Estive em Punta del Este cinquenta e três anos atrás na Conferência da Organização dos Estados Americanos (janeiro de 1962) quando Cuba foi suspensa – e não expulsa como depois se vulgarizou o termo – tanto da OEA quanto do Tratado do Rio ou Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, o TIAR que mais tarde seria abandonado pelos quatro países bolivarianos e pelo México, este por considerar com toda razão que o acordo não fora obedecido na crise das Malvinas. Agora, abril de 2015, afinal a guerra fria termina nas Américas e os presidentes dos EUA e de Cuba, Barack Obama e Raúl Castro, apertaram-se as mãos .

A VII Cúpula das Américas realizada dias 9 e 10 deste mês no Panamá faz história, em suas entrelinhas e no calor do momento, para os 35 países da região e para a Espanha deixa saldos nitidamente distintos. Os analistas coincidem, em sua maioria, que afora aqueles mais amorfos, há três grupos de países a considerar. O primeiro é formado pelos que voltam para casa com as honras do sucesso, acumulando capital positivo para os anos vindouros. Sem dúvida os maiores ganhadores foram os Estados Unidos e Cuba. El presidente Obama es un buen hombre, disse Castro, fornecendo-lhe um salvo-conduto regional de indiscutível valor em meio às dificuldades que os norte-americanos enfrentam para recuperar a influência internacional desgastada frente à China e a Rússia.
Pelo menos outros três saíram ganhando. A Colômbia de Manuel Santos obteve um claro apoio de Obama para avançar nas negociações de paz com as Farc que se realizam em Havana. O México de Henrique Peña Nieto ao colocar-se como um possível mediador, inclusive por sua posição geográfica, da reaproximação entre cubanos e yanques, tratou de tirar do foco principal os ataques internos que sofre devido à crescente violência nos estados de Jalisco e MIchoacán e ainda em Guerrero pelos estudantes ainda desaparecidos de Ayotzinapa. Embora com menos destaque, também ganhou as manchetes o uruguaio Tabaré Vasquez que, seguindo os passos de seu antecessor Pepe Mujica, dispôs-se a servir de base para um entendimento entre o governo colombiano e o Exército de Liberação Nacional, o ELN, último resquício guerrilheiro ainda de fato não contemplado no processo de paz.
O segundo grupo é o dos perdedores de costume, liderado pela Venezuela que só foi reclamar da perseguição que diz sofrer. Nicolás Maduro não conseguiu inserir na declaração final da Cúpula uma condenação aos EUA por terem considerado Caracas como um perigo para o continente, e ainda teve o desgosto de receber um pedido de 25 ex-presidentes latinos e do rei da Espanha para libertar os presos políticos. Junto afundaram (nos debates) Equador, Bolívia, Nicarágua que, acompanhados pela Argentina, gastaram o seu tempo criticando o que dizem ser uma ingerência norte-americana na Venezuela.
Por último há o bloco daqueles que, devido a suas intensas crises internas perderam qualquer capacidade de apresentar um discurso continental de relevância na Cidade do Panamá. Por sua imensa presença na região, o Brasil de Dilma Rousseff mostrou debilidade ao não conseguir esconder os escândalos de corrupção e os movimentos de rua que pedem com insistência a saída da presidente. Fenômeno parecido, embora bem menos forte, é o que corrói o mandato de Michele Bachelet no Chile, devido ao megaescândalo político causado pelos negócios escusos de sua nora. E, naturalmente, a Argentina de Cristina Kirchner, desgastada por um enfrentamento sem fim com o Judiciário, pela crise econômica, pelo conflito com os credores internacionais e pelo assassinato do fiscal Alberto Nisman horas antes de depor acusando-a de impedir o processo contra os iranianos no maior atentado já ocorrido na América Latina e que em 1994 vitimou 85 pessoas na Associação Mutual Israelita em Buenos Aires.
Em texto no El Tiempo de Bogotá intitulado Ganadores y perdedores de la Cumbre de las Américas, o jurista colombiano Francisco Barbosa diz que é tempo de reacender o direito internacional americano fazendo com que realmente inclua, entre outros, o princípio da não intervenção, o respeito à democracia e o direito de asilo.