Você sabia que na idade média um concílio teria discutido se as mulheres têm ou não alma? Esta insensatez já tão distante e esquecida mostra onde começou a busca dos direitos a igualdade da mulher. Brigamos para ter alma. É incrível imaginar que já passamos por tantas conquistas e enfrentamentos, e projetando o olhar para o futuro, suspiramos e vemos que temos muito a buscar.
Estamos no século XXI e ainda buscamos salários iguais aos dos homens. Nos envolvemos em duplas ou até triplas jornadas de afazeres, mas ainda não recebemos o que seria justo por tudo isto. Parece algumas vezes não importar quantas mulheres brilhantes, das mais diferentes profissões, ou mesmo sem formação, que já contribuíram, sofreram e foram discriminadas, perseguidas, se frustraram, deram a volta por cima, e seguiram pela caminhada das suas escolhas. Muitas vezes com sucesso e tendo que se sobressair aos homens para serem reconhecidas.
Mas existe alguma coisa na alma feminina que a faz ser assim. Já conquistamos o direito de frequentar universidades, de votar e ser votada, da liberdade sexual, dos direitos reprodutivos e hoje, nesta área, ainda buscamos o direito ao orgasmo e à libido. Há alguns anos éramos reprimidas e tínhamos vergonha, por não saber exatamente do que se tratava. Algumas mulheres ainda vivem a vida, têm seus filhos e não conhecem o prazer do ato sexual. Estamos nesta caminhada, de libertação sexual, sem volta. Uma conquista, pois mulheres que conhecem melhor seu corpo se valorizam mais e se tornam mais confiantes.
Uma consequência da repressão sexual há tantos anos imposta às mulheres é a violência. A encoxada no ônibus, o assédio no trabalho ou na rua, a pressão psicológica por gênero, o desrespeito velado nos deboches, e o estupro ou agressões físicas e psicológicas que vitimizam mulheres dentro das suas casas e fora delas. A questão é que isso acontece simplesmente porque nascemos mulheres. Não dá mais para mulheres perderem a vida só pelo fato de serem mulheres!
Fizemos e fazemos tanto barulho no meio de um mar de milhares ou milhões de mulheres que a cada dia se empoderam do conhecimento do seu direito e querem ser respeitadas. Conhecimento traz mais confiança, por isso a importância de fazermos barulho. Não estamos sozinhas, somos muitas!
Quando me perguntam se neste dia 08 de março temos motivos para comemorar, respondo rapidamente que sim. Celebrando nove anos da Lei Maria da Penha. Esta foi, no âmbito legal, o divisor de águas. Temos uma lei que tipifica a violência contra mulher. Podemos nos defender da violência física, patrimonial, sexual e psicológica. Esta última em especial tão difícil de provar, pois está no olhar deles ao nos tratar com desprezo e desrespeito, até antes um fato que não merecia notificação afinal, não deixa marcas no corpo. Mas deixa marcas profundas na alma, aquela que diziam que não tínhamos.
Tivemos outras conquistas marcantes. Hoje, os 60 ou 70 anos da mulher são os novos 40. Acreditem, a mulher se debruçou sobre sua saúde e procura recursos na medicina – que os tem – para manter-se jovem e saudável. A terapia de reposição hormonal, os cuidados com alimentação e atividade física estão cada vez mais fazendo parte da vida da mulher consciente e preocupada com uma longevidade cheia de saúde. Lembrando que mulheres vivem mais que homens. Um viva para a tecnologia que nos permite diagnósticos precoces e tratamentos bem sucedidos.
Vamos viver mais, mais felizes, mais independentes, mais empoderadas de conhecimento e mais lindas.

Maria Letícia Fagundes é ginecologista do Hospital Marcelino Champagnat e fundadora da ONG MaisMarias em combate à violência doméstica