
Os senadores presentes à reunião da CPI da Pandemia ontem mostraram indignação com o depoimento de Marconny Albernaz de Faria, acusado de fazer lobby na negociação de contratos da Precisa Medicamentos com o Ministério da Saúde. Em diversas respostas, Marconny foi evasivo, alegou esquecimento ou invocou o direito ao silêncio obtido em habeas corpus do Supremo Tribunal Federal (STF). Isso levou o relator Renan Calheiros (MDB-AL) a qualificar o depoimento como o mais “cínico” desde o início da investigação e a mudar a condição de Marconny de testemunha para investigado da comissão.
“As descobertas vão sendo feitas e podem ser resumidas na seguinte imagem: você puxa uma pena e vem um, dois galinheiros”, disse o relator. Duas semanas atrás, Marconny havia apresentado um atestado médico para não comparecer à CPI, levando a comissão a ameaçar trazê-lo “sob vara” (coerção judicial).
O depoente foi vago em relação à sua atividade profissional, limitando-se a dizer que tem uma “empresa de assessoramento técnico-político” que faz “análise de estudos de viabilidade política” para empresas privadas. Ao relator Renan Calheiros, ele admitiu que teve parlamentares como clientes, mas alegou o sigilo dos contratos para não revelar nomes. “Pelo fato de eu ser de Brasília, fiz uma análise de viabilidade técnico-política para a Precisa, que tinha como objetivo aquisição de testes rápidos para detecção de covid-19”, limitou-se a explicar.
Marconny negou ser lobista, dizendo que seria péssimo na função, o que levou o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), a gracejar, comparando-o ao personagem Coiote, de desenho animado, que persegue em vão o Papa-Léguas. Irritado com as evasivas do depoente, Omar Aziz lembrou um vídeo da internet em que Marconny aparece discursando em tom veemente em manifestações pró-governo:
“Para subir em caminhão para falar mal de político, aí é macho. Mas quando o calo aperta, aí o cabra não é mais macho. Vai ao Supremo, tem diarreia, pede atestado médico. Chega aqui, a conversa é diferente”, protestou. De acordo com Omar Aziz (PSD-AM), Marconny pertenceria a um grupo formado pelo deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), pelo ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, pelo ex-secretário da Anvisa José Ricardo Santana e outros, suspeitos de operar em licitações.
‘Arquitetura ideal’ – Em mensagens de julho de 2020, obtidas pela CPI, Marconny conversa com Santana sugerindo “a arquitetura ideal”, aparentemente para direcionar um processo de licitação de compra de testes rápidos contra covid-19, eliminando concorrentes para atingir um resultado desejado. A licitação foi abortada pela Operação Falso Negativo, do Ministério Público do Distrito Federal.
O depoente disse não ter “nenhuma relação” com Roberto Ferreira Dias, embora o chamasse de “Bob” e o tenha recebido em sua casa para tratar da licitação, como demonstram as mensagens.
Em determinado momento, Marconny afirmou não conhecer nenhum senador da República, embora nas mensagens de seu celular ele faça referência a conversas com um “senador”. Para esclarecer a questão, Leila Barros (Cidadania-DF) pediu que a Polícia Legislativa levantasse o registro de todas as entradas de Marconny nas dependências do Senado.