Renato Freitas (PT): . Foto: Alep/divulgação

O secretário de Segurança Pública do Estado do Paraná, coronel Hudson Teixeira, entrou com uma representação na Assembleia Legislativa pedindo a cassação do mandato do deputado estadual Renato Freitas (PT) por causa de um discurso feito pelo parlamentar na sessão da última terça-feira, comentando dados divulgados pelo Ministério Público do Paraná sobre as mortes em confronto com a polícia no Estado. Na representação, Teixeira alega que Freitas infringiu o regimento interno da Assembleia, ao supostamente fazer “ilações infundadas, descabidas e distorcidas da realidade proferidas a militares estaduais e à Polícia Militar do Paraná”.

O relatório a que Freitas se referiu no discurso mostrou que o Paraná registrou 17,3% mais mortes em confrontos com policiais no ano passado do que em 2021. O levantamento revela ainda que, em 2022, foram 488 mortes, contra 416 no ano anterior. Os números consideram ocorrências com policiais civis e militares e guardas municipais.

No documento encaminhado ao presidente da Assembleia, deputado Ademar Traiano (PSD), o coronel cita que o parlamentar teria falado em “policiais covardes, assassinos, serviçais do mal.” Ele alega ainda que Freitas teria afirmando que a PM torna seu integrante “embrutecido por um treinamento desumano, como um animal, que a qualquer momento e ordem pode atacar outro animal; esse treinamento produz seres bestiais!”.

Generalização

Texeira argumenta que no discurso o deputado “exprime acusações de forma generalizada aos homens e mulheres que todos os dias vestem uma farda para proteger a população paranaense e cumprir a lei e, ademais, fere de morte alguns dos princípios que norteiam as ações da Polícia Militar do Paraná como o respeito aos direitos humanos, ao Estado Democrático de Direito e à dignidade da pessoa humana, que são pilares da educação militar, diametralmente ao contrário àquilo que foi referido pelo insigne Deputado, ao mencionar que o treinamento é desumano e embrutece os militares estaduais do Paraná”. O secretário acusa Freitas de infringir o artigo 269 do Regimento Interno da Assembleia, que versa sobre os “deveres fundamentais” dos parlamentares, mas não especifica quais dos nove incisos ele teria descumprido.

Inviolabilidade

Em nota, o deputado Renato Freitas diz que foi surpreendido pela representação. Ele afirma que ao contrário do que diz o coronel, não ofendeu a corporação de forma generalizada, o que, segundo ele, pode ser verificado no vídeo do discurso da sessão da Assembleia. Freitas afirma eu na gravação é possível constatar que suas falas referiam-se especificamente aos agentes dos casos por mim denunciados (Perseguição do Alto da Glória e a recente morte de Claudiney Teles Jr decorrente de tortura policial), e não se estendiam a toda a corporação”.

“A respeito das minhas opiniões sobre o treinamento recebido pelas corporações policiais, é de conhecimento público todas as problemáticas acerca da capacitação pela qual passam os agentes de segurança pública, denunciadas inclusive por ex-policiais”, defende.

O deputado lembra ainda que em sua fala, menciona os bons policiais. “Existe a polícia para defender a vida? Sim, também. E os policiais que não são serviçais do mal têm espaço na instituição para questionar os grupos de extermínio?”, cita.

Freitas destaca que a Constituição assegura a inviolabilidade dos deputados por suas opiniões, palavras e votos e que garantir a qualidade da prestação de serviços de segurança pública é obrigação de todos os representantes políticos, de modo que a fiscalização e denúncia do abuso da violência pelo Estado continuará sendo feita por nosso mandato, não sendo admitidas tentativas de intimidação por parte de poderes externos”.

Renato Freitas foi eleito deputado estadual nas eleições de 2022 com 57.880 votos, depois de conseguir suspender na Justiça a cassação de seu mandato de vereador de Curitiba, pela participação em uma manifestação contra o racismo em fevereiro do ano passado, na Igreja do Rosário.

Corporativismo

O PT do Paraná também divulgou nota manifestando “repúdio” a representação do secretário de Segurança, e apoio incondicional ao deputado do partido. O que vimos na representação do Secretário, documento que circula de forma não oficial, é o corporativismo colocado acima do que é certo, justo e correto. O Secretário, ao se deparar com denúncias de fatos que ocorreram e são notórios, ao invés de tentar corrigir os equívocos da corporação, se coloca na defesa de atos que mancham a boa reputação da PMPR”, diz a legenda.

De acordo com a sigla, Freitas, “ao se referir à parte ruim da Polícia Militar, foi enfático, direto, duro, mas não extrapolou os limites de sua imunidade” e a representação de Teixeir “nada mais é do que uma réplica do modus operandi de perseguir, ameaçar e tentar, por meio da intimidação, sempre ao mais fraco, menos favorecido, historicamente perseguido, para que ele se cale e não busque que a Justiça seja feita”.

“O Secretário de Segurança deveria cuidar da Polícia, e o deputado nada mais fez do que criticar os erros de uma pequena parte da corporação e dar voz à população periférica. O que se quer é calar os cidadãos que elegeram Renato Freitas para abordar, no Poder Legislativo, justamente temas como este”, critica a legenda.

“Gostaríamos de ver, por parte do Secretário, tamanha galhardia e coragem na defesa da PMPR contra os atos e golpes proferidos à instituição e aos praças pelo atual governo estadual, diante da não existência de concursos internos, escalas com mais de 80 horas semanais e operações midiáticas sem efeito real”, cobra o partido.

“Esse corporativismo também foi visto quando, na história recente do Paraná, um oficial médico abusou de mais de três dezenas de policiais femininas, e a corporação, covardemente, buscou um subterfúgio técnico para absolvê-lo”, lembra o partido.

O PT afirma ainda que se for confirmada a representação, “a melhor resposta do Secretário, neste momento, não seria a tentativa de intimidação de um parlamentar democraticamente eleito por uma parcela importante da população, historicamente marginalizada, mas o dispêndio dessa energia para corrigir os erros da corporação acima do corporativismo narcisístico, honrando aqueles bons homens e mulheres que defendem com a sua vida a nossa população, dia após dia”.

Para a sigla, o ato de Teixeira pode ainda configurar Crime de Responsabilidade, considerando que, ao usar de ameaça contra representante político “para afastá-lo da Câmara a que pertença ou para coagí-lo no modo de exercer o seu mandato” e “violar as imunidades asseguradas aos membros do Congresso Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados”, fere o artigo 6º da Lei 1079/1950.

A nota é assinada pelos deputados Requião Filho, líder da oposição na Assembleia Legislativa (Alep), Professor Lemos, líder do bloco PT/PDT, e Arilson Chiorato, presidente do PT Paraná.