Final da década de 20. Na obra A Traição das Imagens, o pintor surrealista belga René Magritte estampou um cachimbo com os dizeres Ceci n’est pas une pipe, ou isto não é um cachimbo. Não, não era um cachimbo — mas uma imagem de um cachimbo.
2011. Um artista apresenta em uma galeria moderninha um HD externo de 1 terabyte. Não, aquilo não é um HD externo de 1 terabyte —mas cinco milhões de dólares. O HD está recheado de arquivos pirateados que, se fossem adquiridos legalmente, valeriam todo esse dinheiro. Aquilo é um HD externo ou são… US$ 5 milhões?
Os artistas estão sempre forçando e redefinindo questões de arte e legalidade no contexto artístico. Nós estamos continuando essa história já estabelecida, explica Moises Sanabria, cofundador do coletivo e galeria ART404, responsável pela obra 5 milhões de dólares, 1 terabyte, ao lado do jovem artista Manuel Palou. Os dois são venezuelanos, se conheceram em Miami e hoje moram em Nova York.
Torrent. Os artistas se inspiraram em um torrent cujo título era US$ 20 mil. Nós ficamos fascinados com a ideia dos arquivos serem pequenos em um computador, mas caríssimos na vida real. Usando esse processo, nós criamos uma peça que fala sobre o valor dos dados digitais e as consequências na vida real de baixar ilegalmente esses arquivos, diz o artista.

Todos os arquivos estão livremente acessíveis em sites como The Pirate Bay e Megaupload, diz o artista. Ele se considera um pirata — assim como a maioria da internet. Nós concordamos que as leis de direitos autorais são necessárias, mas é muito difícil cumpri-las e controlar os usuários. Isso é uma coisa boa e ruim, explica Sanabria.
Na vida real, o HD ficou exposto como escultura na galeria ART404, em Miami. Do lado de fora, o HD nada tem de diferente. Só que dentro há 1,016 GB de arquivos pirateados. São programas (como o pacote Adobe Font Collecion, que custa US$ 20 mil), games (como os 135 GB da coleção do Nintendo DS, que vale US$ 145 mil, e todos os jogos do Nintendo 64 ) e o Fiction Library, um programa que tem todos os livros de ficção científica publicados entre 2003 e 2011. Só isso valeria US$ 3 milhões.
Cada geração tem suas ideias latentes sobre cultura e política. As novas gerações agora têm a habilidade de ver e discutir arte livremente na internet. Isso está tornando a arte contemporância uma ferramenta cada vez mais importante para trazer essas ideias à tona, diz o artista.