Danças na Educação

Wanda Camargo | assessoria@unibrasil.com.br

A fantasia é a atividade específica do ser humano, que inicia cedo em sua primeira infância, permite a expansão da linguagem  e o processo de cognição, uma movimentação especialmente criativa, que conduz ao desenvolvimento da capacidade de simbolização, expansão da consciência e portanto de novas possibilidades de pensar e estar no mundo.

A fantasia, segundo Carl Jung “é a mãe de todas as possibilidades, onde o mundo interior e exterior formam uma unidade viva, como todos os opostos psicológicos”; e manifesta-se na imaginação, nos sonhos, nos devaneios e nos corpos que dançam.

Dançar tornou-se um símbolo, descoberta de outros sentidos, união de fragmentos, religação com o espírito humano, com tudo aquilo que está abaixo do limiar do consciente,  diferenciando inclusive o indizível. Mesmo na complexidade da vida contemporânea, extrapolar explicações e conceitos fornecem roteiros de aprendizagem em direção à outras paisagens e histórias.

Na história das religiões, vários foram os deuses associados às festividades e danças, como Akan entre os Maias, Baco ou Dionísio entre romanos e gregos, Kómos, filho de Dionísio e tido como extremamente dançante, e hindus cultuavam Shiva Nataraja, senhor da dança, o dançarino cósmico que, no seu girar incessante, move a energia eterna: criação-expansão, preservação-duração, destruição-renovação.

Em quase todos esses cultos, a coreografia refletia o redemoinho do tempo, o eterno repetir da vida, morte e renascimento, uma forma ancestral de magia que permitia ao dançarino vivenciar o divino. Contudo, dominar a magia e encantar os demais, exige viver o encantamento, ou seja, para encantar, é preciso encantar-se, deixar a magia da dança envolver professor e alunos na criação e beleza, abrir-se ao misterioso e ao inusual, perceber os múltiplos sentidos no mundo.

Desde os primórdios da civilização, os homens dançaram em todos os momentos importantes dos ciclos da natureza, de guerra e de paz, da morte e dos nascimentos, da plantar e de colher, identificando-se ritmos das mudanças das estações. Dançando, a comunidade marcava sua identidade, seus valores e crenças. Celebração, participação, alegria e tristeza, renovar-se após a festa e o início do novo trabalho, normalmente em danças circulares desde um passado remoto, dançando em comunhão e transcendência, solidários e sem necessidade de conhecimentos prévios, bastando entrar na roda, mãos dadas num encontro de corações.

Tais danças são realizadas em círculo, e estão presentes em muitas tradições e culturas distintas,  e seria quase impossível relacionar todas as suas origens: indianas, gregas, romanas, israelitas, brasileiras e muitas outras. Crianças sempre gostaram de dançar em roda, e esta tradição está no folclore de muitos países, como patrimônio milenar e contemporâneo conservado pelo costume; e conforme Luís da Câmara Cascudo, historiador, sociólogo, folclorista e professor, que dedicou a vida ao estudo da cultura brasileira,  folclore ciência do povo. Para o autor, os grupos humanos em todos os países do mundo possuem hábitos domésticos, grupais e nacionais, e portanto cultura é permeada por folclore, embora não se resuma a ele.

A sociedade brasileira, culturalmente diversificada, tem nas brincadeiras de roda uma forma de expressão cultural, realizada por crianças que rodando, com coreografias as vezes próximas de danças mais elaboradas, como “Escravos de Jó”, “Roda pião”, e a agora considerada politicamente incorreta  “Atirei o pau no gato”.

Segundo muitos pesquisadores, esta brincadeira coloca jovens e crianças em contato com hábitos e valores de sua comunidade; experiência ao mesmo tempo privada e coletiva, em que não existe receio de fazer errado, bastando  estar atento ao seu ritmo interno e à sua imaginação, que alarga a criatividade e traz disposição de continuar na roda, aceitando os limites do corpo e os ritmos de outros, dos que partilham a dança.

Analogia da vida, educar das emoções, metáfora da convivência, quebra da rigidez das verdades pedagógicas, do fazer educativo por meio apenas do apelo à razão. A dança, desde a mais tenra infância, revela a multiplicidade dos recursos no fazer pedagógico, trazendo o maravilhamento ao cotidiano escolar.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.