Ira! abre Virada com críticas ao tratamento dado a usuários de crack

Folhapress

GIULIANA VALLONE, GISLAINE GUTIERRE E TATIANA HARADA
SÃO PAULO, SP – Depois de sete anos fora dos palcos, o Ira! abriu neste sábado (17) a Virada Cultural 2014, no palco Júlio Prestes, com uma crítica do vocalista, Nasi, ao tratamento dado pelo “poder público” aos usuários de crack do centro de São Paulo.
“Estamos em uma região da cidade em que está se alastrando uma doença, o vício do crack”, disse, ao introduzir a música “Flerte Fatal”. “Que o poder público trate [os usuários] com amor, como doentes que são. Porque eles precisam de auxílio médico, e não de os limpar da cidade como se fossem sujeira.”
O secretário municipal de Cultura, Juca Ferreira, presente no show, afirmou que a crítica não foi dirigida à prefeitura. “O que Nasi disse reforça a ideia da prefeitura, de tratar os usuários como seres humanos. Quem trata com polícia não somos nós”, disse, em referência ao governo do Estado.
Na quarta (14), a Prefeitura Municipal tentou colocar usuários de droga da cracolândia dentro de um cercado de metal, que foi erguido na esquina da alameda Cleveland e da rua Helvetia.
Indignados com as grades, os usuários resolveram ocupar a tenda Braços Abertos, localizada na rua Helvetia. De acordo com a prefeitura, as grades foram colocadas apenas para organizar a movimentação dos usuários.
Com início às 18h10, o show, que contou com a forte empolgação do público, começou com “Longe de Tudo”, música do primeiro LP da banda, “Mudança de Comportamento”, lançado em 1985. “Gritos na Multidão”, de 1986, veio em seguida.
“Eu quero ouvir os gritos da multidão!”, gritou Nasi, respondido prontamente pelo público, mais maduro e predominantemente masculino. A Secretaria da Cultura estimou o público em 40 mil pessoas.
Os fãs mais velhos, contemporâneos de Nasi e do guitarrista Edgar Scandurra, acompanharam todas as canções com as letras na ponta da língua.
“Tarde Vazia” foi o primeiro grande momento do show, com o público cantando junto, todos com as mãos para cima. Em seguida veio “Dias de Luta”, fazendo o público entoar o clássico coro que acompanha a canção: “Porra, caralho, cadê meu baseado?”
A inédita “ABCD”, que tem pegada de jovem guarda, também foi recebida com animação pelo público. “Flerte Fatal” e “Envelheço na Cidade”, entre outros sucessos da banda também apareceram.
Sem André Jung e Ricardo Gaspa, baterista e baixista da banda de 1985 a 2007, respectivamente, a banda paulistana se apresenta agora com Daniel Rocha, filho de Edgard, no baixo, Evaristo Pádua, na bateria, e Johnny Boy nos teclados.
Com os vocais de Nasi e Scandurra, no entanto, a banda mantém sua identidade. Fora de forma, Nasi deu alguns pulos desajeitados no palco e cantou com uma voz ainda mais rouca e grave.
O show da Virada dá início a uma nova turnê da banda, que deve ter cerca de 200 apresentações pelo país.
O jornalista Cristiano Martinez, 36, fã da banda há 15 anos, veio de Irati, no Paraná, especialmente para assistir à volta da banda. “Só tinha visto um show deles, em Curitiba, em 2000. Agora, quero aproveitar essa turnê para vê-los mais vezes.”
PALANQUE
A banda também aproveitou o show para falar da mobilização pela citação do Parque Augusta. Nasi aproveitou uma faixa levantada pelo público, em que se lia “Parques Resistem” para levantar a questão.
O baixista Daniel Rocha, publicamente envolvido com a causa, assumiu os microfones: “Vamos ver se a gente consegue ganhar da especulação imobiliária. Precisamos de mobilização popular, porque se depender da prefeitura e do poder público, vão construir prédios ali.”
A parada para os discursos esfriou os ânimos do público, que só pareceu acordar novamente quando a banda tocou “Mudança de Comportamento”.
A voz de Nasi ficou mais audível a partir da metade do show. O som, porém, oscilou dependendo da posição do público: mais baixo perto do telão montado pela organização. Houve também reclamações de reverberação do som do lado direito do palco.
ARTISTA DE RUA
Antes do Ira! subir ao palco, o artista de rua Rafael Pio, anunciado pela organização do evento como “o primeiro a tocar guitarra nas ruas de São Paulo”, fez uma pequena apresentação para o público.
Tocando um mix de clássicos do rock, ele evocou bandas como Black Sabbath, Iron Maiden e Deep Purple.