Há duas formas de viver a religiosidade: extrínseca e intrínseca (Imagem: Pixabay)
A religião é um elemento imprescindível para compreendermos a vida em sociedade. Desde o período mais antigo ela foi e tem sido decisiva para a instauração de crenças, um determinado tipo de cultura, estilos de vida, observação de costumes, decisões em relação a posicionamentos políticos e até mesmo em estratégias militares. Por essa razão, a situação mundial que se apresenta nos dias de hoje é, sem dúvida alguma, também fruto da influência religiosa.
E as interfaces do estudo de teorias sobre o desenvolvimento religioso realizadas por ciências de fronteira, como é o caso da Psicologia, oferecem subsídios para a análise de diversos campos de atuação humana, como a política, a economia, a educação, a saúde, dentre outros. Afinal, oportunizam distinguir não apenas dados históricos e contextuais dos processos que compõe uma religião em seu relacionamento com a sociedade, mas também permitem conhecer melhor o ser humano em sua essência e fazer uma análise mais assertiva dos perfis que envolvem sua personalidade.
Valor das pesquisas de Gordon Allport
Um autor de referência em estudos que tratam dos campos de religiosidade e psicologia e descreve a relação existente entre a personalidade humana e a religião é o psicanalista americano Gordon Allport (1897-1967). Para o pesquisador, a religiosidade é um fator importante à vida em sociedade, uma vez que contribui para que o homem conheça a si mesmo, seja capaz de refletir sobre sua existência e, também, para que utilize sua experiência com o divino como ferramenta para o amadurecimento de suas limitações.
Segundo Allport, não existe uma religião ideal ou alguém que viva a religiosidade de uma maneira plena e/ou perfeita. Contudo, o estudioso defende a teoria de que o aspecto cognitivo da vivência de uma religiosidade é sadio ao ser humano – vindo a ser uma importante ferramenta para acessar os traços de sua personalidade e para compreender como se relaciona com o mundo e consigo mesmo.
Dessa forma, ao formular os conceitos de “religiosidade intrínseca” e “religiosidade extrínseca”, Allport demonstrou que o homem é fruto não apenas de sua personalidade, mas também de seu grau de maturidade ante as influências que recebe do meio onde está inserido. Tal maturidade estaria atrelada a características importantes, como: o alcance de sua identidade pessoal, o despertar de uma relação de compaixão com os outros, a estabilidade emocional, a auto aceitação, a visão realista dos fatos e das pessoas, a aceitação dos fracassos e perdas, a conquista de um sentido orientador para a vida, dentro outros…
Nesse sentido, a religiosidade intrínseca seria aquela capaz de impulsionar essa maturidade, o dinamismo, a superação dos desafios que se apresentam ao longo da vida; já a religiosidade extrínseca seria aquela ligada à criança interior de um indivíduo, que alimenta suas carências e desejos de proteção, sendo utilizada muito mais por conveniência e necessidade do que pela fé propriamente dita e, assim, poderia até mesmo promover o fanatismo e a intolerância. Segundo Gordon Allport, temos duas formas de viver a religiosidade: extrínseca (baseada em necessidades, ritos exteriores e filiação institucional) e intrínseca (aquela de fato vinculada a uma escolha de vida).
Diante disso tudo, teorias como a de Allport são um subsídio precioso para refletir sobre o contexto da educação religiosa nos dias de hoje. Afinal, as relações existentes entre psicologia, educação e religiosidade são tão antigas quanto a própria constituição do saber humano e a necessidade do homem relacionar-se com o divino.
Contribuições do estudo da Psicologia no campo da religião
Cabe à sociedade de hoje perguntar-se sobre a contribuição pública que a religiosidade vivida oferece em meio aos desafios que se apresentam ao redor do mundo. Diferentemente dos tempos mais remotos, onde ela era instrumento de poder e de domínio, a religião dos dias de hoje precisa ser estudada e conhecida para representar um novo papel: o de ponte entre as pessoas.
Ela necessita conhecer sempre mais as características que compõe o ser humano em sua totalidade de modo a ensiná-lo não somente a relacionar-se com o divino ou a realizar os ritos que compõe sua doutrina, mas a evoluir constantemente de modo a atingir equilíbrio interior a fim de que seja capaz de contribuir com o respeito às diferenças, com o diálogo inter-religioso, com a paz, com o respeito à natureza e também com a cidadania. Esta certamente seria a resposta de “como” e “em que medida” a educação religiosa poderia contribuir de maneira mais decisiva para a transformação de nossa sociedade para melhor, onde a religião não seja um instrumento “usado para diversos fins” mas, sim, tratada em sua principal finalidade: oferecer respostas para a vida e para protegê-la.
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* Ana Beatriz Dias Pinto, é comentarista convidada do blog e nos traz reflexões sobre temas atuais e contextualizados sob a ótica do universo religioso, de maneira gratuíta e sem vínculo empregatício, oportunizando seu saber e experiência no tema de Teologia e Sociedade para alargar nossa compreensão do Sagrado e suas interseções.