DIREITO E POLÍTICA

Roma não paga traidores!

Carlos Augusto Vieira da Costa *

O pedido de asilo do americano Edward Snowden ao governo brasileiro reabriu a velha polêmica sobre a subordinação dos países periféricos aos interesses dos Estados Unidos da América. Todavia, verdade seja dita: o Brasil, dentre todos os países alinhados, sempre foi um dos mais independentes.
Se voltarmos um pouco no tempo iremos lembrar que Getúlio Vargas negociou à exaustão o apoio brasileiro aos países alinhados na 2ª Guerra Mundial, numa demonstração inequívoca da nossa independência política.
Mais tarde, já em 1961, no auge da Guerra Fria, Jânio Quadros deixou clara nossa autonomia ao condecorar o Ministro cubano Che Guevara com a Grã Cruz da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul, num gesto fundamental para o reconhecimento de Cuba entre os países latino americanos.
Por fim, em 1980 a não adesão do Brasil ao boicote dos EUA aos Jogos Olímpicos de Moscou apenas ratificou a nossa posição histórica de independência brasileira em face dos interesses norte americanos.
Portanto, por tradição não seria de estranhar se o governo brasileiro acenasse positivamente ao pedido de Edward Snowden, mas nem tanto. Snowden obteve as informações que divulgou para o mundo como funcionário da SNA – Agência Nacional de Segurança dos EUA e como funcionário da CIA – Agência Central de Inteligência Americana. Assim, muito além da indiscrição o vazamento das informações pode ser considerada traição por qualquer código de conduta. Mal comparando, imagine se cada homem ou mulher, depois de uma separação, saísse por aí divulgando os segredos partilhados na alcova? Por certo, seria no mínimo constrangedor.
Deste modo, por mais que Snowden possa merecer a simpatia de muitos por seu ato de coragem, o fato é que na política, desde os primórdios, vale outro princípio, que pode ser ilustrado pelo episódio do guerreiro lusitano Viriato que foi morto por um de seus subordinados após impingir derrotas vergonhosas aos romanos. O assassino, ao pleitear o reconhecimento de seu ato pelo Império, foi condenado sob a sentença: Roma não paga traidores!

*Carlos Augusto Vieira da Costa Procurador do Município de Curitiba

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SABER DIREITO

Duas visões

Roberto Victor Pereira Ribeiro *

Quando tenho tempo dedico um momento para escutar músicas – dos mais variados gêneros – uma vez que considero a música o idioma falado entre anjos. Já pensou o mundo sem música? Seria tão tedioso e triste.
Gosto muito de ler, escutar e assistir o Padre Fábio de Melo. Considero um teólogo de mão cheia, sem contar que tem um carisma especial, mormente no seu tom de voz e nas construções de raciocínio que nos transparece inteligência, calma e serenidade. Como todo religioso, o Padre Fábio tem crenças, ideologias e dogmas. Entretanto, proponho até mesmo para aqueles que se consideram céticos e ateus que escutem um de seus álbuns ou leia um de seus livros ou até mesmo assista uma de suas palestras no canal religioso da TV por assinatura. É uma experiência válida.
Em seu repertório tem uma música que considero genial. O título é Contrários. Já pensou caro leitor como a vida é cheia de CONTRÁRIOS? Não sabemos ao certo o que realmente é certo. Nas suas estrofes o padre compositor escreveu: Que o verso tem reverso; Que o direito tem o avesso; Que o de graça tem seu preço; Que o perto tem distâncias; E o esquerdo tem direito; Que a resposta tem pergunta; E o problema, a solução. E é isso mesmo. Tudo tem o contrário. Vivemos num mundo dualista onde tudo tem o outro lado, a outra visão, duas visões ou mais. Precisamos olhar pelos dois olhos para as duas facetas da situação e depois escolher a melhor para nós, para a família, para o próximo, para a sociedade, para a natureza, para o mundo…
Nunca me esqueço de um parente dizendo: Hitler foi péssimo, matou milhares de pessoas, cometeu atrocidades inconciliáveis para o mundo, mas, esse mesmo homem, que era um monstro, tirou a Alemanha da beira do caos, do colapso econômico, da falência e a elevou ao patamar de uma das maiores potências do mundo. Duas visões. Contrários.
No mundo antigo, arcaico, semisselvagem, os humanos não causavam dores nos outros de forma consciente, não causavam sofrimento ao próximo por puro prazer, muito menos aprisionavam semelhantes, nem para torturá-los, nem para abusar de seus trabalhos forçados. Entretanto, caro leitor, esses mesmos humanos não tinham o menor escrúpulo, o menor problema de ceifar a vida de uma criança, de um velho, de uma mulher, simplesmente agiam sob o pálio do instinto. Qualquer humano, inumano ou objeto que atravessasse suas vontades e seus destinos eram tirados da forma mais nefasta e violenta possível. Esses humanos não tinham remorso. Duas visões. Contrários.
Já pensou como seria bom viver num mundo onde os humanos não fizessem outros sofrerem por prazer, por cobiça, por crueldade? No passado foi assim, mas o instinto falava mais alto.
Defendo que o mundo sempre foi mundo. Assim como alguns defendem que o dinheiro do mundo é o mesmo ab initio, apenas só mudam de mão. A História nos demonstra cabalmente que o mundo já foi extremamente violento e hoje o mundo é: extremamente violento. O que precisamos fazer é parar de lamentarmos o mundo em que vivemos e olhar com outra visão. Na minha ótica essa outra visão deve ser sedimentada na educação. Se o mundo for visto pela lente da educação veremos um reflexo e uma figura bem mais equilibrada. Atenção, vamos parar de ter uma única visão do mundo: é assim mesmo não muda, está péssimo, ninguém vive mais e vamos passar a enxergar a outra visão, o contrário disto.

