Obama, O Equilibrista

Vitor Gomes Pinto*

Barack Hussein Obama reconhecendo sua pouca experiência administrativa – até hoje foi gestor apenas de sua própria campanha presidencial – nomeou um gabinete de astros com reconhecida competência específica para cada um dos cargos que compõem a pesada máquina governamental norte-americana. Terá a difícil tarefa de compatibilizar egos, mas diz que prefere a competição dentro da sua equipe ao invés da uniformidade de pacatos cordeiros, e a última palavra será sempre sua. Apesar da urgência e da vontade de mudar que é uma característica do novo time, o governo só entrará em pleno funcionamento depois que o Senado confirmar os novos ocupantes de mais de mil postos, desde os componentes do Gabinete, juizes federais, até embaixadores e responsáveis por agências nacionais e internacionais. No primeiro escalão estão quatorze Secretários e o Advogado Geral da União (equivalem a Ministros), que se confundem e concorrem com uma multiplicidade de diretores e chefes com freqüência dotados de autonomia e muito poder.
A dificuldade maior está na Secretária de Estado, Hillary Clinton, sua ferrenha adversária nas primárias do Partido Democrata, relacionamento precário com a 1ª. Dama Michelle Obama, auto-suficiente por natureza, com reduzida experiência em negócios internacionais e que poderá usar o cargo para promover-se na tentativa de ser a Presidente em 2013. Por que, então, Obama a escolheu? Afora as conjunturas partidárias, há o risco de que a nomeação venha a ser mais um caso de “atração fatal”, imitando o filme de Adrian Lyne de 1987 no qual um relacionamento extra-conjugal entre o bem-casado Michael Douglas e a bela Glenn Close se transforma numa perseguição obsessiva. O trunfo de Obama é a Embaixadora dos EUA na ONU, Susan Rice, sua amiga pessoal, mas tida como de pavio curto e que será promovida para um status equivalente ao de Secretária de Estado, como o de Hillary, num caso evidente de duplo comando. Rice carrega consigo as esperanças de que tome iniciativas decisivas para acabar com o genocídio de Darfur, mas terá força e vontade suficientes para fazer frente a tragédias como a do povo palestino de Gaza?            
Uma das grandes prioridades, a área energética, será tocada por personalidades com opiniões conflitantes. De um lado, o poderoso Diretor do Conselho Econômico Nacional, Lawrence Summers (já foi economista-chefe do Banco Mundial, diretor de Harvard e Secretário de Tesouro de Bill Clinton) e o Diretor de Orçamento Peter Orszag que preferem taxar gradativamente com maiores impostos as emissões de carbono das indústrias automobilística e de carvão; de outro lado a experiente Coordenadora da Casa Branca para Políticas de Energia e Climáticas, Carol Browner, até aqui assessora do Nobel e ex-vice presidente democrata Al Gore, firme defensora do estabelecimento de tetos para a emissão de gases poluentes. Entre eles, com postos de maior hierarquia, a Administradora da Agência de Proteção Ambiental, engenheira química (há 20 anos no ramo) Lisa Jackson, os Secretários de Energia, físico e Prêmio Nobel Steven Chu, ativista contra o aquecimento global, e de Agricultura, Tom Vilsack, defensor do estímulo interno a estratégias de energia renovável como a proveniente do etanol.
A equipe de segurança exigirá habilidades de equilibrista ainda mais apuradas do Presidente. Reúne o republicano Robert Gates como Secretário de Defesa (mantido da equipe de Bush), o general quatro estrelas James Jones ex-comandante da Marinha e da OTAN, Hillary Clinton, Susan Rice, o Advogado Geral Eric Holder e a Secretária de Segurança Nacional Janeth Napolitano. Contudo, ainda há o Diretor Nacional de Inteligência, o general Dennis Blair que tem pouco poder embora coordene todo o Sistema Nacional de Inteligência, e o autônomo diretor da CIA, Leon Panetta, por sinal, o único sem credenciais diretas para o posto (vem da área de orçamento). A área econômica é a primeira emergência, pois de seu sucesso dependem todas as demais, mas para demonstrar o quão prioritária é a Saúde, seu Secretário Tom Daschle integra o restrito grupo (inclui Summers e Carol Browner) de interlocutores mais próximos de Obama. Para a América Latina, as expectativas se concentram na figura do Representante de Comércio, Ron Kirk, considerado um combativo protecionista dos direitos dos trabalhadores norte-americanos e dos ainda não nomeados Secretário de Comércio e Secretário-Assistente para Negócios do Hemisfério Ocidental, este o substituto do funcionário de carreira Thomas Shannon, com a missão, p.ex., de lidar com o Brasil, com o trio Venezuela–Bolívia–Equador, renovar ou não o tratado de livre comércio com a Colômbia, entender-se com Cuba e combater o violento tráfico mexicano. O manejo adequado de um grupo de assessores tão grande e potente é vital para que o primeiro afro-americano a assumir o governo dos EUA justifique o imenso apoio de seus compatriotas e as expectativas do mundo inteiro.

* Escritor, analista internacional