Em hebraico, BeTipul; em inglês, In Treatment; em espanhol, En Terapia; em romeno, În Derivâ; em holandês, In Therapie; em sérvio, Na Terapiji. Em português, uma das mais criativas séries de TV dos últimos anos, cuja versão brasileira estreia em 1.º de outubro, às 22h30, no GNT, chama-se Sessão de Terapia, mas poderia ser chamada de a arte de levar para a TV a complexidade de uma sessão de psicanálise e transformá-la em série vencedora de dezenas de prêmios em mais de 30 países. A façanha inicial foi do israelense Hagai Levi, que criou BeTipul em 2005, após passar a vida tentando descobrir o que de fato queria fazer.
Levi, que é diretor, produtor e roteirista, também trabalhou na versão americana da série, In Treatment, estrelada por Gabriel Byrne, produzida e exibida pela HBO e vencedora de vários prêmios Emmy e Globo de Ouro. Costumo ir a todos os países onde a série é produzida, mas não consegui ir ao Brasil, porque estou filmando um documentário justamente sobre as diferentes versões. Em breve, vou visitar seu País, contou Levi à reportagem, em conversa por telefone. Mas li o material que os brasileiros me mandaram. Sei que a equipe é ótima, que o diretor é também ator e vai dar certo. Esta é uma ideia e um formato muito simples que até hoje me surpreende.
Por formato simples entenda-se uma série diária de 45 capítulos de 28 minutos cada um. A cada dia, um paciente é atendido. Na sexta, o terapeuta visita sua terapeuta. Em questão de produção, de fato parece simples realizar Sessão de Terapia. Desenvolve-se em uma única locação, praticamente um cenário. Em questão de roteiro, a simplicidade engana. Não acredito em nada que pareça muito simples. É preciso ter cuidado, pois o roteiro, ainda que partindo de um original, tinha de ser muito crível, bem desenvolvido. Tudo tinha de ter muita verdade, comenta Roberto d’Avila, produtor da série, que teve a ideia de comprar os direitos de adaptação e propor o projeto para o GNT.
Para garantir essa verdade, o trabalho dos atores também era crucial. Nada melhor que um diretor ator para entender a sutileza necessária. Trabalhar o tom da atuação, da voz, da empostação foi um dos maiores desafios. Se fosse muito over, poderia parecer um monólogo e não uma conversa. Foi um dos trabalhos mais ‘simples’ e mais complexos que já fiz, comenta Selton Mello, que, depois de mil páginas de roteiro e dois meses de filmagem, tem milhagem digna de vários longas-metragens. É um desafio para o qual trouxe a experiência de uma vida. Do teatro, da TV, do cinema, que amo e em que já fui ator e diretor
Uma das grandes dificuldade – e um dos prazeres – de Selton foi justamente selecionar o elenco. Com olhar apurado, Mello escalou uma trupe eclética, que varia da estreante Bianca Muller à veterana Selma Egrei. Bianca vive Nina, uma ginasta de 15 anos; é a paciente mais jovem de Theo, o terapeuta, vivido pelo experiente Zécarlos Machado. Selma é Dora, a supervisora e orientadora de Theo. A sessão de Nina é na quarta. Antes, na segunda, é dia de Julia (Maria Fernanda Cândido) passar e desestabilizar o consultório. Ela tem medo de relacionar, mas acaba se apaixonando pelo terapeuta. É um personagem incrível. Diferente de tudo que já fiz, conta a atriz. Julia, aliás, é de certa forma rival de Clarice (Maria Luísa Mendonça), mulher de Theo, que reclama da ausência do marido na relação. Outro casal em crise é Ana e João. Eles dividem o divã às quintas, com os dilemas em torno de uma gravidez que é desejada por ele (André Frateschi) e rejeitada por ela (Mariana Lima). Para completar, terça-feira é dia de Breno (Sergio Guizé), policial que matou uma criança por acidente.
Breno é um dos personagens preferidos de Levi. Cada país tem o desafio de adaptar os seus dilemas locais . Mas a natureza humana, seus desejos e conflitos são comuns em todo o mundo. O personagem do piloto, que no Brasil virou o policial, é o que mais muda conforme a realidade social de cada lugar. Ele agrega a complexidade do contexto, diz o autor. Foi o trabalho mais difícil que já fiz. Não só pela complexidade do personagem, e do que ele enfrenta, mas também pelo pouco tempo de preparação. Foi um processo intenso. Toda a ação é contida, baseada no poder da palavra, nos gestos mínimos, conta Guizé.
A propósito, Breno é um atirador de elite que, em uma ação na favela de Heliópolis, ao atirar em um criminoso, acerta também uma criança e tem de lidar com a culpa. O Breno é a melhor versão desse personagem, que na série israelense é um soldado que atirou uma bomba em uma escola. Isso é mérito do Guizé, que deu a ele complexidade que outros não deram, diz d’Avila, que cita a originalidade como fator de sucesso de público. Quando a Daniela Mignani (diretora do GNT) contou que queria investir mais em dramaturgia, pensei em Sessão de Terapia. É diferente de tudo.
Para Hagai, a grande diferença não está no formato, mas no efeito. Mais que entretenimento, a série levanta a importância da psicanálise. E mostrar para muitos que não sabem o que é terapia, a realidade do tratamento. Se no Brasil conseguirmos levantar essas questões, estarei satisfeito.