*O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito

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A CONDUTA E O DIREITO PENAL

Futebol, uma paixão nacional
 
*Jônatas Pirkiel

Apesar de ser uma paixão nacional, o nosso futebol não tem dado muitas alegrias ao nosso torcedor, considerando o que os times e a seleção vem fazendo mundo afora. Infelizmente, no tapetão (resultados que se decidem nos tribunais de justiça desportiva, não no campo) e nas arquibancadas o espetáculo é ainda mais deprimente.
Pessoas vão aos campos e não voltam para suas casas… As famílias têm medo de freqüentarem estádios onde jogam times de mais expressão. E as imagens produzidas com a violência das torcidas, dentro e fora de campo, agridem até quem, diretamente, não é afetada com este tipo de conduta, que não pode nem mesmo ser comparada à conduta dos animais (são mais civilizados).
Porém, há sinais de que isto pode mudar, quando se tem uma juíza como a senhora (ou senhorita) Karen Francis Schubert Reimer, que negou a liberdade aos envolvidos na tragédia do último dia 8 de dezembro, na Arena de Joinville, no jogo entre Atlético paranaense e Vasco, pela última rodada do Campeonato Brasileiro, justificando em sua decisão que: …a detenção dos torcedores é necessária para manter a ordem pública e evitar a continuidade deste tipo de violência. Os crimes cometidos foram classificados pela magistrada como hediondos e de extrema gravidade, mediante a grave violência à pessoa…o menos por ora, é conveniente a segregação dos acusados para manutenção da ordem pública, para que se afaste da sociedade pessoas que fazem do crime seu meio de vida e para que se evite que a soltura dos acusados sirva de estímulo para que persistam em práticas ilícitas….
De todos os envolvidos, num total de quarenta, cinco são torcedores do Atlético e 1 do Vasco, três foram foram transferidos do Presídio Regional de Joinville para a Penitenciária Agrícola. Outros dezesseis tiveram suas prisões decretas e são procuradores pela polícia do Paraná e Santa Catarina, e serão presos.
Este tipo de estupidez somente será freada com atitudes como a da Juíza de Joinville e quando os juízes começarem a entender que os homicídios praticados em estádios ou em outros espetáculos de grande porte, dentro ou fora destes locais, são crimes dolosos, porque as pessoas que agridem umas as outras, desta forma brutal e sem motivação, assumem o risco de matá-las.
Que o ano que começa seja melhor do que o que termina. A todos um Feliz 2014.

* O autor é advogado criminalista (Jô[email protected])

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DESTAQUE

Advogado pode ser contratado sem licitação

A natureza intelectual e singular dos serviços de assessoria jurídica e a relação de confiança entre contratante e contratado legitimam a contratação de profissionais de direito sem licitação. De acordo com a decisão, por maioria de votos, da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o administrador pode, desde que movido pelo interesse público, fazer uso da discricionariedade que lhe foi conferida pela Lei 8.666/93 para escolher o melhor profissional. 
A questão foi enfrentada pelo STJ ao analisar recurso especial de advogado contratado sem licitação pelo município gaúcho de Chuí. Decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) responsabilizava o advogado por ato de improbidade administrativa e o condenava a ressarcir o erário dos valores que recebera, além de suspender seus direitos políticos e o proibir de contratar com o poder público por cinco anos. 
Segundo os autos, o advogado teria sido contratado em 1997 pelo prefeito do município. Ele prestaria os serviços de assessoramento jurídico, planejamento e acompanhamento institucional. Para isso, receberia uma remuneração mensal de R$ 4.300, posteriormente reduzida para R$ 3 mil. 
A contratação dos serviços foi questionada pelo Ministério Publico estadual. Em seu pedido ao STJ, o advogado alegou que não há ilícito, uma vez que a contratação está entre as hipóteses excepcionais de inexigibilidade de processo licitatório. 
Para o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator do processo, a experiência profissional e os conhecimentos individuais do recorrente estão claros nos autos. Segundo ele, é impossível aferir, mediante processo licitatório, o trabalho intelectual do advogado, pois trata-se de prestação de serviços de natureza personalíssima e singular, mostrando-se patente a inviabilidade de competição. 
O relator destacou ainda que a quantia contratada não se mostra excessiva para a remuneração de um advogado, principalmente considerando-se todos os fatores subjetivos que influenciam os valores, como a confiança, singularidade do serviço e sua natureza intelectual. 
A singularidade dos serviços prestados pelo advogado consiste em seus conhecimentos individuais, estando ligada à sua capacitação profissional, sendo, desta forma, inviável escolher o melhor profissional, para prestar serviço de natureza intelectual, por meio de licitação, pois tal mensuração não se funda em critérios objetivos (como o menor preço), complementa o ministro. Com a decisão, fica afastada a tipificação de improbidade administrativa. 

