A sessão de hoje da Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid no Senado foi novamente suspensa após o líder do governo Bolsonaro na Câmara Federal, deputado paranaense Ricardo Barros (PP), acusar a CPI de ter atrapalhado a compra da vacina Covaxin. O presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD/AM), reagiu, afirmando que a CPI impediu negócios suspeitos envolvendo a compra de vacinas pelo governo.
“O mundo inteiro quer comprar vacinas e eu espero que essa CPI traga bons resultados para o Brasil, produza um efeito positivo para o Brasil, porque o negativo já produziu muito, afastou muitas empresas interessadas em vender vacina ao Brasil que não se interessam mais…”
O ataque causou críticas imediatas. “Isso não é verdade”, disse a senadora Simone Tebet (MDB-MS). “Aí não dá”, emendou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). A declaração de Ricardo Barros foi feita quando ele respondia sobre a negociação de 60 milhões de doses, ao preço de US$ 17 por dose, da vacina Convidecia, produzida pelo laboratório chinês CanSino. A vacina é representada no Brasil pela Belcher Farmacêutica e entrou na mira da comissão.
Após a suspensão da reunião, Barros concedeu uma entrevista no Senado ao lado de governistas e reforçou as críticas. Ele disse “lamentar” o fato de o País não ter comprado as vacinas que entraram na investigação da comissão, citando Covaxin, Sputnik e CanSino. “Estou pronto para responder a todas as perguntas, mas não posso repetir que mentiras repetidas vezes se tornem verdade”, afirmou o deputado. De acordo com o senador Marcos Rogério (DEM-RO), o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), demonstrou disposição de cancelar o depoimento de hoje e aprovar uma nova convocação para Ricardo Barros.
O depoimento de Barros foi marcado desde o início por bate-boca entre ele e os senadores da comissão. O parlamentar negou ter envolvimento na compra da vacina Covaxin. Barros acusou a CPI de usar uma “narrativa” do deputado Luis Miranda (DEM-DF) para associá-lo ao caso de irregularidades na compra de vacina Covaxin e que as acusações causariam dano muito grande a sua imagem.
Em depoimento à comissão, Miranda disse ter levado ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), informações sobre suspeitas na compra dessa vacina. Segundo ele, Bolsonaro teria dito que Barros estaria por trás do suposto esquema. Hoje, o líder do governo negou que o presidente tenha citado o seu nome. Os senadores questionaram o fato de Bolsonaro nunca ter desmentido a versão de Miranda.
“O presidente nunca afirmou e não tinha como desmentir o que ele não afirmou. Eu acho correto que o presidente não se dirija ao deputado Luis Miranda, porque o deputado Luis Miranda fez uma quebra de confiança no relacionamento com o presidente. Mas o presidente nunca afirmou que eu estava envolvido no caso Covaxin, ele perguntou. E aí, todas as falas do Luis Miranda são nesse sentido, não há nenhuma em que ele tenha colocado de forma diferente”, alegou Barros. “E aí todas as falas do Luis Miranda são nesse sentido. Não há nenhuma em que ele tenha colocado de forma diferente. Aí, para confirmar essa narrativa que não é verdadeira, foram tentando criar fatos que me envolvessem”, disse o líder governista.
As críticas do parlamentar logo no início da sessão foram respondidas pelo presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM). “Seus comentários sobre a Comissão Parlamentar de Inquérito, o senhor fale daquela porta pra fora” disse, “Eu não estou interessado aqui na opinião do depoente sobre a CPI”.
O relator do colegiado, senador Renan Calheiros (MDB-AL) também reagiu às críticas de Barros. “Não vamos permitir que haja tumulto bate-boca. também não vou interromper. Mas não permitirei que vossa excelência manipule a verdade”, disse.
O filho do presidente Jair Bolsonaro, senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), que acompanha a sessão, pediu respeito ao depoente “Respeito é via de mão dupla. ele começou e já está sendo desrespeitado”, disse.
Um pouco antes do atrito, Barros negou que o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias tenha sido uma indicação sua para a Pasta. O deputado afirma que Dias foi indicado ao ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta pelo ex-deputado federal Abelardo Lupion (DEM-PR). Mesmo acusado de ter feito um suposto pedido de propina durante a compra de vacinas, Barros afirmou que o ex-diretor é uma “pessoa correta” .
“Nunca, em nenhum dos momentos, vi ele (Dias) envolvido em outra questão, alegou o parlamentar na defesa do ex-diretor.
O parlamentar também negou ser o responsável pela contratação da VTCLog, atual encarregada da logística para a entrega de vacinas do Ministério da Saúde. A empresa é investigada por suspeitas de superfaturamento de R$ 16 milhões na própria pasta. Segundo Barros, a companhia foi contratada pelo ministério após sua saída do Executivo.
Ex-ministro da Saúde no governo Temer, Barros foi o autor, em fevereiro, da emenda na Câmara que viabilizou a importação da Covaxin por meio da inclusão da Central Drugs Standard Control Organization (CDSCO), da Índia, na lista de agências reconhecidas pela Anvisa para permitir a “autorização para a importação e distribuição de quaisquer vacinas” e medicamentos não registrados na agência, desde que aprovadas por autoridades sanitárias de outros países. A CDSCO deu aval à Covaxin; no Brasil, a Anvisa chegou a ceder uma autorização prévia para importar o imunizante, mas cancelou a licença em meio às suspeitas. Barros negou que sua emenda tivesse relação com o caso.
Barros também negou que tenha tentado “enquadrar” a Anvisa para aprovação da Covaxin pela agência, quando citou essa expressão publicamente. “Eu enquadrei a Anvisa, efetivamente, quando apresentei um projeto que suspendia a exigência de fase três no Brasil, um PDL, e no mesmo dia a Anvisa se reuniu e retirou a exigência, entendeu que eu estava certa na minha posição”.
Sobre o uso de intermediários para compra de vacinas e o caso da Global Saúde, Barros declarou: “não tem esse negócio de intermediário, é representante legal exigido por lei”.
No fim de 2018, o Ministério Público Federal no Distrito Federal (MPF-DF) entrou com uma ação contra a Global Gestão em Saúde S. A., contra Barros e servidores que atuavam no Ministério da Saúde na época. A suspeita dos procuradores é de que o atual líder do governo beneficiou a empresa em contratos.