Parece ter chegado, afinal, a vez da China. Junto com a Índia e baseada no extraordinário crescimento dos últimos anos, comanda o deslocamento da riqueza mundial do ocidente no rumo do oriente e do sul. Os países em desenvolvimento possuem reservas equivalentes a 4,2 bilhões de dólares, uma vez e meia a mais que os países desenvolvidos. A China está em toda parte e no ano passado tornou-se o principal parceiro comercial do Brasil, da África do Sul e da própria Índia. A América do Sul e a região andina, eternamente dependentes de suas matérias-primas, mereceram um diagnóstico pouco favorável da OCDE, segundo a qual o crescimento do PIB tem sido baixo, as desigualdades se mantém e pouco se obedece ao estado de direito, um quesito no qual o Brasil tirou nota 4,3 numa escala de 0 a 10. Assim, quando a China abriu seu mercado, comprando quase tudo o que a região produz, os indicadores melhoraram a olhos vistos. 74,3% das exportações brasileiras para a China são de produtos primários e só 1,4% de manufaturas de alta tecnologia, e mesmo assim esta é uma situação muito mais favorável do que a dos vizinhos andinos e do Mercosul.
Mais impressionante ainda tem sido a penetração chinesa na África, palco de uma explosão de negócios bilaterais. Em Angola, US$ 5,4 bilhões do China Exim Bank financia a reconstrução de infraestrutura vital nas áreas de energia, água, saúde, educação, pesca, estradas, aeroportos, em troca de petróleo fornecido pela Sonangol (a Petrobrás angolana). Outros US$ 14 bilhões foram para Nigéria, Guiné, Gana, RDC, Zimbabwe, Gabão, Congo e Sudão que pagarão com seus recursos naturais, em geral petróleo, mas também com cromo,ferro, bauxita, cacau, cobre e minério de ferro. Cerca de doze bilhões de dólares foram aplicados pelos chineses no subsahara africano enquanto os Estados Unidos e a Europa lutavam para sair da crise econômica. O que o futuro nos reserva? O levantamento do resto não dever ser sinônimo do declínio do ocidente. A prosperidade do mundo pode beneficiar tanto os países ricos quanto os pobres. Dúvidas persistem sobre se desta vez a abertura chinesa será sustentável, ou se repetirá o seu passado. Nos idos dos séculos XIV e XV, a maior frota de navios e a melhor tecnologia naval então existentes foram queimadas em prol da volta ao isolamento e da não contaminação com as impurezas dos ocidentais. Hoje, os avanços de Pequim são comprometidos pelos atrasos no campo dos direitos humanos. O país lidera as estatísticas globais de pena de morte e Liu Xiaobo, Nobel da Paz deste ano, cumpre pena até 2019 depois de, em 2008, ter liderado um manifesto pró-democracia. Até quando a convivência com práticas bárbaras e com a repressão será aceita por um povo que cada vez mais tem acesso ao que se passa no mundo?  
Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional