Mais um referendo na Bolívia

Bem Paraná

Conflitivo e confuso como os anteriores, vem ai outro Referendo popular na Bolívia. O MAS – Movimiento al Socialismo – uma mescla de PT e MST boliviano – adota duas estratégias básicas. Quando acha que pode ganhar, promove assembléias e plebiscitos; mas se vê que não tem maioria, parte para os bloqueios de ruas e estradas combinados com ataques a adversários e a prédios de administrações ou de órgãos de imprensa considerados como inimigos. Foi esta última modalidade de luta que elegeu Evo Morales, dois anos e meio atrás. A população, cansada de ver o país paralisado pelas marchas e bloqueios permanentes, elegeu representantes do MAS em todo o país para tirá-los das ruas, mas com isso os transformou em governo.


O Referendo de domingo para decidir se o presidente e os prefeitos (transformados em governadores nos departamentos de Santa Cruz, Tarija, Pando e Bení que aprovaram suas autonomias) ficam ou saem do poder, não resolve qualquer dos grandes problemas que o país enfrenta. É apenas uma tentativa de remover os governadores que mais estão dando trabalho a Evo Morales. Trata-se de uma faca de dois gumes. Aparentemente Evo tem o mínimo necessário para manter-se no poder, mas na radicalizada sociedade boliviana os departamentos nos quais ele for derrotado dizem que não mais deverão obediência ao nível central.


Uma vez mais o caos generalizou-se. Metade do país, argumentando que obras essenciais para o desenvolvimento local serão paralizadas, quer de volta os 30% do Imposto Direto sobre os Hidrocarbonetos (IDH) confiscados pelo governo para pagar uma pensão a idosos de baixa renda. Em conseqüência, começou uma greve de fome da qual 4 prefeitos (inclusive a recém eleita Savina Cuéllar que aderiu por decisão do Comitê Interinstitucional de Chuquisaca) já participam e que promete ganhar proporções alarmantes depois que o presidente a classificou de uma dieta para perder peso e pediu a seus correligionários que apóiem os grevistas, supostamente cortando-lhes qualquer acesso a alimentos. As declarações do prefeito de Pando, Leopoldo Fernández, dão bem a medida do conflito: “mais importante que a campanha pela minha ratificação no Referendo de 10 de agosto, é a luta para recuperar os recursos confiscados pelo governo, pois sem eles ficaria truncada a autonomia departamental”. Isso depois que o presidente do Comitê Cívico de Santa Cruz, Branko Merinkovic, informou: “Declaramo-nos em greve por tempo indefinido como primeira medida de pressão pacífica. Esperamos que nos escutem para que não tenhamos que chegar a mais”.


Evo sequer conseguiu entrar em Sucre, a capital, para participar dos festejos pela independência do país, pois lá só lhe garantem a segurança se pedir desculpas pela morte de populares que protestavam contra a aprovação da nova Constituinte sem presença de opositores em um quartel em novembro do ano passado. A Central Operária Mineira explodiu uma ponte e bloqueou a estrada de Caihuari para La Paz, uma das mais importantes para a economia nacional, em defesa de seu projeto de aposentadorias. Os deficientes querem bônus do governo, iguais aos dados aos idosos. Cochabamba é o 5º departamento a organizar seu próprio plebiscito, pela autonomia, ou o que lá chamam de “cochabambinidad”. O próprio Referendo foi declarado inconstitucional pela juíza Silvia Salame, do Tribunal Constitucional (a única que restara, depois que os outros magistrados renunciaram a suas funções), obrigando a Corte Nacional Eleitoral que é pró-Evo a reconfirmar o processo, interpretando-o como legal. Pobre Bolívia! 


 


 


Vitor Gomes Pinto


Escritor. Analista internacional