Legalização do consumo de drogas em debate

Bem Paraná

Em um novo round na luta pela aceitação do consumo das chamadas drogas leves, os eleitores da Califórnia rejeitaram nas eleições da última terça feira a emenda 19 que autorizaria aos maiores de 21 anos portar até 28 gramas de maconha para consumo pessoal nas residências e cultivar a planta em casa. Os 46,2% que disseram sim representam cerca de 3,5 milhões de californianos, o que dá munição aos promotores da legalização para voltarem à carga nas eleições de 2012. O presidente Barack Obama, que levou uma sova eleitoral histórica perdendo o controle da Casa dos Representantes e mantendo a maioria do Senado pela diferença mínima, declarou (em 2004, como candidato a senador) que a guerra contra as drogas tem sido um completo fracasso, pelo que devemos repensar e descriminalizar as leis sobre a maconha, mas agora alertou que caso a emenda 19 passasse continuaria a processar pessoas na Califórnia por posse e cultivo da erva, com base na lei federal. Enquanto o Nobel de Economia Milton Friedman afirmou estar a favor da legalização das drogas porque a maior parte dos problemas que elas provocam se deve ao fato de serem ilegais, o megainvestidor George Soros que financiou boa parte desta campanha pró-legalização disse que a penalização da maconha não impediu que se tornasse na substância ilegal mais consumida nos Estados Unidos.
A Organização das Nações Unidas para a Droga e o Crime (UNODC) informa que até 250 milhões de pessoas fazem uso de drogas ilícitas no mundo e que a maconha tem o maior número de usuários, com algo entre 130 e 190 milhões. Seguem-se os consumidores de estimulantes do tipo amphetamina, de opiáceos como a heroína e de cocaína. A política oficial praticada pela ONU e pela grande maioria dos países favorece campanhas públicas para impedir ou reduzir o consumo associadas à forte penalização de traficantes, intermediários ou consumidores, e a estratégias de substituição dos cultivos e bloqueio das fontes de lavagem de dinheiro. Luis Inácio Lula da Silva estava entre os signatários do famoso manifesto de intelectuais e celebridades entregue ao Secretário-Geral da ONU no qual se afirma que a guerra global contra o narcotráfico está causando mais danos que o consumo.
Os que se opõem à idéia consideram que oa mafiosos italianos e norte-americanos não desapareceram quando caiu a proibição à ingestão de álcool na década dos anos 1930, transformando-se em empresários e o número de consumidores desde então cresceu exponencialmente no mundo. Mesmo a legalização só para os adultos manteria os menores comprando drogas não legalilzadas no mercado negro, além de rebaterem o argumento de fornecimento de drogas controladas que seriam de melhor qualidade, pois isso não protegeria os mais pobres que permaneceriam clientes de drogas adulteradas e mais baratas. O raciocínio do ex 1º ministro espanhol Felipe González de que é necessário eliminar a proibição, mas para isso seria preciso um acordo internacional a ser cumprido entre todos, foi esta semana repetido na Colômbia, país que teme um aumento da demanda pela maconha (e pela coca) lá produzida e uma concentração ainda maior da guerra contra o tráfico apenas dentro de suas fronteiras, enquanto fora delas os usuários seguiriam multiplicando-se agora sob a proteção da lei.
Considerando os milhões de dólares gastos na repressão ao narcotráfico e os magros resultados obtidos, não há dúvida de que este é um caso típico de desastrosa relação custo-benefício. Uma vez que a quantidade de traficantes e de usuários segue estável ou aumentando, a solução está em tirar o assunto dos âmbito policial e judicial para transformá-lo em um problema de saúde pública, possibilitando uma atenção regular aos viciados junto com a plena responsabilização dos consumidores de drogas por atos criminosos cometidos sob sua influência. Para limitar os danos provocados especialmente pelas drogas duras entre as quais hoje o crack causa os mais sérios problemas às famílias, é preferível concentrar a atenção no combate aos elos intermediários da cadeia (fornecimento de insumos e precursores, foco nas rotas de tráfico nas estruturas de distribuição no atacado e de lavagem de dinheiro) por se tratarem de atividades sob controle de poucas pessoas, dando menos ênfase aos extremos da cadeia – plantação e consumo final – onde há uma grande dispersão de pequenos agentes.

Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional