Na prática, a tensão continua e os problemas dos pouco mais de 1 milhão de habitantes do Timor Leste, um dos mais pobres países do mundo, terão de esperar algum tempo mais para serem equacionados. A segunda eleição presidencial desde a independência, em 2002, conseguiu apenas indicar quem vai para o segundo turno, já marcado para 8 de maio: Francisco Guterres, nome de guerra Lu-Olo adquirido nos combates pela Fretilin (Frente Revolucionária do Timor Leste Independente) com 28,8% dos votos e José Ramos Horta, independente apoiado pelo presidente Xanana Gusmão, com 22,6%. Ficaram para trás o jovem Fernando La Sama Araújo, do Partido Democrático (18,5%) e outros cinco de partidos nanicos. 
Formalmente, a Fretilin é o partido do governo, tem a maioria dos deputados e seu candidato é o atual presidente do Parlamento. No entanto, Xanana está formando um novo partido e apóia Ramos Horta, seu 1º Ministro desde o ano passado quando substituiu no posto a Mari Alkatiri (da Fretilin), forçado a renunciar ao ser identificado como um dos principais responsáveis pelos brutais conflitos de rua do ano passado entre dois grandes grupos rivais: os Lorosae que se orgulham de ter feito a revolução expulsando os indonésios, e os Loromono, acusados de não terem combatido.
No arquipélago de Nosa Tenggara, a ilha do Timor tem apenas 34 km2, com uma divisão quase ao meio entre o Timor Leste de colonização portuguesa e religião predominantemente católica e o Timor Ocidental que depois do domínio colonial holandês permanece pacatamente como parte do território da Indonésia e é na maioria habitado por muçulmanos. Não há disputa entre os dois lados, embora a etnia dominante do Timor Ocidental, os Atoni, tenha uma secular rejeição aos residentes no lado oriental. Os distúrbios de maio de 2006, provocados pela demissão de 600 soldados Loromono, só terminaram com a chegada de tropas da Austrália (90% do contingente de 1650 homens), Malásia, Nova Zelândia e Papua Nova Guiné, agora transformadas na nova missão de paz da ONU. Os capacetes azuis haviam saído um ano antes num clima de festa coroado com o discurso do seu representante, Sukehiro Nasegawa, que inocentemente declarou: “o fato de não haver mais tropas da ONU aqui é um reconhecimento de que o país é seguro e pacífico”.
Ramos Horta recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1996 junto com o bispo católico Ximenes Belo e, com um programa de centro-direita pró-Austrália – o vizinho mais poderoso – planeja trocar de posição com seu discípulo Xanana Gusmão, ajudando-o a eleger-se como 1º Ministro (é quem de fato governa) no pleito previsto para 30 de junho. Espera triunfar no 2º turno, que já acontece em 8 de maio, com o apoio dos demais candidatos, mas isso significaria expulsar a Fretilin do poder, provavelmente trazendo a guerrilha de volta à luta, mesmo porque ela nunca deixou de existir. Lu-Olo, pouco carismático, já disse que quer trazer Alkatiri de volta caso vença, o que significa uma maior aliança com Portugal e relações somente diplomáticas com a Austrália, país diretamente interessado nas reservas de petróleo e gás timorenses e no controle das rotas marítimas, de importância estratégica para a região da Melanésia e para a Oceania.
A questão do idioma tem forte destaque na campanha. O tétum, a língua aborígene, é falada pelo povo, enquanto o português quase caiu em desuso durante a recente dominação dos indonésios, sendo conhecida basicamente pelos mais velhos (há outros quinze dialetos praticados pelas tribos, formando uma babel lingüística). Lu-Olo promete que em cinco anos todos falarão português e Horta, filho de pai lusitano e mãe timorense, deve favorecer uma maior internacionalização o que pode significar o fortalecimento do inglês como idioma culto e de negócios.
O Brasil tem tido uma presença significativa no Timor e, depois dos militares, os professores do MEC com seus programas de alfabetização e ensino básico e do SENAI que preparam artífices locais para o trabalho, são respeitados. O incidente com a juíza Sandra Aparecida, esfaqueada nos braços e mãos num assalto em Dili, a capital, quando compunha o grupo dos países de fala portuguesa que supervisionam as eleições, foi considerado como uma fatalidade, mas fez lembrar a morte de Edgard Brito, o missionário evangélico mineiro atingido no pescoço por jovens rebeldes que atacaram seu carro nos distúrbios do ano passado.
Às margens do Oceano Índico e do Mar de Banda, muita água ainda vai rolar até que o Timor Leste encontre a paz. A presença de forças internacionais ainda é necessária, mas a superação da intensa pobreza (é o 191º estrado da ONU e a décima economia mais fraca) é o único caminho para que a ajuda internacional torne viável a sobrevivência da mais nova nação do planeta.        


