O Paraná repetiu em 2006 o desempenho do ano anterior – 927 milhões de frangos de corte abatidos -, permanecendo como o maior produtor brasileiro de carne de frango e o segundo em volume de exportação, logo atrás de Santa Catarina. Não só as grandes empresas brasileiras (Sadia, Perdigão, Seara, Frangosul, Avipal), mas também a grande quantidade de pequenos produtores e de trabalhadores observam com crescente preocupação o avanço, lento, mas aparentemente firme, da gripe aviária no mundo.
Não é sem razão. O Brasil é hoje o maior exportador mundial de carne de frango (2,6 milhões de toneladas em 2006) e o terceiro maior produtor (9,3 milhões de toneladas), neste caso sendo superado por EUA e China. A posição de liderança foi alcançada em 2004, mantendo-se até o momento, quando os temores em relação à gripe aviária estão provocando uma retração no mercado internacional. Os efeitos de uma pandemia (ou seja, uma epidemia de proporções mundiais) seriam trágicas. Na hipótese de confirmação de um caso de gripe aviária numa criação, todas as aves do estabelecimento são sacrificadas, assim como os ovos, produtos derivados e a carne vendida desde o começo do período de incubação da doença, ademais da desinfecção das instalações e dos veículos relacionados ao seu transporte. Quando atinge o ser humano, transforma-se numa máquina muitas vezes mais letal do que qualquer guerra, temendo-se que possa repetir a gripe espanhola que em 1918 espalhou-se pela terra e dizimou 40 milhões de pessoas.
Em janeiro, a Nigéria notificou sua primeira perda humana pelo H5N1, o vírus causador da doença – uma mulher de 22 anos -, mas foram os perus de uma fazenda próxima à pequena cidade de Suffolk, na Inglaterra, que ganharam a primeira página do The Guardian e de outros jornais britânicos. 160 mil foram abatidos depois que um deles teve confirmada a gripe aviária como causa mortis. Dos 55 países já afetados, em apenas onze ocorreram perdas humanas e sempre devidas a contato direto com aves. Desde 2003 foram constatados 271 casos de gripe aviária em humanos, com 165 mortes, 64% das quais na Indonésia e no Vietnã. De fato, os casos fatais estão concentrados na Ásia, mas a África (além do caso nigeriano, outros 11 no Egito) e o Leste Europeu (9 óbitos no Azerbaijão e Turquia) mostram que também são vulneráveis. O caso inglês, em aves, soma-se a outros ocorridos na Hungria, França, Alemanha, Rússia, Ucrânia e Dinamarca, mas nenhuma ocorrência foi constatada nas Américas.
Até hoje não ocorreu transmissão do homem para o homem, numa evidência de que o vírus continua atacando unicamente aves sem conseguir dar o temido salto entre as espécies que lhe permitiria reproduzir-se autonomamente em humanos.
A gripe ou influenza aviária é uma doença contagiosa aguda do trato respiratório, e tem como reservatório natural pássaros aquáticos migratórios que infectam aves e podem atingir outras espécies (porcos, cavalos, cachorros, homens). Na atual onda o vírus H5N1 tem predominado, mas ele pode sofrer mutações e pode ser de outro tipo. Há quinze subtipos conhecidos de H (vem de uma proteína, a Hemaglutinina) e nove de N (Neuraminidase), que se combinam de acordo com as circunstâncias. A gripe espanhola foi causada por vírus H1N1, a asiática de 1957 pelo H2N2 e em quatro países (Zimbábue, Formosa, África do Sul e Japão) agora afetados o diagnóstico foi de H5N2. Quando é preciso uma vacina específica (hoje o mundo as está produzindo em massa para combater o H5N1), são necessários pelo menos seis meses de trabalho de laboratório e testes.
Não é comum que um aviário seja contaminado por aves aquáticas selvagens, mas o Brasil é destino normal de migração de irerês, marrecos, patos, tisius, coleirinhas quando abandonam a América do Norte ou a Antarctica em busca de lugares mais quentes para se reproduzirem.
Os Ministérios da Agricultura e da Saúde brasileiros juntaram-se às associações de produtores para melhorar ao máximo as condições sanitárias, com cuidados redobrados aos plantéis avícolas e às cadeias de exportação ou de consumo interno. Por via das dúvidas estão sendo importados lotes e mais lotes de tamiflu, medicamento que se destina ao tratamento da gripe aviária humana por via oral. O Brasil está assustado, mas procurando fazer sua parte para prevenir-se deste que pode vir a ser o novo mal do século. Do ponto de vista geográfico e enquanto não surge a transmissão homem a homem o nosso país está numa situação das mais favoráveis, pela larga distância que o separa dos lugares mais afetados. Não é uma garantia de imunidade. É somente um alerta para que, se necessária, a defesa seja mais eficaz.
Vitor Gomes Pinto
Escritor, Analista internacional,
Doutor em Saúde Pública