Hillary Rodhan Clinton é a franca favorita, mas precisa de uma vantagem sólida sobre Barack Obama, para liquidar a fatura e tornar-se de fato a candidata do Partido Democrata nesta Superterça, quando 52%, ou 1688 dos 3253 delegados eleitos serão escolhidos em 22 estados. Barack Obama participa como um free lancer (livre atirador) e, se vencer ou mesmo se perder por pouco (o que lhe daria chances concretas de recuperação nos 24 estados que faltam), pode consagrar-se como uma das maiores surpresas eleitorais na história norte-americana.

Poucos se arriscam a fazer estimativas de resultados depois dos triunfos de Obama em Iowa e Carolina do Sul. Afinal, por enquanto a maioria dos delegados (38 x 36) é dele. Não obstante, é possível ter uma idéia de como está a situação até aqui: Hillary poderia contar com 734 delegados ou 43,5% do total e Obama com 526 (31,2%), restando 428 (25,3%) indecisos. Ou seja, tudo pode acontecer.

Na campanha, disputa-se cada milímetro de terreno. Nova York é de Hillary e qualquer resultado abaixo dos 60% seria um desastre. Da mesma forma Illinois é de Barack e lá ele prevê conquistar o apoio de sete em cada dez votantes. Fechando a conta para os quatro grandes, no maior de todos os estados, a Califórnia, e em Nova Jersey, as previsões são favoráveis a Clinton na proporção de nove por seis.

A retirada de John Edwards deixa um vazio de pelo menos 20% dos votos a ser preenchido e os seus eleitores, que não queriam uma mulher nem um negro na presidência, provavelmente em sua maioria sequer comparecerão às urnas ou aos caucuses (em alguns estados a decisão é obtida nessas reuniões informais, nas quais grupos conversam e resolvem quem apóia a quem).

Os asiáticos e os hispânicos, que no conjunto representam cerca de 17% da população dos Estados Unidos, em sua maioria preferem Hillary pois consideram que o governo de Bill Clinton os favoreceu, mas não costumam envolver-se nesta fase de primárias. Os migrantes brasileiros, cerca de 2 milhões em boa parte na categoria dos ilegais e concentrados em comunidades junto a Boston e Miami, devem ter um comportamento similar ao dos hispânicos, inclusive por não estabelecerem uma ligação direta entre as eleições nos EUA e os problemas econômicos ou o quadro político verde-amarelo (os democratas costumam ser mais protecionistas do que os republicanos, o que prenunciaria maiores dificuldades para as nossas exportações).

Um fator determinante está no protagonismo dos eleitores negros, uma fatia de 13% do total dos americanos que agora está profundamente interessada em função da presença de um dos seus na disputa. Foram eles que inclinaram a balança pró-Barack na Carolina do Sul, onde constituíram mais da metade dos eleitores democratas.

Num oceano de promessas de campanha que pouco diferenciam um candidato do outro, há curiosidade sobre as soluções previstas para o setor saúde, com custos crescentes e limitada cobertura. Hillary imagina um sistema universal, uma espécie de SUS norte-americano, enquanto Barack se dispõe a custear planos de saúde para os que não têm como pagá-los. Diante da impossibilidade de estar presente em toda parte, Obama aposta suas fichas em mensagens de caráter nacional, fugindo propositadamente dos temas locais por considerar que nestes a imbatível máquina eleitoral dos Clintons é insuperável.

Numa arriscada proposta, declarou que promoverá um encontro de alto nível com o mundo muçulmano sem excluir a priori qualquer dos seus chefes de estado, a fim de manter “uma discussão honesta sobre caminhos para estreitar a brecha que aumenta a cada dia entre os muçulmanos e o Ocidente”. Uma vez que ambos os candidatos afirmam que retirarão as tropas americanas do Iraque, esta é uma das poucas idéias de fato inovadoras e com potencial para reduzir as fortes tensões acumuladas ao longo da era Bush, veiculadas numa campanha dominada pelas aparências.