Desde o início deste ano, a República Bolivariana da Venezuela vive a sua primeira crise política e institucional da era pós Hugo Chaves, tendo em vista a dificuldade de seu sucessor, Nicolás Maduro, em buscar a tão prometida estabilidade política, econômica e social naquele país.
A onda de protestos que se verifica representa o embate político e social daqueles cidadãos que são simpatizantes, ou não, com o Socialismo do Século 21. Não é novidade que nos últimos anos a onda de protestos tem aumentado dentro dos Estados. Os protestos se traduzem em movimentos da população, inconformada com determinadas condutas adotadas pelos governantes, e se mobiliza com o intuito de buscar mudanças.
Neste caso, a onda de protestos aponta para a existência de uma fissura na sociedade venezuelana, em que a situação torna-se insustentável, vez que a oposição não reconhece a situação como um governo legítimo, porque entende que este não tem o apoio popular.  É fato que as dificuldades encontradas por Nicolás Maduro decorrem da natural falta de carisma do atual Presidente que, diferentemente do mito Hugo Chávez, não possui a mesma oratória e articulação política, e da necessidade de promover o devido diálogo com a oposição.
Apesar dos protestos que vêm ocorrendo, o que se constata nos dias de hoje é a existência  de uma sociedade extremamente dividida. De um lado está uma classe média insatisfeita com a situação econômica e social, ante a falta de produtos básicos e de primeira necessidade, assim como o controle estatal exercido sobre a mídia. E do outro lado a classe mais baixa e que apoia o governo venezuelano, tendo em vista a melhora nas condições de vida e que reflitam no acesso aos bens e  a itens básicos de sobrevicência.
Em contrapartida não se pode esquecer a ascensão de Hugo Chávez ao poder no ano de 1998, com a promessa de governar para os pobres, dentro dos discursos populistas dos líderes latino-americanos. Dentro de seu governo, efetivamente, houve avanços sociais naquele país e que possibilitaram a melhor distribuição de renda e o acesso aos produtos de  primeira necessidade e bens de consumo aos mais pobres.
Com base no sucesso de seu projeto do bolivarianismo, Hugo Chavez passou a empreender inúmeras reformas sociais e constitucionais, sempre referendadas pelos eleitores. Do ponto de vista formal, constata-se que o processo democrático na Venezuela é observado e não cabe a nós – juristas que não vivenciamos o dia a dia naquele país – questionarmos de forma direta a condução das políticas venezuelanas, tendo-se como base os nossos valores democráticos.
Todavia, o projeto deste emblemático líder venezuelano sofreu um duro golpe com o seu falecimento, em março de 2013. Novas eleições ocorreram na Venezuela e o pleito foi vencido por pequena margem de votos, pelo sucessor natural de Hugo Chávez, Nicolás Maduro. A comunidade internacional, especialmente a América do Sul, assiste a tudo preocupada, com receio de que a instabilidade política possa acarretar na ruptura do governo de Nicolás Maduro, causando, assim, uma séria crise política. Torna-se importante buscar a resposta a um questionamento: qual é o papel da comunidade internacional nos protestos que ocorrem na Venezuela?
De início, cumpre observar que dentro da Venezuela existe uma ordem constitucional e um governo legítimo. Assim, qualquer alternância no poder, que não seja resultante do processo democrático – diga-se de passagem, por meio da realização de eleições – será ilegítimo. Assim, neste ponto de vista, correto é o posicionamento dos Estados integrantes do MERCOSUL e da UNASUL em apoiar o atual governo legitimamente constituído. Trata-se da reafirmação do clássico princípio de direito internacional da não ingerência dos Estados em assuntos de domínio reservado de outros.
Nicolás Maduro é um político jovem e representa as classes mais baixas, tendo em vista a sua origem humilde. Resta saber se haverá habilidade, por parte dele, que foi eleito democraticamente, em promover o consenso e buscar uma solução pacífica para a Venezuela. Trata-se de um processo de amadurecimento dentro da sociedade venezuelana e, caso haja o consenso e a preservação das instituições democráticas, inquestionavelmente a sociedade daquele país poderá nos brindar com uma bela lição de democracia, por meio da qual, em uma sociedade totalmente desigual e dividida, o diálogo e o consenso entre interesses políticos antagônicos, ainda são possíveis.

Eduardo Biacchi Gomes, Pós-Doutor  e Professor de Direito Internacional do Centro Universitário UNINTER