O cálculo da base para a cobrança do Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) deve ser o valor venal do imóvel, ficando vedada a estipulação, por parte do Estado, de qualquer quantia utilizada como referência sem a participação do sujeito passivo — no caso, o proprietário.

Com essa fundamentação, o juiz Jerry Adriane Teixeira, do 2º Juizado Especial da Fazenda Pública do Distrito Federal, condenou o governo do DF a ressarcir em R$ 15.281,02 uma empresa que adquiriu 32 lotes, cada um com valor de R$ 165.303. Apesar desse valor venal de compra, o DF atribuiu à base de cálculo do ITBI números distintos para cada um dos lotes, que variam entre R$ 166 mil e R$ 263 mil.

“Ocorre que, em caso de discordância do valor da venda declarada pelo contribuinte, deve a administração instaurar processo administrativo com fim de arbitrar o valor devido, nos termos do que determina o artigo 148 do CTN”, escreveu o juiz.

“O Superior Tribunal de Justiça estabeleceu entendimento de que a administração pública não pode definir unilateralmente a base de cálculo do ITBI com respaldo em um valor de referência estabelecido sem a participação do sujeito passivo.”

O magistrado ainda argumentou que, segundo a jurisprudência do STJ, “o valor da transação é o correto para indicar a incidência do referido imposto, conforme declarado pelo próprio contribuinte, ficando reservado ao Fisco, caso assim entenda, o direito de questionar o valor informado”.

A empresa que será ressarcida foi representada pela advogada Ana Carolina Osório, especialista em Direito Imobiliário e membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB-DF. 

“A exigência de ITBI sobre valor diverso daquele declarado pelas partes em contrato representa manobra usada pelo DF e municípios para aumentar ilegalmente a arrecadação. Felizmente o Poder Judiciário tem reconhecido a ilegalidade e assegurado aos contribuintes o ressarcimento do valor pago em excesso”, diz a advogada sobre a decisão. 


DIREITO E POLITICA

O Sistema é bruto! Mas quem não é?

* Carlos Augusto Vieira da Costa

    A declaração da inelegibilidade de Bolsonaro pelo TSE ainda pode ser objeto de recurso ao STF, mas a expectativa de reversão da decisão é nula. Por isso, já se percebe dentre seus aliados um sutil movimento de acomodação à nova realidade, que se para muitos foi desastrosa, para alguns foi alvissareira, pois abriu um espaço até então impensável para 2026. E dentre esses poucos, certamente Tarcísio, governador de São Paulo, deve ser o mais animado.

    De qualquer modo, isso não serve para elevar o moral da militância, que segue reclamando de vingança do Sistema contra seu líder maior. Mas será que foi vingança? Com certeza sim. Ou talvez não seja “vingança” a definição mais correta da reação, mas sim “auto defesa”, pois não foi  nem uma e nem duas vezes que JB deixou claro a sua aversão ao Sistema, especialmente a partir das suspeitas lançadas sobre a credibilidade das urnas eletrônicas, que na verdade atinge a própria Justiça Eleitoral no peito, pois é ela que controla as urnas, que são um mero artefato, sem vontade própria ou autonomia.

    Portanto, a rigor, do ponto de vista político, trata-se de uma decisão justificável, em que pesem as discordâncias jurídicas, pois nenhum sistema sobrevive deixando seus adversários livres, leves e soltos para questioná-lo, pois cedo ou tarde pode haver uma ruptura, o que, de fato, chegou a ser cogitado e tentado (vide 8 de janeiro).

    Mas voltando ao início, não deixa de ser curiosa a forma pacífica e cordata que a direita aceitou a decisão como fato consumado, fazendo-nos lembrar da velha máxima que entoada na França no tempo da monarquia: “O rei morreu! Viva o rei! Ou em termos mais atuais: “rei morto, rei posto”!”

* O autor é Procurador do Município de Curitiba


ESPAÇO LIVRE

M&A e LGPD: o que tem mudado nas operações de fusão e aquisição?

* Anne Dallegrave Thomas e Camila Giacomazzi Camargo

Desde sua entrada em vigor, em 18/09/2020, a Lei nº 13.709/2018 ou Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) tem trazido uma série de impactos para as empresas. Com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade, a LGPD regulamenta todo e qualquer tratamento de dados pessoais, isto é, dados que identifiquem ou permitam a identificação de uma pessoa física.

Na medida em que operações de fusão e aquisição, também conhecidas por Mergers and Acquisitions (M&A), envolvem a utilização de dados pessoais de administradores, empregados, clientes, prestadores de serviços e outras pessoas, as partes dessas operações sujeitam-se à LGPD.

Dentre as várias etapas de operações de M&A, destacam-se as seguintes, na consideração de impactos da LGPD: valuation, due diligence e elaboração de documentos definitivos.

A valuation consiste na precificação da empresa-alvo. Em tal etapa, devem-se considerar todas as circunstâncias que possam interferir na formação do preço de venda. Nesse sentido, é importante verificar se a empresa já passou por um processo de adequação à LGPD e, em caso negativo, quais seriam seus custos (que podem ser elevados, a depender das necessidades de alteração de procedimentos e documentos internos etc.), se já ocorreram incidentes de segurança da informação pelos quais a adquirente pode vir a ser responsabilizada (como ocorreu, p. ex., no caso da rede de hotéis Marriott, responsabilizada por não ter investigado suficientemente a empresa Starwood antes de adquiri-la) e se o tratamento pretendido para a base de dados pessoais da empresa-alvo continuará sendo lícito, conforme as hipóteses permitidas pela LGPD.

Já na due diligence, que é o processo de auditoria da empresa-alvo, é relevante compreender e regular entre as partes como se dará o compartilhamento e a forma de análise de dados pessoais. Nesse sentido, é recomendável que as partes atentem especialmente para os seguintes pontos: necessidade de limitar o acesso aos dados pessoais da empresa-alvo àquelas pessoas que realmente precisam acessá-los; confirmação de que o compartilhamento de dados para fins da auditoria esteja de acordo com a LGPD; e inclusão de questionários sobre proteção de dados e rotinas da empresa-alvo, com o objetivo de identificar possíveis irregularidades que possam reduzir o preço da empresa-alvo.

    Nota-se que a LGPD tem impactado processos de due diligence, tanto nos procedimentos a serem observados na sua condução pelas partes como na necessária aferição pela adquirente do grau de adequação da empresa-alvo à LGPD ou, ao menos, das ações já adotadas em direção a uma adequação. Quanto à questão procedimental, passou a ser ainda mais relevante a inclusão de cláusulas, nos documentos preliminares (como, p. ex., no acordo de confidencialidade ou na carta de intenções), estabelecendo o regime de responsabilização das partes em caso de infração da proteção de dados pessoais no decorrer da operação, incluindo a previsão de multas.

Finalmente, na fase de elaboração de documentos definitivos, quando são negociados os contratos que estruturarão a operação, sejam contratos de compra e venda de participação societária ou de ativos, o ponto principal diz respeito à alocação dos riscos de proteção de dados identificados na due diligence, através da definição contratual das responsabilidades das partes. Destaquem-se aqui a relevância de declarações e garantias e de cláusula indenizatória:

Declarações e garantias: a empresa-alvo atesta e declara a sua situação em relação ao compliance de proteção de dados. São exemplos: declaração de conformidade com a LGPD, declaração de que a empresa não está sendo investigada pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) por descumprimento das obrigações legais, declaração de que não existem impedimentos para a transferência de seu banco de dados à adquirente e, eventualmente, declaração de que existe na empresa-alvo uma segurança da informação razoavelmente aceita conforme os padrões do mercado. Outras questões podem ser adicionadas ou suprimidas, a depender do caso concreto.

    Indenização: através de cláusula indenizatória, o(s) vendedor(es) da empresa-alvo assume(m) responsabilidade de indenizar a adquirente por contingências relacionadas à proteção de dados. Com a entrada em vigor da LGPD, faz-se necessário que a adquirente avalie a necessidade de atribuir responsabilidade ao(s) vendedor(es) da empresa-alvo por desconformidades com a LGPD, seja por fatos ocorridos antes do fechamento da operação ou, ainda, por um período posterior adicional de transição.

Visto que a empresa adquirente em uma operação de M&A poderá ser solidariamente responsável por qualquer violação relacionada ao tratamento de dados pela empresa-alvo, seja antes ou após o fechamento da operação, é primordial que ela observe rigorosamente a LGPD. Deverá, portanto, além de realizar a due diligence da empresa-alvo com base na lei, incluir as necessárias cláusulas protetivas, tanto nos contratos preliminares como nos definitivos, e verificar o impacto de eventual não-adequação da empresa-alvo para sua precificação.

 * Anne Dallegrave Thomas e Camila Giacomazzi Camargo são advogadas do departamento societário da Andersen Ballão Advocacia.


PAINEL JURÍDICO

Estatuto da OAB

O presidente Lula sancionou o Projeto de Lei 1.852/2023 que altera o Estatuto da Advocacia para incluir o assédio moral, o assédio sexual e a discriminação entre as infrações ético-disciplinares no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Sigilo

Empresa vítima de furto qualificado não pode ter acesso a documentos sigilosos do inquérito policial. Esse direito só pode ser exercido após a instauração da ação penal. O entendimento é da 7ª Câmara de Direito Criminal do TJ de São Paulo.

Estabilidade

Empregada gestante, admitida no regime de contratação temporário, não tem direito a estabilidade provisória. A decisão é do juiz titular da 1ª Vara do Trabalho de Pouso Alegre –MG.

Penhora

É possível a penhora de parte do salário para o pagamento de dívida não alimentar, desde que não afete a subsistência digna da família e do devedor. O entendimento é da juíza da 7ª Vara Cível de São Luís – MA.

Sucumbência

O Plenário do STF decidiu  que a própria União deve pagar honorários sucumbenciais à Defensoria Publica da União e que o valor recebido deve ser destinado exclusivamente ao aparelhamento das Defensorias Públicas, vedado o seu rateio entre os membros da instituição.


DIREITO SUMULAR

Súmula n. 629 do STJ- Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar.


LIVRO DA SEMANA

Depois de lançar, com notável sucesso, a 1ª edição de sua obra Direito Penal do Inimigo, o Doutor Hélio Silva de Vasconcelos Mendes Veiga nos brinda com a 2ª edição revista, ampliada e atualizada. Fazendo ajustes de natureza estrutural, acrescentando novos capítulos, entre outros, trata da Governança Pública e da Gestão Responsável do Estado, tema que, na qualidade de Procurador Municipal, domina com conhecimento teórico e pragmático, em que cuida do Direito Comparado no tormentoso tema do uso medicinal da cannabis em países da América do Sul e da Europa.