Grupos radicais favoráveis à pena de morte aproveitam o julgamento de Alexander Pichushkin em Moscou para pressionar o governo de Vladimir Putin a por fim à moratória que recentemente foi estendida pelo Parlamento até 2010. Em 1997 a Rússia assinou o protocolo da Convenção Européia dos Direitos Humanos, que proíbe a pena capital nos países associados, mas depois nunca a ratificou, alimentando suspeitas de que logo abririam uma janela para executar inimigos do regime (oficialmente considerados terroristas) na Chechênia. O caso de Pichushkin prende a atenção do público por se tratar de um assassino serial que liquidou 62 conhecidos e colegas de trabalho em Bittsa, um obscuro e aparentemente pacato parque situado na periferia sudoeste da cidade. Nas frias noites de Moscou, não lhe era difícil atrair vítimas, prometendo-lhes uns bons tragos de vodka. Matava-as em geral a golpes de martelo, empurrando seus corpos para dentro de um bueiro que se encarregava de levá-los pelos esgotos sem revelar-lhes a origem. Morava com a mãe e estava prestes a concluir a missão que se impusera nos últimos 14 anos: preencher as 64 casas do tabuleiro de xadrez, marcando-as com as rolhas das garrafas com as quais embebedava as vítimas. A polícia encontrou 62, numeradas. Seu outro objetivo já fora alcançado: superar ao mais famoso serial killer russo, Andrei Chikatilo, que matara 52 crianças e mulheres jovens ao longo de 12 anos de atividades. Agora, como réu confesso, será condenado à pena máxima permitida: prisão perpétua.


Diante da frieza com que Pichushkin admitiu a culpa e até se vangloriou de seus feitos, muitos consideram que deveria ser morto pelo Estado. Resolveria o problema ou serviria de exemplo para que casos similares não se repetissem? A resposta, ao que tudo indica, é Não.


Atualmente, dos 68 países que adotam e praticam a pena de morte, seis se encarregaram de 91% das execuções levadas a cabo no ano passado: China ( 1.010, de um total de 1.591), Iran, Paquistão, Sudão, Iraque e Estados Unidos. Os métodos variam, com predominância para a injeção letal adotada pela maioria dos 38 estados norte-americanos que incluem a medida em seu arsenal legal, e para o fuzilamento tão ao gosto dos chineses. Longe de serem abandonados, os métodos considerados mais bárbaros (como se o assassinato pelo governo pudesse ser mais ou menos suave) seguem em alta. Saddam Hussein e seu irmão foram executados por enforcamento e em alguns países muçulmanos o apedrejamento continua sendo uma prática relativamente comum, como ocorreu há pouco, no Iran, com Mahboubeh Mohammadi, condenada, junto com seu amante, pelo crime de traição ao marido. O código penal iraniano, em um requinte de perversidade, especifica os tipos de pedras que devem ser utilizados, recomendando que não sejam grandes o suficiente para matar a pessoa com um ou dois lançamentos nem tão pequenas que sequer poderiam ser consideradas como pedras.


O presidente peruano Alan García está levando avante sua promessa de campanha de expandir o uso da pena de morte no país, incluindo como razões o estupro de crianças com menos de nove anos de idade ou de pessoas com deficiência mental ou física. Talvez tenha se inspirado no pedido do mafioso italiano Carmelo Musumeci e de 310 colegas condenados à prisão perpétua que escreveram ao presidente Giorgio Napolitano pedindo que suas sentenças sejam transformadas em pena de morte, pois estão cansados de morrer aos poucos. No Peru, a lei já permite, desde os tempos do Sendero Luminoso, a pena capital para casos de traição em tempo de guerra e terrorismo.


Nos Estados Unidos tem havido um declínio no número de execuções, mas não há nenhuma garantia de que esta seja uma tendência permanente. Comparando dados de 2005 e 2006, quando a aplicação da pena máxima nos EUA caiu de 60 para 53, observa-se que o fenômeno de queda aconteceu basicamente e por questões circunstanciais no Missouri, Indiana, Alabama e Geórgia, enquanto no Texas e na Virgínia dava-se o contrário, com mais e mais execuções. O terrível corredor da morte, onde os condenados aguardam pelo fim, tem cada vez mais clientes. No momento, 3.366 pessoas lá residem, a maior parte concentrada na Califórnia, no Texas e na Flórida, cujos governadores não costumam ouvir os apelos dos advogados de defesa, que na hora derradeira tentam o seu perdão como uma última cartada.


A China anunciou que pela primeira vez, no ano passado, reduziu o número de sentenças letais, além de recomendar moderação nas decisões pelos tribunais espalhados pelo país. Nenhuma palavra foi dita em relação às estatísticas chinesas, numa terra onde as estimativas são de que oito ou nove de cada dez execuções não são notificadas. A pena de morte continua sendo duramente criticada por entidades de direitos humanos, pela Anistia Internacional, pela ONU e por ativistas pela paz em todo o mundo, numa luta incessante para convencer aqueles que, contra as evidências, ainda a julgam um remédio para a violência e para o crime.   Quanto a Pichushkin, as agências noticiosas não informam a que categoria de xadrez ele pertencia (já teria ganho torneios, era um mestre? E quais as duas casas do tabuleiro deixadas em branco?), nem as aberturas e estratégias que preferia. Especialistas do Instituto Serbsky, a mais renomada clínica russa no ramo, examinaram Alexandre e concluíram que é perfeitamente sadio, o que traz suspeitas sobre a sanidade dos médicos. Já os condenados italianos continuam cumprindo suas penas, mas alguns talvez se livrem: pela lei, poderão ter liberdade condicional depois de 26 anos de bom comportamento.    


 


(Vitor Gomes Pinto ficará ausente por três semanas, em viagem à Espanha e Portugal)