Receber um filho com Down

Redação Bem Paraná

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Ser mãe sempre foi o meu desejo mais real.  Desde pequena, quando eu ainda brincava de dar colo às bonecas e fazer comidinhas imaginárias, eu já sonhava com o dia em que seria mãe. Sempre amei crianças, engravidar era o maior presente que eu poderia receber de Deus – e recebi. Muito antes do que eu imaginava, mas recebi. A vida e suas surpresas… lembro que mesmo antes de fazer qualquer teste, eu já sabia que estava grávida, já sentia que um pequeno anjo de luz estava ali, prestes a se formar através do meu corpo. Minha gravidez era de risco, e mesmo com alguns médicos dizendo que meu bebê “não ia vingar”, ele vingou! Através de uma cesariana um pouco precoce, meu pequeno Lucca nasceu, cheio de vida.

Devido a uma cardiopatia congênita –má formação do coraçãozinho- ele teve que ficar por um tempo na UTI. Mas lá no fundo eu sabia que não era só isso, tinha alguma coisa que estavam me escondendo, mãe é mãe, a gente sente. Eis que um dia, uma médica chegou toda ponderosa até mim e perguntou se eu estava sozinha, disse que sim. Ela com muito receio me pediu a autorização para fazer o exame do cariótipo, pois haviam sinais no Lucca que indicavam que ele fosse portador de “alguma síndrome”. Nesse momento minhas pernas tremeram, meus olhos encheram d’água, e meu coração apertou. Autorizei, e apesar da angustia, fiquei feliz, pois o Lucca enfim recebeu alta. Comecei a pesquisar sobre as síndromes que existem, e me deparei com centenas delas, muito confusa e assustada com as informações que encontrei na internet, achei melhor esperar o resultado.

Dias depois fui buscar o exame, a mulher do balcão leu o que estava escrito, olhou pra mim com uma cara de dó e me entregou o papel. Para a minha surpresa: o Lucca era portador da Trissomia do Cromossomo 21, mais conhecida como Síndrome de Down. Nenhum exame durante a gravidez apontara algo nesse sentido. Mas o cariótipo era preciso, estava escrito ali com todas as letras, não tinha o que contestar… então, eu olhei para aquele bebê no meu colo: lindo, fofo, cheiroso, esperado, amado… era o Lucca, era o MEU FILHO! Eu não pretendia me iludir ou ignorar o que acabara de ler, mas bastava olhar para ele, com sua respiração tranquila e com seu olhar profundo, para saber que ele era muito mais do que a soma de seus cromossomos. Nesse momento eu decidi que aquele olhar de pena que a mulher que entregara o exame me lançou, não ia me abalar. Eu é que tinha que ter pena dela, por tamanha ignorância. Infelizmente receber uma criança “especial”  ainda é visto pela maioria das pessoas como algo triste, pesado, ruim. E não é. Embora tenha cuidados e estimulações a mais, é tudo muito normal!  O maior erro que vejo é rotular e limitar essas crianças logo ao nascerem. Como é que alguém tem a coragem de falar que seu filho não vai conseguir fazer um monte de coisas só porque possui a Trissomia 21? Ele mal nasceu e já estão o condenando para o resto da vida?

Assim como nós – considerados “normais”– não somos todos iguais, as pessoas com Síndrome de Down também não. Alguns falam cedo, outros mais tarde, alguns andam cedo, outros mais tarde, alguns gostam de nadar, outros preferem ler… e por aí vai. Cada um no seu tempo, cada um no seu ritmo, cada um com suas preferências. Por isso eu decidi confiar no potencial do meu filho e esquecer todas as limitações que muitos livros e muitos profissionais impõem. Assim, ele dará o melhor dele, e chegará no melhor que ele pode ser. E é isso que importa. Perfeição é utopia, ninguém nesse mundo é perfeito, estamos todos em constante evolução. Hoje, com um aninho, ele vive dando risada, é ligado no 220, corre pela casa, faz bagunça, come bastante, chora, brinca, faz birra, faz carinho, me chama carinhosamente de mamãe, beija muito, ama e é amado. Quero mais o que? Ou melhor, o que mais a sociedade quer? Não vejo nele antenas, nem parafusos ou qualquer outra coisa que o torne tão diferente dos outros, ou merecedor de pena.

No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, em média, a cada 600 nascimentos, 1 é de uma criança com Down. Nós não sabemos quem serão os próximos papais escolhidos, ou melhor, presenteados com a “síndrome do amor”, eles não escolhem cor, classe social e nem idade. Portanto, futuros papais e mamães: não tenham medo de receber um filho com Síndrome de Down!  Só o conhecimento e o real convívio podem acabar com esse estereótipo que foi criado durante décadas.    🙂