O críquete, cuja única semelhança com o futebol é que são onze de cada lado, é o esporte nacional do Paquistão (o país é o atual campeão mundial da Copa World 20), da índia e, apesar da concorrência do rugby, da Inglaterra. Parece o beisebol e ganha quem fizer mais corridas naquele campo enorme de quase 150 metros de comprimento dos quais só os 20 metros do meio são de fato utilizados, longe do público. A autoestima dos paquistaneses, ultimamente ainda mais em baixa pela corrupção endêmica, a guerra interminável ou pelas enchentes, piorou quando o jornal inglês News of the World revelou que os jogadores da seleção nacional haviam vendido informações sobre o número de faltas que cometeriam no jogo perdido para a Inglaterra em Londres. As faltas foram propositais e há suspeitas de que o suborno envolveu até o capitão da equipe, Salman Butt, e o presidente da Liga Nacional , Ijaz Butt que é cunhado do Ministro da Defesa. O atual presidente, Asif Ali Zardari, substituiu na liderança do Partido do Povo Paquistanês a sua esposa, Benazir Bhutto logo depois que ela foi assassinada num ataque terrorista a bomba em Rawalpindi, a 12 quilômetros da capital, em dezembro de 2007. Considerado um mestre na arte da corrupção e da irresponsabilidade na gestão governamental, no mês passado foi passear pela Europa quando seu país debatia-se no desespero da maior enchente de toda sua história. Ban Ki Moon, o Secretário-Geral da ONU, assustado com o que viu, declarou que o Paquistão sofria um tsunami em câmara lenta, com 20 milhões de pessoas necessitando ajuda emergencial, um quadro pior do que as tragédias causadas pelo Oceano Índico em 2004, pelo terremoto da Cachemira em 2005, pelo ciclone Nargis na Birmânia em 2008 ou pelo recente terremoto do Haiti.
No momento em que os Estados Unidos iniciam sua retirada do Iraque e concentram seu esforço de guerra contra a Al Qaeda no Afeganistão, o papel do Paquistão é fundamental. Principalmente na fronteira entre os dois países, onde as forças talibans predominam, as batalhas são cada vez mais brutais. Neste 1º de setembro o exército paquistanês, armado e apoiado pelos Estados Unidos, bombardeou o Vale do Tirah (região do Khyber na divisa afegã), matando 62 pessoas. Quarenta seriam terroristas, mas os demais sem dúvida eram civis, aldeões da tribo Kokikhel da etnia pashtun que é aliada do governo. Neste vale-tudo, conquistar o apoio da população local contra os terroristas torna-se uma missão cada vez mais difícil. Em seguida, como de costume, veio a vingança: três bombas lançadas no meio de uma pacífica procissão xiita na cidade de Lahore deixaram pelo menos 22 vítimas fatais. Os xiitas são minoria no país onde a predominância é de sunitas, mas neste caso poucos duvidam de que se tratou de uma resposta taliban ao ataque de Tirah.
A cada dia mais se acumulam as contestações à opção de Barack Obama de afundar suas tropas no Afeganistão e arredores. Já são trinta mil soldados e a hipótese de retirada em 2014 parece impossível de ser cumprida para os que consideram a guerra como o único caminho, e um despropósito para os demais, defensores de uma imediata volta para casa. Há poucos dias, Obama reuniu-se com o presidente afegão, Hamid Karzai, e ambos concordaram em manter a pressão sobre os talibans. Entre as muitas crises internas que se estão tornando freqüentes na equipe de Obama, a mais recente foi provocada pelo general Stanley McChrystal – chefe das forças norte-americanas no Afeganistão, reconhecido como um comandante ético, durão e defensor de mais tropas – que, numa entrevista à revista Rolling Stones deste mês, debochou de vários componentes da equipe do presidente. Foram  atingidos pelas críticas do general o vice-presidente Joe Biden, o representante especial dos EUA para o Paquistão e Afeganistão, Richard Holbrooke, o Assessor de Segurança Nacional James Jones, e o embaixador Karl Eikenberry (mais alta autoridade civil norte-americana no país) que o teria traído ao dizer que o presidente Karzai não era um parceiro confiável. Por sinal,quando McChrystal foi demitido, Karzai saiu em sua defesa dizendo que a remoção será uma grande perda para o esforço de guerra.
O primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, garantiu a Obama a permanência de soldados britânicos como o segundo maior contingente militar internacional no Afeganistão, mas não deixou de expressar sua concordância com o plano de saída dentro de no máximo quatro anos. Os dois líderes não ignoram que estão diante de um atoleiro igual ou pior do que o do Vietnam, mas ainda não sabem como sair, nem como evitar que o vizinho Paquistão afunde de vez em suas próprias fraquezas.      

 

PAQUISTÃO, O FIEL DA BALANÇA
Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional