DIREITO E POLÍTICA

Um dia a conta chega!

*Carlos Augusto Vieira da Costa

Caro leitor, você sabe o que é um impostômetro? Trata-se de uma espécie de relógio digital que marca por estimativa o valor arrecadado pelo Estado com a cobrança de tributos. Os seus números mudam freneticamente, a cada segundo. O objetivo da engenhoca, todavia, longe de esclarecer, se presta muito mais para criar a representação de uma realidade de abastança e volúpia do Estado às custas do suor do contribuinte. Mas será que de fato o Estado brasileiro arrecada em demasia? Não há como responder honestamente com exatidão. Os inventores do impostômetro costumam argumentar que a carga tributária brasileira, atualmente na ordem de 35% do PIB, é alta, a ponto de atrapalhar o desenvolvimento. Alegam também que o Estado gasta mal, e não retribui em serviços o valor cobrado. Ora. É evidente que o empresariado, como classe fundamental na cadeia produtiva, tem o direito de apresentar suas queixas, da mesma foram que as centrais sindicais também podem reclamar melhores salários, e assim por diante. O problema é que em ambos os casos os discursos estão contaminados de pressupostos ideológicos, o que dificulta o entendimento necessário à solução do problema.
Exemplo. Justificar que a carga tributária brasileira é elevada porque é maior que a americana (24%), ou que a japonesa (25%) é puro sofisma, pois parte da premissa de que o Brasil está no mesmo estágio de desenvolvimento desses países, com igual acumulo de recursos, o que logicamente implicaria uma menor participação proporcional no financiamento do Estado. Mal comparando, seria o mesmo que um sindicato brasileiro reclamar aumento de salário com base no rendimento do trabalhador americano ou japonês. Outro equívoco é alegar que o Estado não retribui a contento o valor tomado da sociedade. Luz, água, pavimentação, sinalização, arborização, engenharia de tráfego, defesa social, enfim, tudo que compõe a infra-estrutura urbana e faz parte da vida do cidadão deste o momento que acorda até quando vai dormir foi financiada e é mantida pelo Estado. E se você acha que a iniciativa privada faria melhor, então compare o valor da sua fatura de luz com o da conta do seu celular para perceber a diferença. Vale também comparar a taxa de juros da casa própria com a do cheque especial.
Portanto, se a carga tributária brasileira é elevada (em 1995 foi de 37%), em grande parte deve-se às relações de dominação que vigoraram ao longo da nossa história. A escola pública, por exemplo, já foi de excelência, mas foi sucateada a partir da universalização do direito à educação, quando então a classe dominante decidiu transferir seus filhos para a escola privada, a fim de lhes propiciar uma educação diferenciada que pudesse manter a estratificação social. O problema é que a conta um dia chega, como está acontecendo também com a segurança. Assim, antes de gastar em artifícios contra a carga tributária, melhor seria investir numa reflexão mais detida sobre suas implicações, pois uma coisa é certa: um dia a conta chega.

* Carlos Augusto Vieira da Costa
Procurador do Município de Curitiba

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SABER DIREITO

Destino, dinheiro e direitos

*Roberto Victor Pereira Ribeiro

O relato que farei agora é um desses famigerados casos de ciladas do destino, situações que chegam a verdadeiras pérolas da ironia. Stieg Larsson era um jornalista sueco de reputação mediana e que vivia sonhando com uma vida melhor em termos financeiros. Para aplacar um pouco as amarguras de não ter nascido abastado, Larsson se dedicava, nas horas vagas de labor, a escrever romances policiais.
Estava encerrando os originais de uma trilogia denominada Millenium quando, subindo os degraus de uma escada no edifício do jornal que trabalhava, aos 50 anos de idade, teve um infarto fulminante que lhe ceifou a vida. Após sua morte, uma editora se interessou em publicar a supracitada coleção de obras e até os dias hodiernos já atingiu a marca de US$ 30 milhões arrecadados com as vendas de exemplares. O pobre Stieg não teve o direito de usufruir ou celebrar sua fama e sua conta bancária. Iniciou-se, então, uma batalha judicial para saber quem ficaria com a herança do jornalista best-seller. Três entraram com ação na justiça sueca para pleitear seus direitos: a companheira de Stieg, seu genitor e seu irmão. Logo de início, a prima facie, devemos dizer que a companheira não possui direito algum assistido pela legislação sueca. Para a mesma obter sucesso em seu pleito deve se enquadrar em duas situações alternativas: ser casada civilmente ou ser mencionada em testamento. Eva Gabrielsson, não preenche nenhuma das duas situações.Indignada, mesmo assim, a arquiteta ingressou em juízo. Em plagas brasileiras, a Constituição de 1988 acoberta com seu manto soberano os direitos de companheiros. No Brasil o companheiro (a) faz jus ao direito de herdar parte do que foi adquirido durante a constância da união. Se o casal teve filhos, o companheiro(a) supérstite possuirá direito a uma parte igual a que cabe a prole. Se os filhos forem apenas do de cujus, a companheira fica com a metade do que caberá a cada um dos filhos. Não existindo descendência, a companheira dividirá a herança com os demais herdeiros, tendo direito à terça parte. O irmão só herda se não houver nenhum outro herdeiro da linha reta ascendente ou descendente. Entretanto, se Eva morasse no Brasil e este caso fosse regido por nossas leis, seria necessário a mesma entrar com ação declaratória de união estável, requerendo, assim, que a união seja reconhecida a fim de garantir seus direitos sucessórios. Pois bem, os cidadãos brasileiros em situação de união estável possuem reconhecimento, fato que não ocorre em outros países, até mesmo se um desses é a Suécia tão evoluída culturalmente.

* O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito


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A CONDUTA E O DIREITO PENAL

STJ nega Habeas Corpus atorcedores

* Jônatas Pirkiel

Cinco diretores da torcida organizada do Atlético Mineiro, acusados pela morte do torcedor do Cruzeiro, fato ocorrido a cerca de um ano, vão continuar presos, diante da negativa de concessão de HC impetrado em favor dos mesmos, sob os argumentos de: …nulidade da ação penal pela ausência de citação dos acusados do aditamento (suplemento) da denúncia…cerceamento de defesa no julgamento do recurso apresentado pelo MP ao TJMG, porque o intervalo entre a inclusão em pauta e a sessão de julgamento foi inferior a 48 horas…a denúncia está fundada em inquérito policial inconclusivo…nem todos os agressores foram identificados…a gravação dos crimes pelas câmeras de segurança do estádio não são claras e foram divulgadas irregularmente para a imprensa…os advogados dos indiciados não tiveram acesso às investigações…que as testemunhas não ratificaram seus depoimentos, que não houve premeditação ou dolo e que a identificação dos envolvidos era imprescindível..além, de que os acusados se apresentaram espontaneamente, e, por fim, a ausência dos pressupostos e motivos autorizadores da prisão cautelar….
Talvez todos estes fatos fossem suficientes para que o Habeas corpus fosse concedido e os acusados respondessem o processo em liberdade, até porque estão a quase um ano presos, sem decisão de pronúncia. Porém, infelizmente, segundo a Ministra Laurita Vaz, foi deixado de juntar ao pedido a cópia do Acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que determinou a prisão cautelar, prejudicando a concessão de liminar. Conforme entendimento da ministra, é necessária, para a concessão da liminar, a demonstração concomitante e satisfatória da plausibilidade do direito arguido e do perigo na demora, o que não há no caso: …O deslinde da controvérsia é de evidente complexidade, demanda o aprofundamento do exame do próprio mérito da impetração, tarefa insuscetível de ser realizada em juízo singular e prelibatório, concluiu. O mérito do habeas corpus ainda será analisado pela Quinta Turma.

* O autor é advogado na área criminal ([email protected])


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ESPAÇO LIVRE

Quanto vale o seu dano moral?

