DIREITO E POLÍTICA
Ra Yo no creo en brujas pero que las hay las hay
* Carlos Augusto Vieira da Costa
Caro leitor, qual é sua opinião sobre a divulgação de dados sigilosos da diplomacia americana pelo sitio Wikileaks? Horrorizado, extasiado ou indiferente? Não se preocupe. Independentemente de qual seja a sua posição, esteja certo que você não estará sozinho. Afinal, desde que o mundo é mundo a civilização vem se dedicando, sem muito êxito, à elaboração de um imperativo ético que sirva de parâmetro para orientar os anseios de liberdade que impulsionam os homens na busca da realização dos seus propósitos pessoais ou coletivos. O insolúvel debate entre liberais e socialistas é um dos exemplos mais recentes desta agonia. Portanto, o fato dos Estados Unidos estarem tiririca com Julian Assenge, fundador e responsável pelo Wikileaks, é perfeitamente compreensível, até porque a privacidade e o sigilo de correspondência são valores consagrados nas sociedades ocidentais contemporâneas. Por outro lado, a liberdade de expressão e informação também representa um valor fundamental, e não foi outra senão esta a razão lançada por Assenge para justificar a divulgação das informações sigilosas trocadas no seio da diplomacia americana nas últimas décadas. Como então resolver esse impasse? Esta é a grande questão, e cada um deve tentar resolvê-la da forma que melhor lhe aprouver. Os EUA, por exemplo, já deram a saída e conseguiram convencer o Amazon, provedor do Wikikeaks, a tirar o site do ar. A par disto, a senadora republicana pelo Alaska, Sarah Palin, candidata a vice-presidente pela chapa encabeçada por John MacCain nas últimas eleições presidenciais americanas, uma espécie de Índio da Costa do norte, também deu sua palinha, e conclamou o governo americano a caçar Julian Assenge como se fosse um animal. Assenge, por sua vez, enquanto lhe é possível falar, vai dando o seu recado, que se resume a provar que o discurso americano a favor da liberdade de expressão é pura demagogia, que não se sustenta quando seus interesses são contrariados. Mas independentemente de qual dos lados tenha razão, a verdade é que iconoclastas como Julina Assenge são fundamentais para a evolução da civilização, pois nos forçam a encarar nossas contradições, sem o que ainda estaríamos presos na idade média, empalando inimigos e queimando mulheres na fogueira por acreditar que fossem bruxas. Ora, bruxas não existem, não é mesmo?
Carlos Augusto Vieira da Costa Procurador do Município de Curitiba
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Divórcio acelerado
*Roberto Victor Pereira Ribeiro
No final do ano passado, mais precisamente em 02 de dezembro de 2009, o Senado Federal analisou e aprovou projeto que preceitua que o divórcio possa ser pedido pelo casal sem haver a necessidade de anteriormente passar pela separação judicial ou separação de fato. Hodiernamente, para que o casal peça o divórcio é preciso antes que tenha transcorrido o prazo de um ano contados da decisão de separação judicial, ou dois anos de separação de fato, que é o afastamento público e notório dos cônjuges. Há quem se refira à separação como procedimento inócuo, sem qualquer utilidade, tendo apenas serventia para acrescer despesas e ônus para os cônjuges que desejam seguir suas vidas a sós. Além do mais, o procedimento de separação como hoje ocorre só traz desgaste emocional a ambos, pois o casal terá que se encontrar em fóruns, nas audiências, e poderão reavivar situações vexatórias e desagradáveis. Em alguns casos, esses encontros são dolorosos e extenuantes. Os efeitos da separação e do divórcio são praticamente os mesmos. Em ambas as ações é possível se fazer as providências de partilha de bens, guarda de filhos, pensões alimentícias etc. No entanto, apenas o divórcio concede ao casal a possibilidade de nutrir e oficializar novas uniões através de novo casamento. Sendo assim, há a clara e nítida sensação de que a separação é realmente um atraso nos desenlaces matrimoniais. Muito embora o divórcio caracterize um rompimento definitivo, este também possui caráter de reversibilidade diante da vontade das partes que poderão através de reconciliação contrair novo casamento com sua ex-esposa ou ex-marido. Na gênese do divórcio em nossa legislação pátria, este instituto sofreu muito combate contrário vindo de conservadores e da Igreja. Destarte, manteve-se a figura da separação como meio atenuante para as contrariedades do divórcio e para aplacar psicologicamente os defensores da não utilização do divórcio. A sociedade moderna precisa entender que a morosidade do judiciário faz com que medidas dessa natureza sejam encaradas como salvação para os interessados em resolver de forma célere seus litígios. Não podemos coadunar com o pensamento de que o divórcio só existe para destruir casamentos e auxiliar as pessoas a casarem muitas vezes de forma irresponsável. O divórcio existe para resolver com êxito as querelas familiares, onde não há mais condições de convivência entre os cônjuges.
* O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * ESPAÇO LIVRE
O controle de constitucionalidade e o bom combate
*Frederico Duarte
Faltando 5 dias para as eleições do 1º turno de 2010, o Partido dos Trabalhadores ingressou no STF com uma ADIn (nº 4467) questionando a constitucionalidade do artigo 49 da Lei 12.034/2009, que exigia a apresentação de dois documentos – o Título de Eleitor e um documento de identidade com foto – para o cidadão exercer o direito-dever de votar. O principal argumento da peça petista acusava o cerceamento legal ao direito político do cidadão e a violação do princípio constitucional da universalidade do sufrágio. Pelo menos dois meses antes, internautas já alertavam em diversos blogs para a inconstitucionalidade dessa norma, a despeito dela ter passado incólume pelas comissões técnicas das duas casas legislativas federais e ter recebido a sanção presidencial no final de 2009. Não bastasse isto, a questão suscitou longos e discursivos embates no STF, com especial destaque para o atual e o ex-presidente da Casa, Cesar Peluzo e Gilmar Mendes, respectivamente, – os dois únicos votos contrários à ADIn. O ministro Gilmar, de maneira surpreendente, chegou a pedir vistas ao processo, levantando a suspeita de ter agido a pedido do candidato José Serra, de quem supostamente teria recebido um telefonema minutos antes da iniciativa protelatória. Lamentavelmente, os cidadãos internautas não são parte legítima para proposição de ADIns, ou o assunto teria se resolvido bem antes. Como se sabe, somente as Mesas do Senado, da Câmara Federal e da Câmara Legislativa do DF, mais os partidos políticos com representação no Congresso Nacional, o Conselho Federal da OAB e as confederações sindicais podem propor esse tipo de ação no chamado controle concentrado, que é como se denomina o processo na corte suprema (STF). Contudo, a questão era tão absurda – cassar o direito-dever do voto a quem não portasse o Título de Eleitor – que comportava uma boa batalha jurídica no dia do pleito. Este seria o meio ao alcance do cidadão comum para fazer valer o seu direito e, de quebra, exigir o respeito à Constituição Federal. Para tanto, o cidadão disposto a um bom combate impetraria Mandado de Segurança contra o presidente de sua seção eleitoral (a autoridade coatora), tão logo fosse impedido de votar sem exibir o Título de Eleitor. O MS, definido no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal é remédio jurídico eficiente contra autoridades públicas ou seus prepostos diante da negação de um direito líquido e certo – como é o direito-dever do voto. Os dois requisitos fundamentais para a proposição dessa ação – o direito assegurado em lei e o perigo da demora – estão claramente presentes, não havendo a menor chance da recusa da liminar. Primeiro porque o direito-dever de votar é norma Constitucional, definida no art. 14, parágrafo 1º, I, da CF. E o risco da demora de uma decisão está evidenciado no fato de que o pleito se encerra às 17 horas na maior parte do território nacional, e aqueles que não votarem ou justificarem são passíveis de sanções que vão de multa a cerceamento de direitos. O rigor é tal que o infrator pode ser impedido de participar de concursos públicos, viajar para fora do país, obter empréstimos em instituições financeiras públicas etc (Código Eleitoral, art. 6º e 7º). Assim, de posse da liminar o eleitor voltaria a sua seção e exerceria a sua cidadania em plenitude. Posteriormente, no momento do juiz enfrentar o mérito da ação, o nosso cidadão inconformado estaria legitimado para sustentar a tese da inconstitucionalidade do art. 49 da Lei 12.034/2009. Para tanto, na via de exceção, invocaria o chamado controle difuso da Constituição Federal, situação em que qualquer membro do Poder Judiciário pode se manifestar sobre a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo. A diferença, em relação à uma ADIn, é que a sentença tornaria inaplicável a lei exclusivamente ao caso concreto. Mas já seria uma vitória. Com relação à inconstitucionalidade da norma em questão nem é necessário grande saber jurídico para constatá-la. A matéria não resiste sequer ao bom senso de um leigo, bastando lembrar que a Justiça Eleitoral é aquela que detém com exclusividade a comprovação do cadastramento do eleitor. Portanto, chega a ser obtuso pretender que o cidadão precise comprovar à Justiça Eleitoral aquilo que só ela e ele sabem. Ao cidadão cabe, isto sim, comprovar a sua identidade civil, para confrontá-la com o cadastro eleitoral. E isto pode ser feito, legalmente, por qualquer documento que tenha fé pública, como Cédula de Identidade, Identidade Profissional, a nova Carteira Nacional de Habilitação, o Passaporte, entre outros. Do ponto de vista da Constituição Federal, o art. 49 da Lei 12.034/2009 fere princípios fundamentais. Vamos a alguns deles, começando pelo art. 1º, II, capítulo dos Princípios Fundamentais. Ali está expresso que a República brasileira se fundamenta na (…) Cidadania, ou seja, na garantia do exercício pleno dos direitos políticos de cada homem e cada mulher, a começar pelo sufrágio universal, sem cerceamentos. Outro fundamento da República Federativa do Brasil agredido pela Lei 12.034/2009 é a dignidade da pessoa humana, mencionada no mesmo antigo anterior, item III. É evidente o desrespeito à dignidade daquele a quem o Estado nega, ainda que por meio de subterfúgios, o direito ao voto. Para não nos alongarmos demasiadamente podemos citar ainda a agressão à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário. Essa adesão, formalizada pelo Decreto 678, de 06/10/1992, deu à convenção internacional força de norma constitucional brasileira. E lá está expresso, no art. 23, 3 (Direitos Políticos), que todos os cidadãos devem gozar dos seguintes direitos e oportunidades: (…) votar e ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a livre expressão da vontade dos eleitores. Por tudo isso, derrubar a obrigatoriedade do porte de dois documentos para o eleitor exercer seu direito de voto foi o que se pode chamar de bom combate. Expôs legisladores que formulam leis em flagrante choque com a nossa Carta Magna e preservou o exercício da cidadania.
* O autor é acadêmico de Direito do Unicuritiba.
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PAINEL JURÍDICO Palestra Para encerrar o Ciclo de Palestras 2010, os escritórios G. A. Hauer Advogados e Esmanhotto Advogados Associados recebem amanhã, 07 de dezembro, o conselheiro e ex-presidente do Tribunal de Contas do Paraná Heinz Herwig, que irá falar sobre as funções fiscalizadoras dos gastos de governo do Tribunal de Contas do Paraná. O evento acontece no auditório das empresas e é restrito aos profissionais dos escritórios.
Controle Para o STF, as investigações feitas pela Controladoria Geral da União nos municípios deve se limitar às verbas federais repassadas a eles pela União por meio de convênios, não alcançando os recursos de outras origens.
Impenhorável Mesmo que o imóvel familiar seja luxuoso ou de alto padrão, ele não pode sofrer penhora para pagamento de dívida. O entendimento é da 3ª Turma do STJ.
Leão Por 6 votos a 4, o STF decidiu que a Receita Federal pode, sem prévia autorização judicial, ter acesso ao sigilo bancário de contribuintes investigados.
Conversão É possível a celebração de contrato em moeda estrangeira, mas o pagamento deve ser feito em moeda nacional. O entendimento é da 4ª Turma do STJ.
Insalubre A 7ª Turma do TST concedeu a um servidor celetista de presídio adicional por periculosidade.
Salubre Funcionária de creche que mantém contato direto com crianças, dando banho e lavando fraldas, não tem direito ao adicional de insalubridade. O entendimento é da Seção I Especializada em Dissídios Individuais do TST.
Terceirização A inadimplência de empresa terceirizada contratada pelo Poder Público em relação a encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem pode onerar o objeto do contrato. O entendimento é STF.
Pela ordem Os juízes podem ser obrigados a dar sentenças com base na ordem cronológica de processos prontos. É o que prevê o substitutivo ao projeto do novo CPC que terá ainda que passar pela comissão especial de senadores encarregada do exame da matéria antes da ir para a votação em Plenário
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DIREITO SUMULAR Súmula nº 426 do STJ – Os juros de mora na indenização do seguro DPVAT fluem a partir da citação.
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LIVROS DA SEMANA
As exigências peculiares do Exame de Ordem tornam premente um estudo direcionado, especialmente em sua segunda fase. Para atender a essa necessidade, vem a lume esta obra, que apresenta a metodologia adequada para todos os que se preparam para ingressar nos quadros da OAB. A primeira parte destina-se à análise das regras do processo de conhecimento, processo de execução e procedimentos especiais, bem como modelos de peças processuais. Na segunda parte, são apresentados casos práticos extraídos de exames já realizados. Caio Piva — Coleção Exame da OAB — Segunda Fase — Editora Saraiva, São Paulo 2010
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Comprometida em oferecer ao estudante de Direito uma reflexão sobre o sistema jurídico, sua realidade e suas transformações, e, mais, em auxiliar esse estudante a melhor compreender as funções das profissões jurídicas, a nova edição desta obra vem aprofundar o estudo de temas fundamentais para o Direito. Após discorrer sobre as diversas escolas jurídicas, examina, dentre os temas mais importantes: eficácia do Direito; papel das normas; consenso social; poder; Estado e controle social; problemas e métodos de pesquisa; estratificação social; sociologia da aplicação do Direito e suas definições sociológicas. Ao final de cada capítulo, a seção Para ir mais longe, indica os textos mais importantes para o aprofundamento em temas específicos. Ana Lucia Sabadell — Manual de Sociologia Jurídica — Editora RT, Revista dos Tribunais, São Paulo 2011
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O Estado sobre o morro
*Jônatas Pirkiel Tanta coisa já se falou sobre o combate ao narcotráfico nas favelas do Rio de Janeiro, que hoje chega-se à conclusão de que o que faltava era só fazer… O que parecia difícil, impossível, era efetivamente só fazer. Entendendo-se que a caminhada começa com o primeiro passo. É só dar o primeiro passo! O Estado, desta vez, subiu verdadeiramente ao morro, de forma a enfrentar o crime organizado, que não verdade, como se viu, nunca foi, não é e nem será ta organizado, a ponto de ver-se, como se vinha vendo, o Estado tão retraído naquilo que é uma de suas funções institucionais: garantir à sociedade paz e tranquilidade, sem que o povo fique sujeito ao medo e à opressão de grupos de marginais que agem sob a inoperância do Estado. Mesmo diante do espetáculo à parte que se pode observar, policiais de caras pintadas e as casas dos chefes do tráfico, o que se viu é a imagem de uma situação que sempre pode ser enfrentada pelo Estado, porém sem que Ele quisesse até agora. A ação policial do Estado, que deve vir acompanhada da Ação Social do Estado, deve trazer ao Rio de Janeiro a tranquilidade que a população sempre desejou. Ação que poderia servir de exemplo a outros Estados, cuja organização ainda é bem menor que a que se observa no Rio. Cabe destacar que toda ação policial, acompanhada em tempo real através da televisão, foi realizada sem que se notasse qualquer agressão aos direitos dos cidadãos, cujo papel do Poder Judiciário, neste caso, não é diferente de outras situações onde se observa o regular processo legal. A ação policial, que promove as prisões de pessoas em flagrante delito (a posse de armas ou drogas), seguida do amplo direito à defesa. Para não perder a sua parte na ação, o Presidente do Supremo Tribunal Federal e conjuntamente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Cezar Peluso, afirmou que o Judiciário está fazendo a sua parte na busca de soluções para os conflitos observados no Rio de Janeiro. Afirmação que não se fez acompanhar de qualquer exemplo concreto de como o Judiciário poderia, até agora, estar fazendo a sua parte… Talvez venha a fazê-la, quando estes processos todos, em razão das prisões venham a ser submetidos à apreciação efetivamente do Judiciário!
* Jônatas Pirkiel ([email protected]). * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA [email protected]
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