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PAINEL JURÍDICO

Competência
O ministro Ricardo Lewandowski, do STF, decidiu que cabe ao MP do Rio de Janeiro, e não ao MP Federal, a competência para apurar o acidente com a plataforma P-36 da Petrobras, ocorrido em 2001.

Consórcio
Aquele que desistir de um consórcio deve receber a devolução do valor pago em até 60 dias após o encerramento do plano. O entendimento é da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais do Distrito Federal.

Penhora I
Apartamento na praia, utilizado pelo proprietário somente durante o verão, não é bem de família e pode ser penhorado para pagamento de dívida judicial. O entendimento é da 6ª Câmara de Direito Civil do TJ de Santa Catarina.

Penhora II
Hospital privado, que presta serviços públicos de saúde, não pode ter os equipamentos penhorados para execução em dívidas trabalhistas. O entendimento é da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST.

Músico
A profissão de músico pode ser exercida sem a inscrição na Ordem dos Músicos do Brasil, pois a atividade é protegida pela garantia constitucional da liberdade de expressão. O entendimento é da 3ª Turma do TRF da 4ª Região.

IPTU
Imóveis pertencentes a instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos têm imunidade tributária quanto ao IPTU. O entendimento é do STF.

Desembargadores
Os juízes federais João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Sebastião Ogê Muniz foram empossados como desembargadores do TRF da 4ª Região.

Noiva
O vestido de noiva enquadra-se na categoria de bem durável e, portanto, conforme o Código de Defesa do Consumidor, é de 90 dias o prazo decadencial para reclamação de defeitos aparentes. O entendimento é da Terceira Turma do STJ.

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JURISPRUDÊNCIA

Não se aplica o princípio da insignificância quando o réu é reincidente em crime contra o patrimônio
Inaplicável ao caso o princípio da insignificância, porquanto o apelante é reincidente em crime contra o patrimônio, o que demonstra o desvalor e reprovabilidade de sua conduta. A reincidência é circunstância agravante que prepondera sobre as atenuantes, com exceção daquelas que resultam dos motivos determinantes do crime ou da personalidade do agente, o que não é o caso da confissão espontânea. Precedentes. A confissão espontânea é ato posterior ao cometimento do crime e não tem nenhuma relação com ele, mas, tão somente, com o interesse pessoal e a conveniência do réu durante o desenvolvimento do processo penal, motivo pelo qual não se inclui no caráter subjetivo dos motivos determinantes do crime —Apelação Criminal nº 1.032.044-0—2 ou na personalidade do agente. (STF, RHC 115994, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 02/04/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-070 DIVULG 16-04-2013 PUBLIC 17-04-2013). Consoante o § 3º, do art. 44, do Código Penal, quando a reincidência não é específica (mesmo tipo penal) e a medida é socialmente recomendável diante das peculiaridades do caso concreto, é possível substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Decisão da 3ª Câmara Criminal do TJPR. ACr. n. 1.032.044-0 (fonte TJPR)

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LIVROS DA SEMANA

Osvaldo Santos de Carvalho explora a não cumulatividade no ICMS a partir do princípio da neutralidade tributária, um dos postulados que informam os tributos sobre o consumo. Não cumulatividade do ICMS e princípio da neutralidade tributária investiga a correlação destes institutos jurídicos com os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, fundamentos informadores da ordem econômica na Constituição Federal. Ao longo da obra o autor examina exemplificativamente diversas situações de restrições à plena fruição da não cumulatividade, determinando severos reflexos sobre a neutralidade tributária e prejudicando a competitividade das empresas.
Osvaldo Santos de Carvalho — Não cumulatividade do ICMS e princípio da neutralidade tributária — Editora Saraiva, São Paulo 2013

 

 

 

 

 

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A obra Gestão Fraudulenta e Temerária: um estudo jurisprudencial visa produzir conhecimento sobre como o Tribunal Regional Federal da 3ª Região tem decidido sobre dois dos principais crimes afetos à administração das instituições financeiras: gestão fraudulenta e gestão temerária. Trata-se de delitos criticados pela doutrina em razão das falhas de definição dos tipos, desde a edição da Lei 7.492, em 1986.
Diante disso, adota-se a metodologia para se responder a dois problemas: Quais os critérios adotados pelo Tribunal para a configuração dos crimes? As decisões aproximam-se de algum paradigma de direito penal?
Gauthama Fornaciari — Gestão fraudulenta e temerária – um estudo jurisprudencial — Editora Saraiva, São Paulo 2013

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COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA
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