Documento obtido pelo WikiLeaks e divulgados nesta quarta-feira (29) mostram que, na época da visita do papa Bento 16 ao Brasil, em 2007, o Vaticano estava preocupado com o crescimento dos evangélicos no país e recebeu críticas do monsenhor brasileiro Stefano Migliorelli, que questionou sobre a falta de padres na América Latina.

O telegrama enviado a Washington em 6 de maio de 2007 relata conversas entre diversos membros do Vaticano e o ex-embaixador americano Francis Rooney, um empresário republicano do ramo de construção e um dos maiores doadores de campanha do ex-presidente americano George W Bush.

O diplomata americano faz um comparativo entre a primeira viagem de João Paulo 2º ao Brasil em 1980, quando os católicos representavam 89% da população e o censo de 2000, quando o número de católicos era de 74%.

A cada ano, milhões de católicos latino-americanos deixam suas igrejas para se juntar a congregações evangélicas incentivados pelos pastores destes novos rebanhos, disse Rooney.

Ainda segundo ele, de acordo com uma análise, enquanto a Igreja Católica concentra-se em salvar almas, muitas igrejas evangélicas fazem o possível apenas para matar a sede latino-americana para o misticismo.

Sem revelar fontes, o documento diz que João Paulo 2º descreveu as atividades evangélicas como sinistras e que uma das principais tarefas de Bento 16 seria despertar a comunidade católica e encorajar a resistência ao que o papa anterior teria chamado de caçada por seitas.

Já Migliorelli, na época chefe da seção brasileira da Secretaria de Estado do Vaticano, reclamou ao diplomata americano sobre o fato de a América Latina não ser uma região prioritária para a Igreja Católica.

Para Migliorelli, o Brasil e a América Latina seriam como território de missão — terras que não foram expostas de maneira consistente à fé católica. Temos que ver isso como uma evangelização — começando do zero, disse Migliorelli.

O monsenhor ainda criticou a quantidade e a qualidade do clero latinoamericano.

A falta de padres em grande parte da América Latina é muito pior do que nos Estados Unidos, disse. Migliorelli disse também que o nível de educação dos padres é muito baixo e que muitas vezes eles não aderem aos padrões de disciplina clerical (celibato, ofertas de sacramentos etc).

Em um tópico chamado de A ameaça da teologia da libertação, o diplomata americano comenta que o papa João Paulo 2º teria feito grandes esforços para acabar com esta análise marxista da luta de classes promovida por um número significativo de clérigos e católicos leigos que, por vezes, em nome de um compromisso político sancionou a violência em nome do povo.

Migliorelli comentou que o Vaticano não pretendia tocar no tema durante a visita do papa. O documento prossegue: A chave é simplesmente que o clero seja treinado mais efetivamente para explicar a posição da Igreja para o povo, ele concluiu.

Segundo o diplomata, João Paulo 2º combateu com a ajuda de Bento 16 a teologia da libertação mas, nos últimos anos, ela estaria ressurgindo em várias partes da América Latina.