Esta coluna será entregue com seis horas de atraso em razão da minha distração total e absoluta. Aproveito essas primeiras linhas para pedir desculpas públicas à santa alma que a edita todas as semanas. Agradeço também a paciência e compreensão pelas minhas muitas outras distrações e atrasos desde que ‘tudo isso começou’ – expressão que aponta entre as mais usadas por mim, nas últimas semanas, em um empate apertadíssimo com o ‘quando tudo isso passar’.

A distração é culpa (risos nervosos) da fala de Teresa Pinheiro e Daniela Romão em um encontro organizado pelo Grupo brasileiro de pesquisas Sándor Ferenczi do qual faço parte, que, só para ilustrar a confusão em que me encontro, se deu no sábado. Perdi também por distração total e absoluta. Minha sorte é que o encontro ficou gravado no YouTube e pode ser visto porque não estava online no horário original. Se puderem assistam.

Teresa falava do achatamento do futuro que estamos vivendo agora durante a pandemia. E me aliviou a lembrança de que este embaralhar dos dias é de todos nós. O futuro anda difícil de imaginar. Estamos diante de um grande ‘não sei quando’, ‘não sei como’, e o pior ‘não sei se’ coletivo. Tenho observado que esse achatamento do futuro traz consigo um relembrar o passado intenso e quase doloroso.

Para ficar no exemplo simples, aqui em casa, as meninas ressuscitaram um videogame antigo que já não era usado há tempos. Ficou de lado, mais precisamente, quando trocamos a TV por uma dessas HD. Demoramos muito para fazer a troca. Houve um tempo em que as amigas das crianças viam a nossa TV de tubo quase como uma atração de museu. Olha que profunda, que engraçada. Desde a mudança, a qualidade da imagens do jogo conseguiu ficar estranhamente pior, e elas que já não se interessavam tanto mais pelo brinquedo, o encostaram de vez.

Aí, ‘tudo isso começou’, e junto com as histórias da infância, os vídeos dos bebês que foram um dia e que tem se repetido aos montes nos celulares da casa e as mantinhas que já não usávamos mais há alguns invernos, o videogame voltou. Ocorre que os olhos já acostumados a uma vida em alta resolução se incomodaram com os pixels a mais, ou a meno,s e começou a corrida por consertar esse negócio. Elas começaram pedindo socorro ao pai, apelaram para a minha ajuda e, diante do insucesso de ambos, se puseram a trabalhar. Foi muita leitura de manual no google, vídeos técnicos no youtube e toda sorte de tentativa, até que a Larinha decretou: somos maiores que esse pedaço de plástico cheios de chips e vamos dar conta de conectar qualquer coisa que deve estar desconectada. Tratava-se de um cabo – um dos tantos que testaram – empoeirado em uma das muitas gavetas apertas e catucadas à exaustão. Um par de horas depois e minha Larinha tinha trazido de volta o futuro do pretérito para dentro da sala. Essa menina tem muitas coisas lindas, mas não se dobrar para as dificuldades é uma das que mais admiro nela. Lalá, o futuro está mesmo achatado, mas como disse Teresa, em sua fala inspiradora citando Krenak em Ideias para adiar o fim do mundo, quando o céu estiver muito perto de encostar na nossa cabeça, a gente empurra ele de volta para cima, nem que seja com um golpe virtual de videogame. Boa semana queridos.

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