*Carlos Roberto Claro
Desde os anos 1970 o Chile é um país em franca ascensão, não obstante os desastres naturais que enfrenta. Quando do golpe de Estado em 1973 – o general Pinochet retirou Salvador Allende do poder – houve significativas reformas econômicas liberais, sendo que os Estados Unidos forneceram os economistas da Escola de Chicago, assim denominados Chicago Boys, pois, tinha claros objetivos estratégicos em relação ao país (até então o Chile possuía governo apoiado pelos regimes soviético e cubano). O ideário dos dois países era justamente permitir que os economistas ali fizessem experiências econômicas, substituindo regime de inspiração européia por americana, neoliberal, com abertura de mercado ao mundo já globalizado. Capitaneados por Milton Friedman, tais economistas implementaram o capitalismo no Chile. Optou-se pelo desenvolvimento capitalista e de livre mercado e tudo indica que a experiência foi um sucesso.
Interessa aqui abordar a crise econômico-financeira da pessoa física (ou natural), ou seja, do ser humano. Bem ao contrário da legislação brasileira, ingressou no sistema jurídico chileno, em 20/12/2013, a Lei 20.720, que trata da reorganização e liquidação de pessoas jurídicas, bem como reestruturação de pessoas naturais. Estabelece o regime geral dos procedimentos concursais destinados à reorganização e/ou liquidação do passivo e ativo de empresa devedora e repactuação dos passivos e/ou liquidação dos ativos de pessoa física devedora. Em linhas gerais e de forma bastante sucinta, caso a pessoa natural tenha dívidas vencidas (ao menos duas) há mais de noventa dias corridos, plenamente exigíveis, e provenientes de obrigações cujo montante total seja superior a oitenta unidades de fomento, poderá abrir procedimento administrativo gratuito e voluntário, a fim de evitar a falência (insolvência civil). Possível formular o requerimento a cada cinco anos. Não pode ter sido notificada de demanda de liquidação forçada ou qualquer outra ação executiva. A Unidade de Fomento (CLF – Chilean Unidad de Fomento) é uma unidade parecida com o índice de preço ao consumidor (Brasil); utilizada para fixar o preço de empréstimos bancários, tributos e outros.
No Brasil, caso uma pessoa natural tenha mais dívida do que patrimônio, ou seja, está impossibilitada de honrar as obrigações livremente assumidas (falida, na prática), poderá se valer apenas do instituto insolvência civil, procedimento arcaico, ossificado e raramente utilizado pelo Direito. É, noutras palavras, o procedimento aberto para que o juiz declare a insolvência (falência) do ser humano, exteriorizando a todos que não pode pagar suas dívidas. Ao editar a Lei 11.101/05 o legislador pátrio em momento algum se preocupou com a crise econômica e financeira que envolve grande parte dos brasileiros, dos seres humanos que vêm sofrendo os deletérios efeitos do delicado momento nacional. O endividamento é cada vez maior e compromete de forma assustadora o orçamento doméstico. Muitos brasileiros já estão tendo de optar entre pagar as contas em dia ou fazer regulares refeições. Muitos não conseguem nem uma nem outra coisa. Triste e degradante momento.
Quase metade da renda familiar é comprometida para pagamento de dívidas, e tal situação é, no mínimo, preocupante. Observe-se que o novo Código de Processo Civil, que entrará em vigor no ano de 2016, nada dispõe a respeito da insolvência da pessoa física. Mais uma vez o legislador dormiu no ponto e nenhuma entidade representativa se alertou para tal falha, gritante. Dito em outros termos, aquele cidadão que possuir mais dívidas que bens não poderá, a partir do próximo ano, nem sequer requerer sua insolvência civil. Melhor não pensar muito, pois, o legislador pátrio tem outros afazeres.
*O autor é mestre em Direito e advogado em Curitiba. carlos@carlosclaro.adv.br
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Direito e Política
Os desafios do futuro
Carlos A. Vieira da Costa
Dias atrás participei de uma discussão bastante inusitada. O pai de uma menina pré adolescente externava sua preocupação diante das manifestações homoafetivas, cada vez mais comuns em nosso cotidiano. Num determinado momento ele disse que não tinha preconceito, mas sentia-se inseguro sobre como esta nova realidade poderia influenciar a formação de sua filha.
Nessa hora não me contive para dizer que era evidente que ele tinha preconceito, e a negação deste fato somente iria tornar as coisas mais difíceis, especialmente para a menina, pois a dissonância entre seu discurso e suas atitudes provocaria ainda mais confusão na cabeça da criança, que por certo já deveria estar em alguma medida contaminada pelos valores paternos.
Na psicologia está dissociação entre a mensagem verbal (o discurso) e a atitude (prática) é chamada de duplo vínculo, que muitos consideram a principal causa das neuroses.
O fato é que a preocupação deste pai decorre muito mais de uma insegurança pessoal do que propriamente de uma ameaça real, pois se a opção sexual reflete um valor moral, como querem os conservadores, uma família bem estruturada tem muito mais ascendência sobre os seus membros do que qualquer outro estamento social. E por outro lado, se a sexualidade é definida por um anseio íntimo ou biológico, então não há o que se fazer ou temer, pois passa a ser algo natural.
Portanto, a solução para as angústias desse pai atormentado, como muitos por aí, está mais perto e mais fácil do que parece. Basta que ele assuma seu preconceito e eduque sua prole de acordo com os seus valores, como deve ser, e se no futuro as coisas não saírem ao seu gosto, pelo menos terá a consciência tranquila e a desculpa de ter feito o que pode, mas que que no seu caso o fruto caiu longe do pé.
E parece que está é a melhor solução para fazer face às imposições de uma cultura do politicamente correto. Cada um deve viver de acordo com sua ideologia e seus valores, e o direito de um termina onde começa o direito do outro. Para além disto é com a lei
Então que cada um viva dentro do seu direito, até porque o mundo precisará de gente bem resolvida para enfrentar os desafios que nos serão impostos pelo futuro. O zica vírus, a dengue e a chikungunya que o digam.
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A Conduta e o Direito Penal
Da ocultação de patrimônio e outras coisas mais
Jônatas Pirkiel
Vivemos um momento da história do país que antes de surpreender a qualquer pessoa, assusta. Nunca se viu nada igual quando se observa como o poder está tão próximo da criminalidade. Seria até comum que pessoas detentoras de autoridade possa ter uma relação institucional com os mais diversos seguimentos da sociedade. Mas, em toda a nossa história sempre as autoridades tiveram o cuidado de não se aproximar tanto dos seus interlocutores a ponto de criar uma intimidade criminosa. Também, para não trazer para o seu patrimônio pessoal acréscimos advindos das relações chamadas institucionais.
Hoje, a promiscuidade chegou a tal ponto que autoridades, ainda nos cargos públicos ou não, não têm constrangimento algum em afirmar que usou o jatinho, ou a casa ou o sítio, ou o carro ou o dinheiro de pessoas que têm ou tiveram relações com o poder, ou que foram, direta ou indiretamente, beneficiados por atos destas autoridades.
São coisas que, no processo penal, não passam despercebidas pelos julgadores, ainda quando se verifica a atuação de magistrados que atuam nos processos Lavajato ou Zelotes. Ainda que usadas como matéria de defesa, não tem a idoneidade de convencer quem quer que seja. Não há como se justificar que bilhões tenham sido transferidos para contas destas autoridades, ou de seus familiares, por pessoas ou empresas que tiveram benefícios fiscais ou de outra ordem.
Não se quer excluir de ninguém o direito ao contraditório e à ampla defesa, mas não é e nunca foi moral e legal uma relação, ainda que pessoal, entre pessoas e o poder, quando aquelas recebem algum tipo de favorecimento, qualquer que seja. Quer pelo uso continuado de uma casa, de um sítio, de um apartamento, ou de um avião. Este tipo de relação, se não tivesse nenhum implicação legal, ainda assim seria imoral.
A questão mais relevante é que os investigados tentam desqualificar a instrução penal sob o argumento de que se trata de perseguição da elite ou da direita reacionária. Infelizmente, o que não se pode admitir que pessoas que tiveram nas mais importantes esferas do poder tenham, por si ou seus parentes, recebido alguma vantagem daqueles que foram, ainda que direta ou indiretamente, beneficiados pelo poder.
Fica difícil que os beneficiados possam justificar, ainda quando nada lhes favoreça, os seus enriquecimentos sem causa.
*O autor é advogado criminalista (jônataspirkiel@terra.com.br)
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Painel
Escrivão
Presidente do STF afasta aposentadoria compulsória de escrivão aos 70 anos, pois na condição de delegatário do poder público ele exerce suas funções em regime privado.
Previdência
Empresa que não recolhe contribuições previdenciárias deve indenizar trabalhador por danos materiais e morais, quando este é impedido de receber o auxílio doença. O entendimento é da juíza 10ª Vara do Trabalho de Brasília.
Assédio
Metrô de São Paulo terá de indenizar vítima de assédio sexual dentro de vagão, pois a empresa tem o dever de fiscalizar de forma eficaz o interior dos seus trens. O entendimento é da 19ª Câmara de Direito Privado do TJ de São Paulo.
IPVA
Lei do estado de Pernambuco que permite a cobrança do IPVA de barcos e lanchas é inconstitucional. O entendimento é do juiz da 6ª Vara da Fazenda Pública do Recife.
Fidelidade
O STJ considerou legal a cláusula de fidelidade em contratos de telefonia quando há concessão de benefícios ao cliente, como bônus, descontos e tarifas diferenciadas.
Cursos
Continuam abertas as matrículas para os cursos presenciais de Pós-Graduação, ofertados pela Academia Brasileira de Direito Constitucional – ABDConst. As aulas terão início em março. Inscrições no site https://abdconst.com.br/matricula/.
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Direito Sumular
Súmula nº 525 do STJ- A Câmara de Vereadores não possui personalidade jurídica, apenas personalidade judiciária, somente podendo demandar em juízo para defender os seus direitos institucionais.
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LIVRO DA SEMANA
Novo Código de Processo Civil anotado é um guia de conteúdo sólido para quem busca entender as alterações promovidas pela nova Codificação, por meio de comparação entre o CPC de 2015 e o CPC de 1973. O autor, Cássio Scarpinella Bueno, renomado docente e processualista civil, apresenta estudo consciso, objetivo e didático, que não fornece subsídios para entendimentos sobre novo Código, como também promove reflexões e críticas a ele. |
COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA
roney@jornaldoestado.com.br