mas também tomava leite artificial na mamadeira. Com toda a complicação dessa fase (ensinar a pega certa para o bebê, achar uma mamadeira que não fizesse ele largar do peito), acabamos formando uma coleção incomparável de mamadeiras e bicos, tudo para que o B não deixasse o peito.
Além disso, me acostumei a dar sempre o peito, em todas as mamadas, antes de partir para a mamadeira. Isso fazia o processo todo (trocar a fralda, dar o peito, arrotar, dar a mamadeira, arrotar) durar mais de uma hora. A impressão que eu tinha nos primeiros meses é que estávamos numa rotina perpétua que terminava quando já tínhamos que começar ela de novo, mais uma vez. Era exaustivo (e só sobrevivi às primeiras semanas graças ao apoio incondicional do meu marido).
Apesar de toda nossa preocupação com as chances do bebê não querer mais mamar no peito, o B seguiu firme na rotina peito+mamadeira durante todo esses 14 meses. Nem mesmo a minha volta ao trabalho (que fez com que algumas mamadas fossem feitas só na mamadeira) e a introdução da comida no sexto mês, com a consequência redução no número de mamadas, diminuiu a vontade dele de mamar no peito.
O início da introdução de comidas sólidas trouxe um momento muito gostoso na amamentação. Foi quando as mamadas começaram a ficar mais espaçadas. E mais tranquilas. Lembro com muito carinho das mamadas no meio da tarde, quando eu voltava da universidade e podia ficar sentada com o B no colo, mamando e fazendo carinho no cabelo do meu anjinho. Nessa fase as dores e machucados do início da amamentação (quando o bico racha, sangra, dói) já estavam num passado distante.
Quando o B completou 9 meses decidi parar de tomar o Equilid. O remédio é forte. E quanto tentei parar de vez, passei mal. Daí a minha obstetra me orientou a ir parando devagar, reduzindo lentamente a dose (que estava em três comprimidos por dia). Fiquei quatro meses nisso, até que parei totalmente.
Eu não queria, no entanto, parar de amamentar. Nas primeiras semanas depois que cortei o remédio totalmente a produção de leite até aumentou. Por coincidência essa fase aconteceu junto com um período de tranquilidade no trabalho. Daí eu conseguia (nem todos os dias) amamentar de manhã, de tarde e de noite.
Minha meta era continuar até o B largar o peito naturalmente. Só que a natureza não segue nossos planos, né? E quando a rotina no trabalho apertou tive que abrir mão de uma mamada da manhã (além das outras três manhãs em que tenho aula e já não conseguia amamentar) e de outra a noite. E passou a ser difícil de amamentar de tarde.
Isso acabou causando uma redução na produção do leite. E, ironicamente, também provocou uma mastite (surpresa, surpresa: mesmo pessoas com baixa produção têm mastite). Continuei a amamentar durante todo o tratamento, apesar da dor, mas a produção foi diminuindo, até que parou.
O próprio B foi perdendo interesse e largando o peito rápido a partir do momento que a minha produção caiu. E daí, a partir disso, o processo meio que aconteceu naturalmente. Então, em parte, consegui desmamar naturalmente, como queria.
Ainda não sei bem como me sinto em relação a isso. Estou feliz de ter conseguido amamentar por tanto tempo, apesar de ter pouco leite e ter precisado complementar. Mas, tenho que ser sincera: parar de amamentar te devolve uma sensação (ilusória) de liberdade, afinal você não é mais a única que pode dar conta de alimentar e acalmar o bebê. Porém, também dá uma saudade imensa da intimidade e carinho próprios da amamentação. Não tem prazer maior do que saber que, não importa o incômodo, seu filho sempre vai se acalmar no peito.
Amamentar, apesar dos percalços, foi uma experiência maravilhosa. É muito mais que alimentar. É dar carinho. É estabelecer uma conexão única com o filho.
No entanto, amamentar também é lidar com o preconceito que, veja bem, eu nem sabia que existia. Quando grávida eu pensava: vou amamentar. E pronto. Mal sabia eu que há um mundo de empecilhos lá fora. E que começa ainda dentro de casa, na boca das pessoas mais próximas, que insistem em fazer comentários que magoam e, veladamente, criticam a decisão da mãe de dar o peito.
Nesses 14 meses ouvi de tudo. Chega até a ser engraçado. Mas não é. Ouvi que amamentar é coisa de mãe africana (oi??) que não tem comida para dar pro filho. Que uma criança pode ficar viciada em peito (ah, essas crianças perversas). Que não tem porque se “expor em público”. Que eu já “fiz a minha parte” (de amamentar por seis meses), portanto não preciso continuar com isso.
Vivi também situações criadas por outros que parecem querem “nos proteger”, mas que no fundo são formas de cercear nosso direito de alimentar o próprio filho. Quer um exemplo? Já vi muita gente falando do quão bonitas são as salas de amamentação nos shoppings. São lindas mesmo. Mas daí você, mãe que amamenta, está tomando um café com as amigas e chega a hora de alimentar o filhote. E você acaba se sentindo constrangida a usar a tal sala linda ao invés de sacar a peitola e amamentar ali mesmo, enquanto continua a tomar um café e a bater papo durante os 20 minutos, meia hora que dura uma mamada. Afinal você, se quiser ficar por ali (e não atravessar o shopping com o bebê, a mala do bebê, carrinho, canguru etc sozinha – porque ninguém pode te acompanhar uma vez que esse acompanhante pode constranger outras mães que estejam amamentando) pode incomodar o povo que provavelmente foi amamentado quando criança, mas que agora acha isso um nojo (eu, hein?).
Daí você se vê num shopping cheio de gente, ao qual você foi para ver gente, vitrine, sentir que não é um ser isolado do mundo (sentimento muito comum na licença maternidade) e acaba numa salinha, sozinha, fechada (cheia de ursinhos desenhados na parede) para poder amamentar sem perturbar ninguém.
A Poliana em mim acha que isso tudo foi um aprendizado útil sobre a necessidade de se impor, mesmo quando nos sentimos sozinhas (e isso é tão comum na maternidade, né?). Um aprendizado sobre a natureza humana e como a repressão sexual ainda faz muitas vítimas (que o digam os que têm pavor de peito).
Mas o principal mesmo é que amamentar é amor, é viver o momento, é aprender que não precisamos fazer mil coisas ao mesmo tempo. O importante é viver esse pequenos momentos porque eles passam rápido. E uma hora acabam, como há três semanas, acabaram para mim. E deixaram uma marca imensa de amor e carinho no meu peito.