Quem é o vice?

Bem Paraná

Itamar Franco, eleito como vice na chapa de Fernando Collor de Mello, já exercia a presidência há mais de ano devido ao rumoroso processo de impeachment que removera do cargo o titular, quando uma pesquisa nacional de opinião perguntando “Quem foi o vice de Collor?” constatou que a grande maioria não sabia, esquecera. Para que mesmo serve o Vice, por que existe? Estas são as perguntas que no momento se fazem os americanos, diante da possibilidade teórica de que Sarah Palin venha a exercer a presidência da (ainda) mais poderosa nação do mundo em caso de vitória nas eleições de 4 de novembro de John McCain e de seu futuro impedimento por alguma razão. A performance de Palin no debate entre os Vices foi boa e em vários momentos superior à do democrata Joseph Biden. Este, inexpressivo, sabia que precisava apenas manter o controle e se possível passar despercebido, pois nada do que Sarah dissesse mudaria a marca de inexperiente e caipira que lhe fora afixada. E ela corria o risco de dizer alguma besteira, como no seu reconhecimento em uma entrevista anterior de que não sabia do que se tratava a “doutrina Bush” – uma evidente maldade do entrevistador, pois nenhum americano sabe. De qualquer maneira, as preocupações procedem, considerando que um terço dos vices exerceram a presidência dos EUA desde que John Tyler assumiu em 1841 sucedendo a William Harrison, falecido um mês após ser empossado. Sempre existe a esperança de que algum vice repita o desempenho do grande Theodore Roosevelt que chegou ao posto por um assassinato, de W. McKinley, em 1901, mas é maior o receio de repetição de desastres. É bom lembrar que quem fez os EUA entrarem definitivamente na guerra do Vietnã foi um vice, Lindon Johnson, o sucessor de Kennedy. Também houve o caso de Gerald Ford, o único vice não eleito (quando Richard Nixon foi afastado, seu segundo, Spiro Agnew, pediu demissão) e no anedotário nacional é comum a repetição da afirmativa de um outro vice, Walter Mondale (de Clinton), de que “o futuro será melhor amanhã”.
A eleição norte-americana estava ganha para os democratas diante da desastrosa administração Bush, mas eles mesmos estiveram a pique de jogar fora suas chances ao descartarem John Edwards, um americano típico, e irem à luta com dois candidatos improváveis: Obama e Hillary Clinton. Diante de um pleito no qual o eleitorado em princípio está dividido ao meio, qualquer deslize ou imprecisão pode custar caro e McCain aproveitou para assumir uma surpreendente liderança nas pesquisas, até que sobreveio a tremenda debacle do sistema econômico. Agora só um milagre salva a dupla republicana e o New York Times todo santo dia diverte-se tripudiando sobre os mais fracos. “Talvez McCain tenha visto algo em Sarah Palin que a maioria dos americanos não viu e quem sabe ainda nos convença de que não cometeu o mais colossal dos erros ao colocar a senhora Palin a uma batida de coração da presidência”, escreveu seu articulista Bob Herbert em um ácido comentário. Crescem, por lá, as vozes dos que pedem a eliminação do cargo de vice por uma nova emenda da Constituição.
As definições negativas são variadas. Vice é alguém que espera que algo dramático aconteça com o titular do cargo, como um suicídio, doença fatal, para que possa assumir o comando. Vice deve ficar em casa sem fazer nada, saindo só para receber o salário pago pelo povo. O resultado é que mal termina a eleição e já muitos começam a conspirar contra o chefe. Foi o que aconteceu no Rio Grande do Sul, onde o vice Paulo Affonso Feijó do DEM rompeu de imediato com a governadora Yeda Crusius. É o caso atual da África do Sul, onde o vice Jakob Zuma, numa ardilosa manobra partidária, conseguiu derrubar o presidente Tabo Mbeki. O Brasil é pródigo em exemplos, pois teve vices que alcançaram grande destaque, como Afonso Pena, Café Filho, João Goulart, Itamar Franco, José Sarney. Não obstante, no imaginário popular, a função continua desprestigiada. E por falar nisso, você sabe quem é o atual Vice-Presidente do Brasil?          


Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional