DIREITO E POLÍTICA
Consciência e Caráter Carlos Augusto Vieira da Costa
Certa vez, há muito tempo, o jogador Sócrates, em uma de suas polêmicas entrevistas, afirmou que não tinha compromisso com a coerência. A assertiva teve o impacto de um soco no estômago. Na época, parte da minha geração acadêmica estava envolvida pelas teorias do professor e filósofo argentino Luis Alberto Warat e sua abordagem psicanalítica do Direito. Para Warat, tão importante quanto o discurso era a prática, e o seu lema era fazer o discurso passar pelo corpo. Como poderia então o Doutor (logo ele!) banalizar um imperativo ético tão essencial para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária? Os anos passaram e experiência foi mostrando que talvez o Doutor Socrates não tenha pretendido desfazer da ética, mas sim humanizá-la. Afinal, a coerência não faz parte das categorias da natureza, e torná-la um critério absoluto de validade representaria a negação do próprio ser. Essa constatação, aliás, fica muito evidente quando observamos a ação dos homens no tablado da política, onde não há quem escape incólume. De Getúlio a Lula, passando por Juscelino e Fernando Henrique, estão todos marcados pelas contradições. Getúlio foi o precursor dos direitos sociais em nosso país, mas também foi o ditador que criou a polícia política. Já Juscelino fez Brasília, mas em contrapartida endividou o Brasil e nos fez refém da mais cara matriz de transporte do mundo, o rodoviário. FHC, de príncipe da sociologia, autor de teorias sobre a odiosa dependência econômica da América Latina, comprou sua reeleição e aviltou parte do patrimônio estatal privatizando-o a preço de banana. E Lula, então, nem se diga. Até hoje é acusado de corrupto por conta do mensalão, que nada mais é do que a variação barata da prática institucionalizada entre nós de comprar apoio político com troca de favores, cargos ou dinheiro de emendas parlamentares. Por isso, temos que começar a exorcizar o moralismo como argumento de crítica política e social, pois ele mais esconde do que revela, mais confirma do que nega. No Brasil, vivemos uma situação de corrupção generalizada, mas infelizmente, como na passagem bíblica, não há quem possa atirar a primeira pedra de consciência limpa. Da sonegação do IR ao ilícito de trânsito, do patrimonialismo à fraude no troco, todos devem algo. Portanto, a única saída, como disse Lula e confirmou o Papa Francisco, ainda que por linhas tortas, é a participação política. Mas não porque com isto as pessoas se livrem das suas contradições, e sim porque ao menos terão consciência delas, o que já é meio caminho andado. A outra metade depende do caráter.
Carlos Augusto Vieira da Costa – Presidente da Associação dos Procuradores do Município de Curitiba
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SABER DIREITO
Usucapião por abandono de lar
*Roberto Victor Pereira Ribeiro
Desde meados de 2011 está vigente no Brasil uma nova modalidade de usucapião. Em rápidas pinceladas, usucapião é um instituto jurídico definido como a aquisição de uma propriedade ou de outros direitos reais diante da posse prolongada e qualificada por requisisitos expressos em lei. Trata-se de uma maneira de prescrição aquisitiva, ou seja, o tempo trabalha a favor do usucapiente. Por ocasião da publicação da Lei 12.424 acrescentando ao Código Civil brasileiro o art. 1.240-A, surgiu esta nova modalidade de usucapião. Sua natureza jurídica é fixada como usucapião especial urbana e, alguns juristas, a chamam de usucapião por abandono de lar. O artigo 1.240-A tem redação clara e compreensiva: “Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”. Isto é, se você reside em um imóvel dividindo-o com seu cônjuge (virago ou varão) e o mesmo abandona o lar, a fração que correspondia a ele, será por você usucapida no prazo de 2 anos ininterruptos e sem a oposição daquele. Trata-se, portanto, de posse mansa e pacífica, sem embargos de quaisquer naturezas. Deste modo, se houve abandono do lar, o que lá permanece torna-se proprietário exclusivo. Válido será também lembrar que o usucapiente deverá provar todos os requisitos objetivos propostos pela lei e que ao usucapir o imóvel se tornará responsável por todos os tributos e dívidas referentes à unidade imobiliária. Alguns juristas criticam o novel dispositivo civil, dentre eles a ex-Desembargadora do Rio Grande do Sul e especialista em Direito de Família, Maria Berenice Dias: “A criação de nova modalidade de usucapião entre cônjuges ou companheiros representa severo entrave para a composição dos conflitos familiares. Isto porque, quando um ocupar, pelo prazo de dois anos, bem comum sem oposição do que abandonou o lar, pode se tornar seu titular exclusivo. Quem lida com as questões emergentes do fim dos vínculos afetivos sabe que, havendo disputa sobre o imóvel residencial, a solução é um afastar-se, lá permanecendo o outro, geralmente aquele que fica com os filhos em sua companhia. Essa, muitas vezes, é única saída até porque, vender o bem e repartir o dinheiro nem sempre permite a aquisição de dois imóveis.”. O que saiu, às vezes por medida salutar para o caso, diante desta modificação poderá sair bem prejudicado. As críticas ecoam após essa alteração, mas o importante é que a mudança está vigente e sua eficácia é plena, desde que alcançados os requisitos legais exigidos. Portanto, se você encontra-se em situação parecida, busque o auxílio de um advogado.
