Caminhão do exército e transporte de pessoas
Recentemente houve no trecho urbano da BR-476 (Antiga BR-116 e futura Linha Verde), em Curitiba, um acidente rodoviário que envolveu um caminhão do Exército, o qual transportava soldados, e pela dinâmica do acidente, houve o tombamento do veículo no canteiro central da pista, mas entre mortos e feridos, todos sobreviveram… Uma das questões que foi levantada na oportunidade é em relação à regularidade do transporte de pessoas (soldados são pessoas) naquele compartimento, em princípio destinado ao transporte de cargas.
A idéia de que tais veículos gozariam de prerrogativa especial decorre da expressão ‘veículo de uso bélico’, que no Código de Trânsito estão dispensados do uso de placas (Art. 115,§ 5º do CTB), do registro (Art. 120,§2º do CTB) e do licenciamento (Art. 130, §1º do CTB). Ainda assim é de se destacar que não há uma definição na Lei de quais seriam os ‘veículos de uso bélico’. ‘Bélico’ está relacionado à guerra, portanto, em princípio só gozariam das prerrogativas em momentos de guerra. Ainda que consideremos o potencial de uso em momento de guerra (ainda não declarada), entendemos que estaria limitado aos blindados, ‘tanques’, etc., mas o automóvel utilizado normalmente pelos oficiais, o jipe usado em situações normais, o caminhão acima descrito estariam sim enquadrados no Art. 120, § 1º do CTB, como ‘veículos oficiais’ (placa branca) , de propriedade da União (Brasil na placa), sem qualquer prerrogativa especial no trânsito.
Independentemente da discussão de tratar-se de ‘veículo de uso bélico’ ou ‘veículo oficial’, na circulação de trânsito (e conseqüente convívio com os demais usuários da via pública) não estão dispensados de qualquer regra de circulação, inclusive habilitação compatível com a característica do veículo, equipamentos obrigatórios e forma adequada de transporte de pessoas. No caso o ‘caminhão’ é um veículo de carga com PBT superior a 3,5 toneladas, requerendo categoria ‘C’, que estaria transportando pessoas no compartimento de carga, não sendo necessária categoria ‘D’ porque essa forma de transporte não tem condão de transformar o veículo num ônibus, que seria a forma adequada de transporte coletivo (mais de 9) de pessoas.
Num caso hipotético, em condições semelhante, considerando que o tombamento fosse decorrente da imperícia (barbeiragem) do próprio condutor (também soldado)em que houvesse vítimas tanto fatais quanto lesionadas poder-se-ia ainda questionar se a legislação penal aplicável ao responsável seria o Decreto-Lei 1001 de 1969 (Código Penal Militar – Arts. 206 – homicídio culposo, e Art. 210 – lesão corporal culposa) ou a Lei 9503/97 (Código de Trânsito – Arts. 302 e 303, homicídio e lesão culposos respectivamente). Considerando os critérios de cronologia e especialidade, e sob o fundamento que a condição de militar não o distingue da igualdade aplicável aos demais usuários da via no trânsito em situações de normalidade somos da tese que a legislação aplicável é o Código de Trânsito, e a União seria teria responsabilidade civil pela forma inadequada de transporte de pessoas.
Marcelo José Araújo – Advogado e Consultor de Trânsito – Professor de Direito de Trânsito da UNICURITIBA – [email protected]