NO TIMOR LESTE, NADA RESOLVIDO


Vitor Gomes Pinto
Escritor, analista internacional.
Autor do livro ZIM: uma aventura no sul da África



Na prática, a tensão continua e os problemas dos pouco mais de 1 milhão de habitantes do Timor Leste, um dos mais pobres países do mundo, terão de esperar algum tempo mais para serem equacionados. A segunda eleição presidencial desde a independência, em 2002, conseguiu apenas indicar quem vai para o segundo turno, já marcado para 8 de maio: Francisco Guterres, nome de guerra Lu-Olo adquirido nos combates pela Fretilin (Frente Revolucionária do Timor Leste Independente) com 28,8% dos votos e José Ramos Horta, independente apoiado pelo presidente Xanana Gusmão, com 22,6%. Ficaram para trás o jovem Fernando La Sama Araújo, do Partido Democrático (18,5%) e outros cinco de partidos nanicos. 
Formalmente, a Fretilin é o partido do governo, tem a maioria dos deputados e seu candidato é o atual presidente do Parlamento. No entanto, Xanana está formando um novo partido e apóia Ramos Horta, seu 1º Ministro desde o ano passado quando substituiu no posto a Mari Alkatiri (da Fretilin), forçado a renunciar ao ser identificado como um dos principais responsáveis pelos brutais conflitos de rua do ano passado entre dois grandes grupos rivais: os Lorosae que se orgulham de ter feito a revolução expulsando os indonésios, e os Loromono, acusados de não terem combatido.
No arquipélago de Nosa Tenggara, a ilha do Timor tem apenas 34 km2, com uma divisão quase ao meio entre o Timor Leste de colonização portuguesa e religião predominantemente católica e o Timor Ocidental que depois do domínio colonial holandês permanece pacatamente como parte do território da Indonésia e é na maioria habitado por muçulmanos. Não há disputa entre os dois lados, embora a etnia dominante do Timor Ocidental, os Atoni, tenha uma secular rejeição aos residentes no lado oriental. Os distúrbios de maio de 2006, provocados pela demissão de 600 soldados Loromono, só terminaram com a chegada de tropas da Austrália (90% do contingente de 1650 homens), Malásia, Nova Zelândia e Papua Nova Guiné, agora transformadas na nova missão de paz da ONU. Os capacetes azuis haviam saído um ano antes num clima de festa coroado com o discurso do seu representante, Sukehiro Nasegawa, que inocentemente declarou: “o fato de não haver mais tropas da ONU aqui é um reconhecimento de que o país é seguro e pacífico”.
Ramos Horta recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 1996 junto com o bispo católico Ximenes Belo e, com um programa de centro-direita pró-Austrália – o vizinho mais poderoso – planeja trocar de posição com seu discípulo Xanana Gusmão, ajudando-o a eleger-se como 1º Ministro (é quem de fato governa) no pleito previsto para 30 de junho. Espera triunfar no 2º turno, que já acontece em 8 de maio, com o apoio dos demais candidatos, mas isso significaria expulsar a Fretilin do poder, provavelmente trazendo a guerrilha de volta à luta, mesmo porque ela nunca deixou de existir. Lu-Olo, pouco carismático, já disse que quer trazer Alkatiri de volta caso vença, o que significa uma maior aliança com Portugal e relações somente diplomáticas com a Austrália, país diretamente interessado nas reservas de petróleo e gás timorenses e no controle das rotas marítimas, de importância estratégica para a região da Melanésia e para a Oceania.
A questão do idioma tem forte destaque na campanha. O tétum, a língua aborígene, é falada pelo povo, enquanto o português quase caiu em desuso durante a recente dominação dos indonésios, sendo conhecida basicamente pelos mais velhos (há outros quinze dialetos praticados pelas tribos, formando uma babel lingüística). Lu-Olo promete que em cinco anos todos falarão português e Horta, filho de pai lusitano e mãe timorense, deve favorecer uma maior internacionalização o que pode significar o fortalecimento do inglês como idioma culto e de negócios.
O Brasil tem tido uma presença significativa no Timor e, depois dos militares, os professores do MEC com seus programas de alfabetização e ensino básico e do SENAI que preparam artífices locais para o trabalho, são respeitados. O incidente com a juíza Sandra Aparecida, esfaqueada nos braços e mãos num assalto em Dili, a capital, quando compunha o grupo dos países de fala portuguesa que supervisionam as eleições, foi considerado como uma fatalidade, mas fez lembrar a morte de Edgard Brito, o missionário evangélico mineiro atingido no pescoço por jovens rebeldes que atacaram seu carro nos distúrbios do ano passado.
Às margens do Oceano Índico e do Mar de Banda, muita água ainda vai rolar até que o Timor Leste encontre a paz. A presença de forças internacionais ainda é necessária, mas a superação da intensa pobreza (é o 191º estrado da ONU e a décima economia mais fraca) é o único caminho para que a ajuda internacional torne viável a sobrevivência da mais nova nação do planeta.        


Vitor Gomes Pinto
Escritor, analista internacional.
Autor do livro ZIM: uma aventura no sul da África