* Thaíse Formigari Fontana

A discussão sobre a fixação dos danos morais acalora o mundo jurídico, contudo, ao que tudo indica este assunto está prestes a sofrer grandes alterações. Tramita atualmente no Congresso Nacional o Projeto de Lei 523/11, de autoria do deputado Walter Tosta (PMN-MG), que define e fixa o dano moral conforme sua natureza.
Para o autor do projeto, dano moral é todo aquele em que haja irreparável mácula à honra subjetiva de pessoa natural ou jurídica. Segundo o PJ 523/11, a indenização deve ser fixada entre 10 e 500 salários mínimos (R$ 5.540 a 272.500, atualmente) sempre levando em conta o potencial econômico da vítima e o do autor do dano. Nesta busca de especificar, e, em certo grau, de medir o dano moral, o deputado classifica quais são condutas ofensivas: cobrança indevida de valores; contratação em relação de consumo, sem a anuência formal expressa do consumidor; realização de revista em consumidor; venda de passagem para veículo de transporte coletivo cujas vagas estejam esgotadas; fornecimento de produto fora das especificações técnicas ou adequadas às condições de consumo; cobrança, por qualquer meio, em local de trabalho; erro médico que cause dano à vida ou à saúde do paciente; exposição da vida ou da saúde de outrem a risco; exposição de dados pessoais, sem a anuência formal da pessoa exposta; exposição vexatória ou não consentida da imagem pessoal; qualquer ato ilícito, ainda que não gere dano específico, entre outros.
Ainda que não estejam expressamente descritas todas as situações que o projeto prevê, é possível termos uma ideia de qual a intenção da medida. Há muito permeia uma acirrada discussão sobre a legalidade da fixação do dano moral, baseando-se na premissa do não enriquecimento ilícito. E, pelo visto muito se discutirá até chegarmos a um consenso. A grande falha deste e de tantos outros projetos de lei ou mesmo de alguns entendimentos jurisprudencial está em definir e classificar o enriquecimento ilícito, ou o enriquecimento sem causa. Para tanto é necessário entendemos do que se tratam: enriquecimento ilícito é um aumento de patrimônio de alguém, pelo empobrecimento injusto de outrem. Ao passo que enriquecimento sem causa é o proveito que, embora não necessariamente ilegal, configura o abuso de direito, ensejando uma reparação. (Dicionário jurídico brasileiro. 9ª ed., ver., atual e ampl. – São Paulo : Editora Jurídica Brasileira, 1998).
Com base neste conceito é que grande parte dos doutrinadores e aplicadores do direito, e aqui englobamos também o projeto de lei 523/11 equivocadamente tenta fixar o volúvel.
Para tanto se utilizam basicamente de dois parâmetros. Primeiro do não enriquecimento ilícito, contudo uma porção a mais de cautela deve ser tomar ao falar no tema. Este instituto na verdade não existe, ou melhor, é ilegal. Ora, não há nenhum parâmetro de justiça em dar menos ao que tem menos, ainda que tenha causado um enorme dano a sua vida ou de seu familiar apenas por seus rendimentos serem parcos, ou pior, majorar uma indenização, de um pequeno dano por ser o indenizado portador de bons rendimentos. (sem se esquecer ainda da condição patrimonial do causador do dano). Sendo assim, aqui está a gênese dos problemas.
E em segundo lugar, contudo não menos importante está na dificuldade de se fixar algo tão subjetivo. O que seria dano moral? Conforme já elucidado, seria o dissabor vivido por uma ofensa, dano, ou melhor dizendo nas palavras de Yussef Said Cahali: é a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.).
Por óbvio, não podemos afirmar que o dano gerado a um sujeito por ter sido revistado em um shopping seja o mesmo que para outro, uma vez que esta abordagem pode ter sido feita inúmeras maneiras diferentes e ainda, existem n dissabores que cada um pode já ter vivido, o que agrava ou minimiza a situação. Enfim, qualquer forma de igualar seria uma atrocidade e um desrespeito a individualidade, em um caminho sem volta para a mecanização dos processos e a igualdade forjada e irreal no judiciário brasileiro. Portanto, vale ressaltar que o que se busca não é indenizações incabíveis e descompensadas, nem tão pouco criar/alimentar uma fábrica de danos morais, mas sim chamar atenção ao temeroso risco que será criar uma lei que vise limitar tal proteção que foi conquistada com muito trabalho. Quanto vale ou meu, o seu, o nosso dano moral? Fica a dúvida!

* A autora é advogada e integrante do corpo jurídico da Popp & Nalin Sociedade de Advogados.