*O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito
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A CONDUTA E O DIREITO PENAL
O Brasil é o quarto país do mundo
Jônatas Pirkiel
O sistema carcerário nacional é o instrumento da Lei de Execução Penal que, em tese, para o cumprimento da pena e a promoção da reintegração social do condenado ao convívio social. Infelizmente, não tem possibilitado a ressocialização dos apenados e se apresenta como locais de depósito de pessoas, em condições indignas e desumanas. O Brasil é o 4º. país do mundo em população carcerária, onde se estima estarem segregados quase 600 mil pessoas, sendo que a maioria delas é de negros e de internos entre 18 a 24 anos. Estão na frente do Brasil, os Estados Unidos, com aproximadamente 2,5 milhões, a China com 1,8 milhões e a Rússia com cerca de 800 mil presos. O sistema judiciário brasileiro tem-se demonstrado uma máquina de fazer presos, sem que com isto se observe a diminuição da criminalidade e da reincidência dos condenados. O quadro se agrava quando se observa que o sistema crime mais vagas nas penitenciárias do que em hospitais e escolas, mesmo diante da falta de vagas no sistema que obrigam que presos fiquem ocupando os Distritos Policiais de todo o país, contribuindo para que os policiais civis e militares desviem as suas funções institucionais, cuidando de presos em delegacias ou os militares das penitenciárias, sem que o número de agentes penitenciários seja adequado à necessidade das instituições penais. Outro detalhe curioso é que apenas nove crimes são responsáveis por 94% das condenações (tráfico de drogas – 125 mil, e crimes patrimoniais: furto, roubo e estelionato – 240 mil). Diante desta calamidade, nota-se que a Lei de Execução Penal não vem sendo cumprida, em particular no que determina que o presídio tem a função de proporcionar condições harmônicas para a integração social do condenado, e que é assegurado ao detento no mínimo seis metros quadrados de espaço na cela, hoje, na maioria das vezes, tem de 70 centímetros a 1 metro. O Brasil está entre os 20 países onde mais se mata no mundo, e a população cada vez mais vive em pânico, e se equivoca quando acham que as leis penais mais rigorosas ou a diminuição da maioridade penal podem diminuir a criminalidade. Este é um dos graves problemas da nossa sociedade e que não foram objeto dos gritos ouvidos na rua e que, também, não foram ouvidos pelos governantes.
* O autor é advogado criminalista (Jô[email protected])
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DESTAQUE
Cabem honorários sucumbenciais em processo trabalhista Honorários sucumbenciais devem ser pagos pela parte vencida em ações trabalhistas mesmo que a parte vencedora seja assistida por um advogado particular e não manifeste o interesse nesse sentido. Não há restrição legal para que se deixe de adotar na esfera trabalhista o critério que vigora para dívidas civis. O entendimento é do juiz da 4ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora (MG), Léverson Bastos Dutra, que determinou que duas companhias mineradoras pagassem honorários sucumbenciais ao advogado da parte vencedora em processo que condenou as empresas a arcar com uma série de verbas trabalhistas e danos morais. O magistrado entendeu que cabe o pagamento de honorários sucumbenciais mesmo que a parte não se manifeste nesse sentido. “Considero aplicáveis ao processo do trabalho as normas dos arts. 389 e 404 do Código Civil, pois estabeleceu-se a necessidade do ressarcimento dos honorários advocatícios, em forma de perdas e danos nas obrigações de pagamento em dinheiro, reformulando a regra geral de sua inaplicabilidade em sede de reclamação trabalhista”, afirmou. O juiz citou jurisprudência calcada em interpretações do artigo 389 do Código Civil, que dispõe que os honorários advocatícios não mais decorrem da mera sucumbência, mas também do inadimplemento da obrigação. “Ora, se a regra geral é de cabimento da verba em outros casos de hipossuficiência (consumidores, pequenos prestadores de serviços, segurados do INSS etc.) e ainda em ações trabalhistas que não contemplem a relação de emprego, não teria sentido que apenas em reclamações envolvendo empregados esse novel entendimento fosse olvidado, o que contraria a letra da Instrução Normativa 27/TST” O magistrado criticou ainda as Súmulas 219 e 329 do TST, que estabelecem o compromisso de pagar verba honorária apenas quando a parte estiver associada e representada pelo sindicato de sua categoria e for beneficiária ainda da prestação jurisdicional gratuita. O juiz opõe ao teor de ambas as súmulas os artigos 14 e 16 da Lei nº. 5.584/70 e o art. 791 da CLT, que não impedem a condenação ao pagamento de honorários quando o reclamante estiver assistido por advogado particular. “Qualquer ilação em contrário não encontra respaldo na lei”, ponderou. Para o juiz a edição das Súmulas do TST tomaram como base dois artigos da Lei nº. 5.584, de 1970, que disciplina a concessão e prestação de assistência judiciária na Justiça do Trabalho. A matéria passou a ser regulada pelo art. 1º. da Lei nº. 10.288, de 2001, que alterou a CLT no que toca à assistência judiciária. “Este [o art. 789 da CLT], por seu turno, foi revogado pela Lei nº. 10.537, de 27.08.2002, cujo art. 1º. introduziu nova redação no art. 790 da CLT, mencionando que o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou declararem, sob as penas da lei, que não estão em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, será cognoscível e praticado pelo juiz, sem qualquer condicionamento à presença do sindicato obreiro. Logo, não mais vigora o art. 14 da Lei nº. 5.584/70, descabendo falar-se em honorários assistenciais sindicais”, esclarece o juiz Léverson Bastos Dutra ao justificar sua tese.
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PAINEL JURÍDICO
Estágio A Defensoria Pública da União recebe inscrições para o concurso que visa à seleção de estudantes para o estágio remunerado em Direito até a próxima amanhã, dia 30. São 14 vagas de preenchimento imediato, mais formação de cadastro reserva. Informações pelo fone (41) 3320-6400, de 09h00 a 18h00.
Remédio I O acesso ao SUS é universal, por isso, o sistema deve fornecer medicamentos contra o câncer a todos os brasileiros, incluindo aqueles que possuem planos de saúde. Esse é o entendimento do juiz federal substituto Eduardo Pereira da Silva, da 1ª Vara da Seção Judiciária de Goiás.
Remédio II Paciente que trata câncer em hospital privado não tem direito de receber o medicamento do SUS. O entendimento é da 4ª Turma do TRF da 4ª Região.
No México O advogado curitibano Gustavo Swain Kfouri vai proferir o módulo inaugural do “Curso Internacional de Actualización en Derecho Parlamentario”, realizado na Universidade Nacional Autônoma do México – UNAM. Kfouri é mestre em Direito Constitucional, advogado sócio do escritório Kfouri, Gorski & Farah Sociedade de Advogados.
Workshop Entre os dias 5 e 8 de agosto as tardes da OAB/PR oferecem palestras de consultores especializados sobre gestão financeira e de pessoas, produção e tecnologia e marketing jurídico. O custo é de R$ 150,00.
Cartórios Estão abertas, até o dia 10 de agosto, as inscrições para o Prêmio de Qualidade Total Anoreg-BR- PQTA 2013, que visa atestar a qualidade e produtividade dos cartórios.Todos os cartórios do país, de todas as especialidades, podem se inscrever através do site www.anoreg.org.br/pqta
Revisão A Editora Saraiva, em parceria com os professores das Videoaulas Preparatório OAB Nacional Editora Saraiva, realiza no dia 10 de agosto o Dia Saraiva Prepara OAB, em que a equipe de professores revisará todas as disciplinas abordadas no Exame no do endereço www.itv.netpoint.com.br/oabsaraiva.
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DIREITO SUMULAR Súmula n. 493 do STJ – É inadmissível a fixação de pena substitutiva (art. 44 do CP) como condição especial ao regime aberto.
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LIVROS DA SEMANA
O advogado e sócio do escritório Marins Bertoldi Advogados Associados, Marcelo Bertoldi, lançou, junto com Márcia Carla Pereira Ribeiro, a 7ª edição do seu livro intitulado Curso Avançado de Direito Comercial, publicado pela editora Revista dos Tribunais. A obra é indicada para todos os segmentos da profissão jurídica, tanto como manual, leitura básica ou ponto de partida, por proporcionar uma visão ampla sobre temas específicos. A principal atualização desse número diz respeito à EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada), novidade no Direito Contratual, comenta Bertoldi. O livro traz, em um só volume, toda a matéria de Direito Comercial ministrada nas instituições de ensino jurídico, a partir dos programas oficiais e já está disponível nas livrarias especializadas de todo o país. Marcelo Marco Bertoldi — Marcia Carla Pereira Ribeiro — Curso Avançado de Direito Comercial — Editora: Revista dos Tribunais, São Paulo 2013
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Com ênfase no direito à diferença e no exercício pleno da cidadania, este livro realiza uma análise minuciosa da proteção jurídica à pessoa homossexual, considerada individualmente, e também das uniões afetivas entre pessoas do mesmo sexo, à luz do direito brasileiro e do direito internacional. Carolina Valença Ferraz — Glauco Salomão Leite —George Salomão Leite — Glauber Salomão Leite — Editora Saraiva, São Paulo 2013
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COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA [email protected]
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