No longínquo ano de 1966, quando o liberal Carlos Lleras Restrepo era o presidente, nasceram as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, como um braço de luta do Partido Comunista. Agora, quarenta e seis anos depois, quando o mês de fevereiro deste 2012 quase chegava ao seu final, a guerrilha deu um passo que pode ser decisivo na busca da paz ao anunciar a liberação dos últimos dez reféns militares que tem em suas mãos. O comunicado afirma que abandonam os seqüestros extorsivos depois de explicar que se tratam de retenções de pessoas, homens e mulheres da população civil, que com fins financeiros as FARC efetuam com o objetivo de sustentar sua luta. Contudo, acrescentam que em relação a um eventual processo de paz há sérios obstáculos, face à arrogante decisão governamental de incrementar os gastos militares, o contingente armado e as operações, o que indica o prolongamento indefinido da guerra. O presidente Juan Manuel Santos declarou que valorizamos como passo importante e necessário, mas não suficiente, na direção correta, o que significa manter a linha dura e as portas fechadas a uma negociação séria para acabar de vez com o conflito.
Não estão claras as razões para essa atitude unilateral da guerrilha. Pode ser um reconhecimento das próprias debilidades, perda das razões ideológicas, crescente apetite pelo dinheiro fácil do narcotráfico, uma tática para deter o avanço militar do governo ou é simplesmente mais uma mentira. As negociações para libertar os quatro integrantes da Força Pública e dos seis militares, capturados há mais de dez anos, foram conduzidas com a entidade Colombianas y Colombianos por la Paz – CCP criada pela ex-senadora Piedad Cordoba a fim de promover uma saída política ao conflito interno, e agora tem a participação da Asfamipaz, que reúne os familiares dos retidos, da Cruz Vermelha, do governo colombiano e também do governo brasileiro, ao qual caberá fornecer a infraestrutura, ou seja, os helicópteros e o pessoal que receberá os seqüestrados. Este aparato deve partir da base amazonense de São Miguel da Cachoeira em dia a ser definido, provavelmente no final de março. O ponto na selva da liberação só será comunicado depois que as aeronaves tiverem levantado vôo.
 O dinheiro ganho com os reféns é somente uma parte dos ganhos obtidos pelas FARC que têm adotado três tipos de financiamento para suas ações: a) predatório, com assaltos, roubos de gado, seqüestros e extorsão; b) parasitário, quando logra alguns vínculos com a população, por meio de cobrança de serviços de vigilância a cultivos de coca e outras plantações ou de carnês pagos por funcionários públicos, comerciantes, fazendeiros; c) simbiótico, sempre que a presença do Estado é nula ou escassa e a guerrilha consegue inserir-se na economia regional, onde atua na agricultura, criação de gado, extração de ouro e impõe a todos o que chama de imposto revolucionário. Grande parte da coca produzida ou intermediada pela guerrilha que ia para os Estados Unidos e a Europa agora está saindo pelas fronteiras dos países vizinhos, principalmente pelo Brasil. A opção atual é de vender a droga na Colômbia, deixando o risco do transporte para o comprador. Assim, os narcotraficantes mexicanos, por exemplo, estão pagando a metade do que pagavam pelo quilo de coca, mas precisam carregá-la.
Estima-se que cerca de 30 a 40 foram seqüestrados por mês nos últimos dois anos, mas os dados não são precisos, pois muitas famílias nada denunciam com medo de sofrerem ainda maiores represálias. A Fundação Nueva Esperanza diz que, talvez, estejam vivos os que foram capturados nos últimos três meses. Depois do seqüestro a família fica sabendo que deve pagar entre 50 mil e 2 milhões de dólares para libertar a vítima que, no entanto, logo é assassinada e vem o pedido de cerca de 20 mil dólares para que lhe seja entregue o cadáver. Há muito trabalho por fazer. É preciso cessar o recrutamento de menores e devolver às suas casas os que estão nas montanhas, identificar os campos minados e a longo prazo desativar as minas, além de informar os nomes e o estado de saúde dos que continuam em poder da guerrilha. O fim da guerra colombiana ficou mais próximo, mas continua sendo um sonho distante.        

Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional
Autor de Guerra en los Andes