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JURISPRUDÊNCIA

DETRAN não pode exigir pagamento de multas para transferir veículo quando ainda cabível defesa prévia

Ausente as condições do art. 47 do CPC, quais sejam: … quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo, não há que se falar em litisconsórcio passivo necessário. Tendo em vista que cabe ao Detran PR, como órgão executivo municipal de trânsito, fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito e que referido órgão foi o responsável pelo ato impugnado (negativa ao pedido de transferência de veículo), este possui legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda. É ilegal a exigência de pagamento de multas para que se efetive a transferência do veículo quando ainda cabível defesa prévia, e na pendência de recursos ainda não julgados. Uma vez que o apelante deu causa ao retardamento da necessária formalidade para transferência de veículo ao deixar de cumprir o determinado em liminar judicial, não há que se falar em cobrança de multa do artigo 233 do CTB, pelo transcurso do prazo de 30 dias..
Decisão da 4ª Câmara Cível do TJ/PR. AC. n. 0722719-2 (fonte TJ/PR).

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PAINEL JURÍDICO

Curso
Acontece hoje, 21/11, o curso Recurso Especial e Recurso Extraordinário no âmbito criminal, com o professor e advogado Francisco Monteiro da Rocha Jr. O curso, que será realizado na Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), tem início às 19h e término às 22h30. Rocha Jr. irá falar sobre essas peças processuais restritas aos Tribunais Superiores. As inscrições podem ser feitas no site www.utp.br/extensão e são exclusivas dos alunos de Direito da instituição.
 
Agenda 21
Agenda 21 para Escritório de Advocacia será tema de debate num dos painéis especiais da XXI Conferência Nacional dos Advogados. O painel será realizado no dia 21 de novembro, das 14h30 às 18h30, na Sala 3, Asa 3, do ExpoUnimed, com a participação de três palestrantes: Fabiane Lopes Bueno Netto Bessa, João Luiz Batelli, e Leda Ramos May, professora da PUC-PR, que falará sobre o tema central do painel, Agenda 21 na Advocacia, apresentando propostas para disseminação de práticas de sustentabilidade no ambiente dos escritórios de advocacia.

Encontro
A Escola da Magistratura do Paraná (EMAP) realiza entre os dias 22 a 24 de novembro o I Encontro Internacional de Direito do Consumidor. O evento irá reunir especialistas nacionais e internacionais, além de representantes dos Procons estaduais e entidades civis de defesa do consumidor.  As palestras serão abertas para assessores do TJ do Paraná, funcionários do Procon, advogados, estudantes de Direito e juízes.Informações: www.emap.com.br ou (41) 3254-6500

Preservação
O TRF da 4ª Região considerou ilegal a cobrança de Imposto Territorial Rural sobre Área de Preservação Permanente e de utilização limitada pertencente uma empresa paranaense. Para o relator do processo, desembargador federal Álvaro Eduardo Junqueira a isenção quanto ao ITR independe de averbação da área de reserva legal no Registro de Imóveis.

Capacitação
A ESA – Escola Superior de Advocacia promove nos dias 28 e 30 de novembro e 05 e 07 de dezembro, das 9h00 às 12h00, o curso de Capacitação em processo Eletrônico, com objetivo de capacitar o advogado para a utilização de ferramentas tecnológicas que vêm sendo implementados pelo Poder Judiciário. São 12 horas aula e o custo é de R$100,00. Informações no site www.oabpr.com.br/esa/

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DIREITO SUMULAR
Súmula n. 705 do STF – A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento  da apelação por este interposta.

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LIVROS DA SEMANA

 

 

“O sistema prisional agoniza, enquanto a sociedade, de uma forma geral, não se importa com isso, pois crê que aqueles que ali se encontram recolhidos merecem esse sofrimento. Esquece-se, contudo, que aquelas pessoas, que estão sendo tratadas como seres irracionais, sairão um dia da prisão e voltarão ao convívio em sociedade. Assim, cabe a nós decidir se voltarão melhores ou piores. Espero, sinceramente, que, após a leitura desse trabalho, fruto de intensa pesquisa, conjugada com a minha experiência na área criminal, o leitor possa refletir melhor sobre o sistema prisional”

Rogerio Greco — Direitos Humanos, Sistema Prisional E Alternativas À Privação De Liberdade — Editora Saraiva, São Paulo 2011

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COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA
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