Pelo Tratado de Guadalupe Hidalgo de 1848 a linha divisória que separa quatro estados norte-americanos de seis mexicanos corta o Rio Grande ao meio e se estende ao longo de mais de 3.100 quilômetros desde o Golfo até o deserto de Chihuahua, onde a região que circunda o muro separando a capital do estado – Ciudad Juárez – e El Paso no Texas mantém o triste título de fronteira mais violenta do mundo fora das áreas de guerra. Com base em dados desde o final de 2006 da ONG Milenio, o mês de março deste 2010 bateu todos os recordes com 1.130 execuções (mais de 36 por dia) no país relacionadas ao narcotráfico. Para coroar o massacre, no dia 31 quatro corpos decapitados foram deixados no interior de uma caminhonete Honda em Cuernavaca (a cidade da eterna primavera), com um bilhete de Edgar Valdés Villareal, conhecido como La Barbie, dirigido a seu inimigo El Negro do Cartel Pacífico do Sul numa vingança a outros quatro que foram encontrados por perto nas mesmas condições 48 horas antes. A Operação Chihuahua lançada há dois anos pelo presidente Felipe Calderón é um rotundo fracasso. A gigantesca bandeira mexicana erguida no parque Chamizal para expressar o orgulho nacional bem em frente aos poderosos vizinhos do norte e para comemorar os êxitos econômicos e os empregos provenientes da instalação de milhares de maquiladoras (indústrias têxteis que importam matéria prima dos EUA e exportam produtos manufaturados), não impediu a transformação de Ciudad Juárez no centro nacional do crime, com sequestros, extorsões e uma média diária de onze assassinatos. Cerca de dez mil casas de negócio estão fechadas e ¼ das residências permanecem vazias, abandonadas por seus proprietários que foram embora por medo ou para proteger a família e sem inquilinos.
O México está em guerra declarada pelo Presidente da República contra os narcotraficantes com forte apoio dos EUA, antes com Bush e agora com Obama.  O governo vangloria-se de suas vitórias, entre as quais a recente captura de Arturo Beltrán Leyva, considerado o Chefe dos Chefes. Argumenta, com razão, que a grande maioria das mortes está ocorrendo dentro das próprias gangues por lutas entre elas em função da pressão a que estão submetidas, mas os dados mostram que março também bateu o recorde de execuções de agentes da lei, com 89 policiais e militares. Em artigo para o Washington Post, três acadêmicos da Universidade de Woodrow Wilson tentaram desmentir o que denominaram de cinco mitos sobre a guerra das drogas no México: a) o país não é vítima de violência indiscriminada, não sendo um estado falido; b) o estado mexicano possui recursos suficientes para combater o crime; c) a corrupção endêmica não é a semente que faz florescer os cartéis da droga; d) a violência relacionada à droga não é um problema só mexicano, mas dos EUA também; e) a criminalidade originária do México não está se espalhando pelos Estados Unidos, tanto que a fronteiriça El Paso é tida como uma das cidades menos violentas do país. A questão é que a população, acostumada a ver os corpos mutilados nas primeiras páginas de seus jornais, não dá fé a este tipo de interpretação da realidade. Na verdade, ninguém acredita. O The Wall Street Journal afirmou que Juárez é uma vergonhosa exibição do fracasso da estratégia de Calderón, colocando como testemunha a própria Secretária de Segurança Interna do governo Obama, Janet Napolitano. A razão mais imediata para esta reação foi a execução há duas semanas pelo cartel de Juárez de três pessoas ligadas ao consulado norte-americano.
O fato é que os sete grandes cartéis da droga mexicanos – do Golfo, los Zetas, Beltrán Leyva, Sinaloa, La Familia, Juárez e Tijuana  – seguem em plena atividade. Para Andrés Oppenheimer, os cartéis da droga não morrem, apenas se mudam. Cerca de 14 bilhões de dólares investidos pelos EUA nas últimas quatro décadas fizeram com que os capos da droga se mudassem do Peru e da Bolívia para a Colômbia, daí para o México e agora para a América Central. O presidente da Guatemala, Álvaro Colom diz que quando seu colega mexicano Calderón  tem sucesso contra os narcotraficantes ele tem problemas, defendendo a posição de que o combate precisa ter caráter regional, ou seja, quer mais dinheiro de Obama inclusive para reequipar e aumentar os efetivos das suas Forças Armadas, drasticamente reduzidas após o fim da guerra civil em 1996. Curiosamente ao seu lado a Costa Rica, que não tem exército, segue sendo o país mais tranqüilo da região e não tem a menor intenção de rearmar-se, exatamente para não atrair a guerra para seu território. 

 

Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional