Pelos quatro cantos da terra, pequenas e grandes guerras seguem seus caminhos, insensíveis às mudanças de calendário, alimentando a lucrativa indústria das armas. Uma síntese do que corre pelo mundo neste começo de 2013 envolve essencialmente batalhas do dia a dia na Ásia, na África e na América Latina. Deixando de fora, por serem macroconflitos, os casos de Israel/Palestina, Siria/Líbano, Afeganistão, as Coréias, o Irã dos aitolás, o Sudão (do sul e do norte) e a recente invasão francesa no Mali que atinge todo o Sahel africano, comecemos pela Ásia Central. Ali, as relações entre tajiques e uzbeques são cada vez mais precárias, os ataques por grupos terroristas muçulmanos atingem proporções preocupantes no Cazaquistão onde ativistas que se opõem ao governo têm sorte quando são presos e não sumariamente executados. Tensões étnicas no Quirguistão e táticas de guerrilha usadas pelos separatistas nas ásperas e gélidas montanhas de Gorno-Badaquistão (no Tajiquistão) parecem casos sem solução, pelo menos enquanto norte-americanos e russos continuarem a ignorá-los.
Os problemas no Iraque não terminaram com a morte de Saddam Hussein. O atual governo do 1º ministro shiita Nuri al-Maliki, para escapar da influência das monarquias sunitas do Golfo, da Turquia e dos Estados Unidos, aliou-se ao Irã, à Rússia e à China, com o que está cada vez mais isolado inclusive internamente onde a resistência dos partidos curdos e os devastadores ataques suicidas da Al-Qaeda voltam a dominar o cenário. No sul do continente, o Paquistão tem este ano o imenso desafio de concretizar sua primeira transição pacífica e democrática de um governo eleito para outro, o que significa algum acordo entre o Partido do Povo Paquistanês no poder e a Liga Muçulmana de Nawaz Sharif na oposição. Três anos de terríveis inundações criaram uma crise humanitária que favorece o recrutamento de militantes pelos talibans que se fortalecem apesar da decisão dos governos paquistanês e afegão de juntarem seus esforços para combatê-los. Já na região asiática da Turquia, o Partido dos Trabalhadores do Curdistão Turco (PKK) aguarda o final do paralisante inverno e a chegada da primavera para retomar suas atividades terroristas que sacrificaram um número recorde de vítimas civis nos dois últimos anos. O Partido da Paz e da Democracia (PBD), braço político legal do movimento curdo, tem assumido posições mais e mais favoráveis ao PKK, num claro desafio ao 1º ministro Tayyip Erdogan que recuou em sua estratégia de abertura democrática e se inclina cada vez mais para a direita a fim de assegurar sua reeleição em 2014. Representando 20% da população turca, os curdos desejam reconstituir uma nação própria que absorveria a todos os que hoje se distribuem também pelos territórios de Irã, Iraque e Síria. No sudeste asiático, quase dezesseis anos de insurgência no sul das Filipinas podem tornar-se parte do passado se o cessar-fogo assinado em outubro último pela Frente Islâmica de Liberação Moro for de fato obedecido, possibilitando a instituição da região autônoma de Mindanao (de maioria muçulmana num país eminentemente católico). E em Mianmar há esperanças, mesmo que ainda pouco sólidas, de que a ditadura militar prossiga na linha de abertura que já permitiu a libertação e a eleição para o Parlamento de Aung San Suu Kyi, a suspensão da censura à imprensa e um acordo com a oposição que está gradativamente reduzindo as sanções internacionais e tirando o país do isolamento.
A África segue enfrentando complexas situações políticas e militares no Egito, Líbia e Somália, ademais dos instáveis processos eleitorais previstos, a seguir, no Zimbabwe e no Quênia. A primavera árabe no Cairo resultou na eleição de Mohamed Morsi da Irmandade Muçulmana, numa crescente insatisfação popular e em perigosos avisos do Exército que domina militar e economicamente o Egito. O chefe das Forças Armadas e ministro da Defesa, general Abdul Fatah El-Sisi declarou que a atual crise pode levar ao colapso do Estado. O caos também voltou à Líbia pós-Khadafi onde mercenários agora formam milícias, armadas até os dentes, sem controle lutando entre si e vendendo serviços a qualquer bom comprador dentro e fora do país. O recente ataque da Al-Qaeda à planta de gás na Argélia foi, muito provavelmente, orquestrado a partir de Trípoli. No Chifre da África, embora a pirataria nas costas da Somália tenha sido reduzida, a distribuição de ajuda humanitária a cerca de 2,1 milhões de famintos somalis continua sendo um desafio insuperável na região sul que segue em mãos de muçulmanos radicais. Cem mil refugiados internos vivem em palafitas e barracos ao longo da estrada que liga Mogadíscio a Afgooye, poucos quilômetros a oeste da capital, num dos mais degradantes espetáculos a céu aberto do mundo de hoje.
Por fim, a América Latina. O tráfico de drogas mudou de endereço, saindo dos Andes para o México e daí, face à repressão policial, para a América Central. Guatemala, com uma fronteira de quase mil km com o México e Honduras pelo Caribe são as principais rotas de tráfico, embora Panamá, Costa Rica, El Salvador e Nicarágua sejam paraísos de ação dos cartéis que ai têm se dedicado também a produzir em massa anfetaminas graças aos precursores químicos trazidos da China. Na Colômbia, onde a coca segue sendo fartamente cultivada (a exemplo da Bolívia e do Peru), discute-se a reeleição de Juan Manuel Santos e a mesa de negociações de paz entre as Farc e o governo que num processo lento e supostamente gradual desenvolve-se em Havana. Enquanto isso, na selva e na Cordilheira Central, os combates prosseguem implacáveis.